(pt) [Espanha] Anarquismo Mágico By A.N.A. (ca)
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Domingo, 25 de Março de 2018 - 06:55:23 CEST
Às vezes eu fico quieto, observo e acho que algumas pessoas acreditam que militar é vir
aquecer a cadeira um par de horas para uma assembleia, em um horário que lhes convém. Há
algum tempo, com algumas companheiras, percebemos que a esquerda em geral e o movimento
libertário em particular, sofrem, em nossa humilde opinião, uma séria falta de compromisso
pessoal e uma perda de objetivos claros, o que faz muitas pessoas confundir formas e meios
com os fins. ---- Por Iru Moner ---- Eu não quero minimizar a discussão de reuniões e
assembleias como uma forma organizacional, mas, às vezes, parece que muitas companheiras
entendem a politização como um mecanismo de defesa emocional ante a dureza da realidade
capitalista: assim, estar em um coletivo assembleario, torna-se uma maneira de estar no
mundo com dignidade.
Isso não é um problema em si mesmo, de fato, é algo necessário em um mundo onde o
capitalismo nos atomiza e nos isola. O problema talvez resida no fato, mais ou menos
consciente, de não ir mais longe e não usar a organização assembleária e de base como um
mecanismo de transformação social, para melhorar sua vida e a de seus pares.
Sempre falamos de coerência, de princípios e de comodidade nas lutas. Mas nunca falamos
seriamente sobre problemas comuns, de estratégias e de possibilidades de vitória. O tempo
das "causas perdidas" passou, o romantismo do progressismo solidário morreu. A pressão do
sistema marca sua própria agenda e nos obriga a falar sobre o quão cansado estamos no
"trabalho", da carestia da vida, do aluguel, da diferença salarial e da forma como podemos
começar a mudar nossas condições materiais: não pode ser que estejamos normalizando a
mudança de trabalho a cada 6 meses, dedicando 50% do salário para pagar o aluguel ou viver
em apartamentos que se parecem com freezers, porque não podemos pagar uma "faturinha" de
200 € de luz.
Uma estratégia de médio prazo, em uma análise prévia da conjuntura, deveria permitir-nos
atuar com certa liberdade de manobra, confiança ou delegação, de modo a não ter que falar
continuamente sobre tudo. Pode não ser tão necessário ter que avaliar com tanta frequência
o caminho que está sendo realizado: depois de tudo, sabemos que, para poder ver mudanças e
pequenos progressos, temos que esperar um pouco e acima de tudo, quebrar muuuuuita pedra.
Nem se trata de evitar o controle coletivo e a autocrítica, pelo contrário: se partimos do
desejo de adicionar tantas pessoas às lutas, devemos ter em mente que muitos de nós não
temos tempo suficiente para assistir a todas malditas assembleias. A realidade é que
muitas não querem gastar todo o nosso precioso tempo decidindo as coisas todas as semanas
ou observar perplexos, como, de acordo com o humor dos assistentes daquele dia, os
conceitos e os acordos básicos são alterados ou negligenciados, em um exercício de
imaturidade política que acaba sendo deprimente.
Não estaremos confundindo horizontalidade com hiper-assemblearismo? As pessoas
"trabalham", têm filhos, têm vida. Podemos decidir continuamente todos os tipos de
minúcias e tecnicismos em assembleias intermináveis e pouco efetivas? Não nos falta um
pouco de pragmatismo?
As reuniões devem ser um espaço de decisão e debate, mas também devem servir para delegar
e dividir tarefas com base na confiança do trabalho em comum. Em teoria, defendemos a
assembleia porque acreditamos que é uma ferramenta de inteligência coletiva, útil para
tomar decisões táticas de acordo com o ritmo e desenvolvimento de eventos. Na prática,
muitas vezes achamos que elas acabam se tornando espaços de digressão ou semi-terapia,
onde muitas pessoas expressam sua opinião ou experiência pessoal em um exercício
autocomplacente. É possível que nem sempre seja necessário que opinemos sobre tudo? É
necessário prolongar os horários das reuniões até as horas intempestivas, impossíveis de
assumir para pessoas que, por exemplo, tenham filhos, cuidem dos anciãos ou trabalhem na
manhã seguinte? A realidade é que, mais de uma vez, tudo isso gera um estágio de confusão
e frustração nesses militantes que talvez não seja tão jovem, mas ainda seguimos sendo
rebeldes. Talvez, mal que nos arrependamos, muitos de nós acabam sentindo-se mais úteis
dedicando essas duas horas a escrever artigos para a Soli, sair para parar uma parada[de
propaganda]no meio da praça ou fazer o que achamos necessário nesse momento para fazer
avançar o movimento, sem ter que nos reunir todas. Talvez seja hora de recuperar as
tertúlias laicas e fortalecer os espaços de debate e divagação popular, onde se podem
transformar todas essas preocupações em opiniões e, assim, parar de densificar os espaços
de decisão?
Por outro lado - e acabei com minha pequena dose de bile -, vejo que muitas dessas pessoas
que se sentem como peixes na água do mundo da assembleia e praticam a hiperpolítica de
"placa", de superioridade moral e de radicalismo discursivo, são precisamente aqueles que
não sabem como viver fora dos espaços militantes: os espaços mais populares, fora do
conforto dos ativistas, não sabem como se explicar ou, simplesmente, falam uma linguagem
tão afastada da realidade social que gera desconfiança ou rejeição diretamente.
Às vezes, penso que algumas pessoas acreditavam na paródia que a mídia mostra sobre nós,
as anarquistas: sonhadoras, antissociais, lançadores de bombas. O movimento libertário,
além de ser uma maneira de ver o mundo e a sociedade, é uma ferramenta para mudar tudo.
Mas, para que essa ferramenta seja eficaz, ela deve sempre ser afiada e, além do
romantismo, deve ser útil. E para isso precisamos de todas: cada uma fazendo o que sabe
fazer e todos eles sob um guarda-chuva de inteligência e confiança coletiva. Isto é o que
nos faz um movimento.
Fonte: http://lasoli.cnt.cat/27/02/2018/opinio-lanarquisme-magic/
Tradução > Liberto
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