(pt) [Espanha] Extraído do CNT nº 424. (Não) Maternidade By A.N.A. (en)
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Sábado, 19 de Dezembro de 2020 - 11:56:04 CET
Beauvoir disse que "uma mulher não nasce, se faz", mas nos feminismos, não
concordamos mais sobre o que significa se tornar uma mulher. Com unanimidade e
sem debate, aceitamos apenas uma premissa: continuamos a ser a outra. É claro que
seria mais do que isso! Ultimamente nos colocam como peças decorativas como uma
exigência legal em todos os saraus, para atender às cotas e parecer bem para a
galeria. Falamos com a A, aparecemos em banners, em vídeos, em textos, em fotos.
Eles fingem que existimos! O aparecimento da paridade é a norma no século 21,
quando na realidade nem mesmo as franjas se afastaram do status quo. Porque para
algumas mulheres, as inconscientes, as bocudas, as solteiras, as sem filhxs, as
ociosas com bons horários, parecem ser militantes, mas onde estão as outras
mulheres? Onde estão as companheiras de nossos companheiros? Não sei onde estão
as companheiras de nossos camaradas, mas há algo que me intriga ainda mais: onde
diabos estão seus filhos? Ninguém tem filhos? Nem mesmo mães/pais de uma idade?
Não procriar, ou cuidar de alguém, é a condição sine qua non para ser membro da CNT?
Escusado será dizer que hoje existem tantos pais quanto mães: elxs são fãs da
criação natural, que coletam, amamentam sob demanda, respeitam ritmos e tempos
sem impor padrões com aceitação incondicional. Há também, naturalmente, aquelxs
que engarrafam, alimentam e choram, aquelxs que retornam ao trabalho com a
episiotomia não curada, e aquelxs que administram horários inamovíveis para criar
estrutura em seus filhos. Alguns recém-nascidos não têm gênero. Outros usam azul
e rosa e têm orelhas furadas. Há em vitros, famílias variadas, adoções,
acolhidas, criação tribal. Há homens (trans) que dão à luz. Estou feliz que todos
escolham o modelo que melhor lhes convém, porque sei que se há uma coisa que
todas as maternidades têm em comum, é que elas são realizadas com a melhor das
intenções. Agora então: cuidado com os dogmas, porque mais tarde algo de
inesperado pode sair, não importa de qual seita você seja.
E o que fazemos nós que não trazemos vida para este mundo? Aquelas de nós que
ficam para se vestir de santos, as estéreis, as egoístas, as velhas que sentem
falta do arroz, abortadoras, as tias ou madrastas eternas. Fico feliz que você me
faça essa pergunta, porque sou uma professora, e não gosto de crianças, como um
grupo, nem deixo de gostar delas, assim como faço com todas as pessoas que não
conheço (isso primeiro), porque sou introvertida e preciso criar relações de
intimidade e confiança para que eu me relacione com alguém. Quero gritar aqui aos
quatro ventos, que estou até meus ouvidos em escuta ativa e passiva: "quando você
for mãe, você vai entender". Pessoas que um dia fizeram sexo sem preservativo,
tenho novidades para vocês: cuido de seus filhos de segunda a sexta-feira! Sei os
nomes de seus amigos, o que fazem em seu tempo livre, que tabaco fumam, por que
choraram anteontem ou com quem fizeram sexo na sexta-feira no recesso! Também
conheço muitas de suas intimidades, detalhes de seus divórcios, ou seu nível de
raiva quando lhe disseram que não queriam ser engenheiros industriais e
matriculados em antropologia. Surpresa!: aqueles de nós que acreditam em
pedagogias libertárias, na educação gratuita, tentam criar espaços de
horizontalidade e confiança e durante a semana somos tanto pais quanto você,
mesmo não tendo experimentado contrações, nem liberado o esperma mais
rapidamente. Portanto, não temos que esperar por nenhum evento para entender as
coisas, porque já entendo como desejável a parentalidade na comunidade, e não
viver em colmeias unifamiliares como o melhor cenário possível. Passo muitas
horas por dia realizando a maternidade tanto no trabalho como com os filhos de
meus amigos, mas e a mãe-paternidade no sindicato?
Daqui apelo àqueles que leem isto, pois gostamos de dizer que "carregamos um
mundo novo em nossos corações": podemos POR FAVOR começar a repensar a
paternidade de outra forma, menos possessiva e individualista? Nós que reclamamos
um sentimento de grupo, com bens comuns e terras coletivizadas, vamos continuar
brincando de propriedade privada com as crianças? Não vou mexer com o "por minha
filha ma-to", porque o entendo perfeitamente. O que eu acho mais estranho e
entendo menos é que você só "ma-te" por SUA filha, e que você não quer saber da
filha do vizinho. Como pode ser que eu, que sou um naufrágio humano e não tenho
uma sensibilidade especialmente desenvolvida para as crianças, sinta que me
preocupo com as crianças em geral, mas você, que trouxe vida a este mundo, não se
importa com nada mais do que com quem tem seu sobrenome? O que eles nos fizeram?
O que nós nos permitimos fazer? Não estou dizendo que colocamos crianças de 6
anos na reunião do comitê local (bem, sim, na verdade, estou, porque elas podem
estar lá desenhando silenciosamente, fazendo uma colagem com adesivos da CNT, ou
cantando "a las barricadas" e correndo entre as cadeiras), mas acho que fomos
enganados por esta compartimentação da vida familiar como se fosse uma colmeia.
Somente a afiliação à CNT, temo que não seja mais suficiente chamar seu namoradx
COMPANHEIRX para parecer libertário. É hora de dar o próximo passo. Ou começamos
a criar pontos de encontro, onde a vida, o cuidado e o apoio mútuo estão no
coração da VERDADE, ou isto é besteira. Devemos abrir amplamente as portas de
nossas instalações. Saltamos alguns passos e deixamos de considerar nossas
instalações como aquele lugar que torna mais fácil para as pessoas se verem, se
conhecerem, se relacionarem e, graças a isso, que o apoio mútuo não é apenas ir a
um comício por um homem com barba de sua cidade com um adesivo da CNT que você
nem sabe seu nome.
Quando dizemos "conte com a CNT", eu gostaria que fosse verdade. (Não)
paternidade em tempos de capitalismo e patriarcado não é fácil, mas podemos fazer
as coisas melhor. Ou isso tudo era mentira?
Fonte: https://www.cnt.es/noticias/no-maternidad/
Tradução > Liberto
agência de notícias anarquistas-ana
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