(pt) Nota do GT Estudantil da Coordenação Anarquista Brasileira em solidariedade aos estudantes que ocupam a Reitoria da UFRGS em defesa das cotas raciais por FARJ
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Domingo, 18 de Março de 2018 - 09:57:13 CET
Viemos por meio desta nota nos solidarizar com o movimento negro da UFRGS. No dia 07/03 a
ocupação do prédio da reitoria da UFRGS foi impulsionada pelo Coletivo Balanta, com o
objetivo de reverter a decisão da universidade que alterou os critérios de aferição do
processo de seleção de cotistas. ---- No caso, a reitoria passou a homologar estudantes
com identificação hereditária até os avós, não mais se pautando pelo critério fenotípico.
Ainda com o intuito atropelar o antigo processo, criou a categoria "pardo com ascendência
indígena" e uma comissão de Recurso com representantes escolhidos a dedo pelo reitor,
deslegitimando a Comissão de Aferição anterior, que era mais representativa e acumulava um
longo debate com o Movimento Negro. Segundo a carta em que os antigos membros da comissão
pedem desligamento, as comissões foram "Demandadas nacionalmente pelo Movimento Negro
[...] fruto da reflexão e acompanhamento no qual se entendeu que não havendo comissões que
façam análise heteroidentificativa de candidatos cotistas raciais, as vagas cairiam na sua
grande maioria para não-negros e não indígenas"[1].
O movimento tem apontado que as alterações descaracterizam o objetivo da política de
cotas, mas a reitoria se mostrou indiferente às críticas e mesmo após o desligamento de
membros da Comissão Permanente de Verificação da Autodeclaração Étnico-racial (CPVA) não
voltou atrás com a sua decisão arbitrária.
Muito nos indigna, mas não nos surpreende que a Reitoria da UFRGS queira modificar o
sistema. A Universidade enquanto um direito social foi historicamente vedada à população
negra, e os setores conservadores da sociedade tem se incomodado com o fato de que, apesar
do racismo - instituição central da sociedade brasileira e marca distintiva da
universidade no Brasil – a população negra tem cada vez mais superado o filtro social do
vestibular. Isto porque para os setores conservadores, a presença da população negra nas
universidade deve-se restringir ao trabalho precarizado e terceirizados na limpeza limpeza
e nos RUs.
Mas em resposta à falta de consideração pelos acúmulos do Movimento Negro no tratamento da
questão e à falta de diálogo da atual gestão da universidade, o Coletivo Balanta
impulsionou a ocupação do prédio da reitoria; demonstrando como deve ser feito o combater
a negação escancarada de um direito social - que mesmo diante de todas as conquistas ainda
precisa avançar muito. Esta é mais uma luta que a classe trabalhadora terá que enfrentar e
combater em meio ao ferrenho avanço neoliberal que estamos enfrentando e precisamos
permanecer firmes e nos espelhar no exemplo do Coletivo Balanta, entendendo que é só
através da luta que poderemos defender as nossas conquistas.
Não satisfeita com a arbitrariedade contida no desprezo institucional em relação ao
posicionamento coletivo, construído historicamente pelo Movimento Negro, a reitoria foi
além, acionando as forças repressivas para garantir a reintegração de posse do prédio
ocupado. Como se já não houvessem arbitrariedades suficientes neste processo, o pedido de
reintegração caiu nas mãos do Juiz Bruno Risch Fagundes de Oliveira, que decidiu acionar
as forças armadas para acabar com a ocupação.
Não podemos deixar de destacar o absurdo representado pelo acionar das forças armadas para
tratar de um conflito político dentro da Universidade e nos sentimos na obrigação, não só
de nos solidarizamos com os/as companheiros/as que ocuparam a Reitoria em protesto a essa
medida, mas de rechaçar veemente a truculência da reitoria da UFRGS, potencializada pelo
delírio autoritário do referido juíz. Além disso, gostaríamos de compartilhar uma análise
sobre o conflito na UFRGS, localizando na atual conjuntura o risco que uma situação como
esta representa para o movimento estudantil à nível nacional.
O significado da intervenção militar
É essencial compreendermos que a cogitação da utilização do exército para reintegrar a
reitoria da UFRGS não é um raio num dia de céu azul, mas está diretamente vinculada à
escalada autoritária na qual os setores mais atrasados da sociedade vem se alicerçando
para tentar passar os seus planos anti-povo. No atual momento vemos as forças armadas se
inflando e avançando em variadas posições para conter a revolta popular que a elite
percebe que fatalmente virá do desmonte dos precários e insuficientes direitos sociais que
querem nos tomar.
Tal situação torna a ocupação da UFRGS mais importante até do que ela já é por si só,
potencializando o significado desta luta que se estende através e além de sua principal
pauta. Com o aprofundamento do golpe e as vacilações da esquerda institucional, cada vez
mais os setores reacionários se veem à vontade para atacar as poucas conquistas que
tivemos nos últimos anos (fruto de muita luta e resistência das/os de baixo). A relevância
desta ocupação não reside apenas no fato de defender que pretas e pretos possam entrar e
permanecer na Universidade. Ela é extremamente importante por isto, mas se torna ainda
mais importante pela inflexão travada com os setores retrógrados da sociedade que, sem
condição de conquistar a hegemonia na esfera política, se voltam para os milicos com o
intuito de fazer valer o seu ataque contra o povo brasileiro.
A situação na UFRGS é de suma importância e é um balão de ensaio. A convocação dos
militares para atuarem na desocupação da reitoria pode criar um precedente para que façam
isso em qualquer lugar em que estudantes se levantarem contra o programa anti-povo, que a
cada dia tem a sua implementação acentuada. É fundamental que compreendamos isso e que,
não só nos solidarizemos de norte a sul do país com o movimento da UFRGS, mas que
denunciemos implacavelmente a tentativa de levar à outro nível a criminalização das lutas
sociais.
Precisamos aprender com o passado. Não podemos repetir os erros dos anos 60 e deixar pra
combater os militares depois que eles já tiverem todo o regime aos seus pés. Foi com
iniciativas como tais, que o golpe de 1964 foi preparado! Não tenhamos dúvidas, de que
cada vez mais a elite retrógrada enxerga a necessidade de ter ao seu lado o máximo de
truculência possível para por em prática a liquidação do país.
Precisamos ter ciência de que apesar de todo o cerco midiático e a tentativa de esvaziar o
debate político, nós vivemos um momento de extrema polarização e entre o povo reina uma
enorme reprovação sobre os ataques que estamos sofrendo. Infelizmente, a maior parte dos
movimentos e lideranças contribuem para a aparente apatia, já que ainda se encontram
iludidos com a corrida eleitoral deste ano, parecendo não terem entendido que o projeto
neoliberal foi acelerado pelo golpe e que a sua reversão nas urnas não está no rol das opções.
Em momentos como este, quando se avolumam contradições, qualquer luta pode ser o estopim
para a eclosão da revolta entre o povo. Que cumpramos com o nosso dever histórico e
denunciemos com todas as nossas forças o que vem acontecendo em Porto Alegre. O momento
pede o máximo de luta e organização, debates, marchas e piquetes, dentro e fora das
Universidades! A direita precisa saber que a esquerda não está morta e que mais uma vez a
juventude está disposta a reivindicar o seu posto na luta!
Rodear de Solidariedade as/os companheiras/os do movimento negro da UFRGS
Avante juventude, a luta é que muda!
Nem um passo atrás, ditadura nunca mais!
12 de março de 2018
GT Estudantil da CAB
Para mais informações e para acompanhar a ocupação:
Página do Balanta: https://www.facebook.com/balantanegritude/
[1] Nota de Desligamento dos Membros da comissão de aferição:
http://reporterpopular.com.br/nota-de-desligamento-de-membros-da-comissao-de-afericao-da-ufrgs-contra-os-retrocessos-na-politica-de-cotas-raciais/
https://anarquismorj.wordpress.com/2018/03/12/nota-do-gt-estudantil-da-coordenacao-anarquista-brasileira-em-solidariedade-aos-estudantes-que-ocupam-a-reitoria-da-ufrgs-em-defesa-das-cotas-raciais/
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