(pt) federacao anarquista gaucha: MEMÓRIA - Para não esquecer o 1º de Maio -- Discurso de memória lido durante o Ato de 1º de Maio da FAG.
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Terça-Feira, 1 de Maio de 2018 - 06:53:08 CEST
O século XIX foi marcado por inúmeras transformações de ordem política, econômica e
social. Presenciando o nascimento de uma nova classe trabalhadora, o operariado fabril,
cidades como Londres, Paris, Berlim, Moscou, Chicago, Buenos Aires, Rio de Janeiro, dentre
outras, passam a ser transformadas por uma gigante concentração de homens e mulheres
marcados física e emocionalmente pela miséria e superexploração. Tempos de extenuantes
jornadas de trabalho que ultrapassavam as 12 horas diárias em condições extremamente
insalubres que não poupavam sequer crianças e mulheres gestantes. ---- Neste contexto que
começa a tomar um contorno mais preciso as ideias socialistas de ruptura revolucionária
com este sistema marcado pela concentração de riqueza e poder, tendo neste nascente
operariado seu destacado sujeito.
Quadro de dor, opressão, de ultrajante e implacável exploração que fez o proletariado
tomar na reivindicação da redução da jornada de trabalho o principal bastião para a unir
toda classe. Com o lema 08 horas de trabalho, 08 horas de descanso e 08 horas de lazer, a
classe trabalhadora dispara uma titânica luta contra a burguesia e o Estado capitalista. O
movimento operário acumulou uma força jamais imaginada pelos grandes industriais e
políticos burgueses, ultrapassando os limites desta própria reivindicação e gerando
ideologicamente um sujeito capaz de auto-gestão da sociedade, independente (e contra) a
atuação de patrões e partidos burgueses.
São essas e outras batalhas, ao lado da epopéia guerreira dos povos originários e dos
negros aquilombados contra o regime colonial, que escrevem com sangue e suor a dolorosa
história de todos oprimidos.
Em todo o mundo, greves e manifestações reivindicaram a jornada de 08 horas, luta de
classes encarniçada, combates dramáticos da fome contra a opulência, verdadeiras batalhas
campais. Essa história social traz a marca inesquecível da jornada dos trabalhadores e
trabalhadoras de Chicago, nos EUA.
1° de maio de 1886, a cidade de Chicago foi palco de uma greve geral pela jornada de 08
horas de trabalho, atendendo ao chamado da Federação Americana do Trabalho. O poder do
movimento grevista assusta a patronal ao passo que a repressão ia se armando. Em um
comício, no dia 03 de maio, próximo a fábrica Mc Cormicks, que havia despedido mais de
2.000 operários em fevereiro do mesmo ano por questões políticas, a polícia avançou
ferozmente em direção dos trabalhadores, resultando na morte de seis pessoas e um número
considerável de feridos.
Como reação, convocou-se um ato em luto pelos companheiros mortos na praça Haymarket
reunindo 15.000 pessoas onde os anarquistas Spies, Parsons e Fielden passaram a tomar
sucessivamente a palavra. Chicago era um dos grandes polos da militância anarquista nos
EUA, cumprindo um rol fundamental na organização operária. Estavam agrupados como
tendência na Internacional Negra.
Em meio ao ato uma bomba explodiu no pelotão de policiais, resultando em alguns mortos e
dezenas de feridos. A polícia começou a disparar em todas as direções, resultando em um
grande número de mortos e feridos. Nunca se conseguiu apurar o número de mortos na
ocasião, já que os corpos foram enterrados às escondidas; o Estado de Sítio foi decretado
e inúmeras sedes sindicais e casas de trabalhadores invadidas, saqueadas e até
incendiadas. A origem da bomba ainda hoje é desconhecida, gerando suspeitas de ter sido
resultado de uma ação da própria polícia como forma a legitimar a repressão.
A imprensa burguesa pede a cabeça dos lutadores e é prontamente atendida. Após a bomba da
praça Haymarket estava montada a farsa judicial-punitivista. August Spies, Albert Parsons,
Michel Schwab, Samuel Fielden, Adolf Ficher, George Engel, Louis Lingg, Oscar W. Neeb,
Rudolf Schmaubelt e Willian Seliger foram acusados pelo atentado e condenados a pena de
morte. Schawab e Fielden tiveram sua pena comutada para prisão perpétua e Neeb para 15
anos de prisão. A sentença foi executada em 11 de novembro pela forca dos operários
anarquistas. Lingg foi a exceção, se suicidou na prisão dois dias antes da sentença.
Ao caminho do cadafalso, Spies manifestava sua convicção ideológica, encorajando
companheiros e companheiras que ficavam a proseguir na luta:
"Se com nosso enforcamento vocês pensam em destruir o movimento operário - este movimento
do qual milhões de seres humilhados, que sofrem na pobreza e na miséria, esperam a
redenção - se esta é sua opinião, nos enforquem. Aqui e acolá, atrás e na frente de vocês,
e em todas as partes, as chamas crescerão. É um fogo subterrâneo e vocês não podem apagá-lo"
Enquanto Engel bradava "Viva a Anarquia!"
A tragédia de Chicago torna o 1° de Maio uma data comemorada em todo o mundo como dia de
luta e luto da classe trabalhadora, seja pelas greves, ocupações, marchas e enfrentamentos.
No Brasil a data passou a ser comemorada na década de 90 do mesmo século XIX, mas teve uma
maior repercussão após o 1° Congresso Operário Brasileiro, que se realizou no Rio de
Janeiro entre os dias 15 a 20 de Abril, onde se fundou a COB (Confederação Operária
Brasileira), sob a égide do sindicalismo revolucionário e destacada influência libertária.
No entanto, como tantas outras expressões de luta e resistência dos de baixo, o primeiro
de maio também se viu "raptado" pelos de cima, em uma tentativa de esvaziar seu conteúdo
classista e combativo. Durante os governos de Vargas, em especial, durante a ditadura do
Estado Novo, o primeiro de maio, passou a ser festejado como uma data de entendimento
entre trabalhadores, patrões e governos, apresentados como uma única família, a família
chamada "nação brasileira". Foram os anos de consolidação do peleguismo e corporativismo
sindical que ainda hoje deixa uma chaga nada desprezível para a luta dos de baixo.
Em que pese a infâmia dos de cima em vilipendiar nossa história e nossos mártires, a
memória do 1 de maio foi cuidadosamente zelada como um fio condutor que nos liga aos
generosos sonhos e batalhas de homens e mulheres que com sua luta e martírio constituem
nossa razão de seguir em frente. A batalha pela memória também é uma importante trincheira
nessa encarniçada luta de classes, para nunca nos acomodar e nos amesquinhar, não baixar a
cabeça e não entregar o coração para este miserável e opressivo mundo burguês.
Há 50 anos atrás, no 1° de maio de 1968 na Praça da Sé de São Paulo, essa mesma memória
classista e combativa da data voltou a soprar os ventos da rebeldia. Eram anos de funesta
ditadura civil-militar e nossa classe amargava um tremendo arrocho salarial, além de
diversas intervenções e repressão em sindicatos, organizações estudantis e populares. Esse
sombrio cenário não dobrou a espinha de generosos lutadores, fosse nas organizações
estudantis, fosse nas organizações de trabalhadores. Em diversas fábricas um trabalho
silencioso era feito no sentido de acumular forças para o enfrentamento à ditadura a
partir da luta contra o arrocho, dando origem ao importante MIA (Movimento Intersindical
Anti-Arrocho) na região metropolitana de São Paulo. Organização embrionária essa que
culminou nas importantes greves metalúrgicas de Betim (MG) e Osasco (SP) e no épico 1 de
maio da Praça da Sé.
No 1° de Maio da Praça da Sé, como de costume estava programado uma atividade "cívica",
animada pelo sindicalismo pelego e com a participação do governador biônico Abreu Sodré. A
atitude enérgica do MIA, oposições sindicais, o sindicato metalúrgico de Osasco e o
movimento estudantil azedou a festa. Rompeu o cordão de isolamento do palco com as
autoridades. Expulsos os sindicalistas pelegos e as autoridades do governo do Estado100,
incluindo o governador, manifestantes incendiaram o palco e saíram em manifestação pelas
ruas do centro de São Paulo apedrejando algumas agências bancárias, e gritando palavras de
ordem contra a ditadura e o arrocho salarial.
Exemplos de luta, de liberdade e justiça peleada com os dentes cerrados, que mostram que
apesar de todas a adversidades, sempre é possível lutar e resistir, pois, como costumamos
afirmar: aonde há opressão há resistência!
É preciso dizer que nos nossos dias o 1° de Maio também sofre a desfiguração do seu
caráter de luta e organização de classe, visto e promovido como dia de descanso oferecido
pelos patrões e até mesmo como dia de festa. A burocracia sindical, hoje encastelada na
CUT e Força Sindical que se beneficiou de inúmeros cargos nos governos petistas, insistiu
em organizar grandes festas em comemoração à data, com shows e sorteios de automóveis e
eletrodomésticos, enquanto assinavam os mais espúrios acordos com a patronal e o Estado
para retirar direitos e intensificar o ritmo de trabalho. Burocratas e negociadores da
miséria, que, de bravata em bravata, puxam o freio de medidas de resistência de maior
vigor, da ação direta de classe, como na promissora greve geral do dia 28 de Abril do ano
passado, afetada pela canalização da luta para uma campanha pelas "Diretas Já" que, ao fim
e ao cabo, teve como grande resultado inviabilizar a organização de uma nova greve geral
contra a reforma da previdência e a reforma trabalhista.
Neste ato anarquista pelo 1° de Maio lembramos o grande exemplo dos mártires de Chicago e
as sucessivas lutas que marcaram este dia, mas sobretudo renovamos nosso compromisso de se
lançar sem tréguas na organização de toda a classe para novamente colocá-la em uma luta
decisiva contra os patrões e o Estado.
Reivindicar a memória dos nossos mártires não pode assumir outra feição senão a incansável
luta pela construção de um povo forte.
É nesse espírito que viemos hoje bradar nosso grito:
ANULAR A REFORMA TRABALHISTA, A LEI DAS TERCEIRIZAÇÕES E A EMENDA 95 DO ARROCHO PÚBLICO.
RESISTÊNCIA A REFORMA DA PREVIDÊNCIA.
BASTA DE CRIMINALIZAÇÃO DO PROTESTO E DA POBREZA.
VIVA O 1 DE MAIO!
VIVA OS MARTIRES DE CHICAGO E TODAS LUTADORAS E LUTADORES DO POVO!
NÃO TA MORTO QUEM PELEIA!
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