(pt) anarkismo.net: Notas de conjuntura pré-campanha eleitoral: uma visão à esquerda by BrunoL
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Quinta-Feira, 19 de Julho de 2018 - 05:59:19 CEST
Trago estas notas analisando um problema de fundo, os ovos das serpentes do fascismo
sócio-empresarial (linha chilena) estão sendo chocados em escala industrial. ---- Estamos
em plena crise política, uma crise que abala as instituições da chamada "Nova república",
fruto da transição inaugurada a partir da Abertura Lenta, Gradual e Segura de tipo GGG
(Geisel e Golbery, elogiada por Gaspari) e garantida pela Anistia, Ampla, Geral e
Irrestrita - na sua segunda versão e através de jurisprudência obtida com o fim do AI-5.
Na sequência, o Brasil quebrou mas, simultaneamente, a classe trabalhadora aparecia na
cena política através do reformismo radical, então de base e legítimo. Graças a essa luta
social intensa - mesmo que discorde das opções, as quais sigo em discordância - tivemos a
versão substantiva da transição do autoritarismo na metade dos anos '80, através da
Constituição de 1988. Pois bem, é esta versão de democracia liberal com traços
oligárquicos e elementos, contraditoriamente, substantivos e representados até há pouco,
na tentativa de controle do orçamento público que está em jogo. E estamos perdendo o jogo.
14 de julho de 2018, Bruno Lima Rocha
Trago estas notas analisando um problema de fundo, os ovos das serpentes do fascismo
sócio-empresarial (linha chilena) estão sendo chocados em escala industrial. Estamos em
plena crise política, uma crise que abala as instituições da chamada "Nova república",
fruto da transição inaugurada a partir da Abertura Lenta, Gradual e Segura de tipo GGG
(Geisel e Golbery, elogiada por Gaspari) e garantida pela Anistia, Ampla, Geral e
Irrestrita - na sua segunda versão e através de jurisprudência obtida com o fim do AI-5.
Na sequência, o Brasil quebrou mas, simultaneamente, a classe trabalhadora aparecia na
cena política através do reformismo radical, então de base e legítimo. Graças a essa luta
social intensa - mesmo que discorde das opções, as quais sigo em discordância - tivemos a
versão substantiva da transição do autoritarismo na metade dos anos '80, através da
Constituição de 1988. Pois bem, é esta versão de democracia liberal com traços
oligárquicos e elementos, contraditoriamente, substantivos e representados até há pouco,
na tentativa de controle do orçamento público que está em jogo. E estamos perdendo o jogo.
Alguém pode afirmar que a disputa entre neoliberais e social-democratas não é para a
esquerda se meter. No embate político eleitoral entendo que a afirmação está correta. Na
disputa pelos rumos da sociedade brasileira, é justo ao revés. Minha maior preocupação
neste momento é, modestamente, fornecer capacidade analítica por esquerda tentando, ao
mesmo tempo, não ficar a reboque dos apoiadores do governo deposto através de um golpe
jurídico-midiático-parlamentar e, menos ainda, colocando quem atua pela esquerda da
política ainda mais à margem da centralidade dos acontecimentos.
Infelizmente, circula um discurso obtuso por uma parte da esquerda brasileira -
minoritária, é verdade - que confunde o momento estrutural vivido no país - o da crise
político-institucional, quebra do modelo econômico do capitalismo periférico e a ascensão
das carreiras jurídicas como setores protagonistas no Estado brasileiro - com a
radicalidade discursiva. Entendo, respeito e repito ser a capacidade de alinhamento
fundamental para fazer política, ainda mais importante quando o sistema de crenças tem de
estar acima das alocações de recursos de poder disponíveis na concorrência permitida no
liberalismo. Mas, como costumo afirmar, a melhor posição é combinar serenidade, frieza
analítica e fervor ideológico. Acontece, que tal combinação é difícil, bem difícil.
Antes nem farda nem toga. Agora, nem toga e nem farda.
Recentemente afirmei em programa local de TV - local, digo, transmitido para a Região
Metropolitana de Porto Alegre/RS - que não me entusiasmava um ambiente político onde as
pessoas sabiam de cor nomes de magistrados, ministros de tribunais superiores, delegados
da PF e procuradores federais. Isso por si só já caracterizava a presença de uma - algumas
- tecnocracias de carreira em franca ascensão dentro do aparelho de Estado. E, estas
carreiras, pelo próprio poder da caneta e da toga, podem operar como - de fato - Poder
Moderador nos atos da república. Acontece que o caldo já entornou e hoje, quem estiver
fazendo política - mais dentro do que fora das urnas - necessariamente deve contar com
bases e contatos no mundo jurídico.
Neste sentido, há algum paralelo com os anos '50, quando o Estado-Maior do Exército estava
dividido em Progressistas, Nacionalistas, "Democratas" e Intervencionistas. Estes últimos,
gestando na Escola Superior de Guerra (ESG) dois partidos políticos, duas facções interna
corporis e que viriam a disputar todo o poder do Estado para além da capacidade de
governo. Na década em que Vargas pela primeira vez eleito presidente viria a se matar para
não ser deposto, as forças políticas profissionais contavam com marechais - como o
Marechal Henrique Teixeira Lott e o golpe preventivo que garantiu a posse de JK eleito -,
aviadores - como os golpistas João Paulo Moreira Burnier, Haroldo Veloso e sua referência
política Eduardo Gomes -, e navais como o contra-almirante Cândido Aragão (progressista)
ou o almirante fascista Penna Botto -, dentre centenas de outros militares.
O outro paralelo se dá na interna do desenho de Estado no Brasil. Se a Nova República
acabou, e acabou mesmo, e há uma evidente e brutal regressão de direitos, logo, é de se
esperar um embate dentro das elites política, caos na interna do Estado e algum tipo de
conflito social organizado. Mas, este último, o mais relevante para estruturar a sociedade
debaixo para cima, precisa ser organizado e ter alguma referência para além do reboquismo
ou a retomada do pacto anterior do governo deposto. E isso está bem difícil, embora sempre
desejado. Talvez seja esta a dimensão mais complicada que torna vitoriosa a pauta baseada
na luta pela recondução do governo deposto e, ao mesmo tempo, a necessidade de articulação
cada vez maior das esquerdas mais à esquerda - onde me incluo como analista e apoiador.
Cabe observar o perigo real de avanço fascista em nossa sociedade. Explico.
Não se trata "apenas" da aventura de Bolsonaro no rumo da Presidência, embora este
fenômeno por si só já assuste o bastante. Mas a difusão de um punitivismo baseado no pior
do conservadorismo colonial - racista, elitista, nababo, misógino, entreguista, viralata -
que agarra corações e mentes, tanto na geração de concurseiros profissionais, como da
classe média para cima, na pirâmide que se entende olhando de cima para baixo - mesmo
quando não passamos de uns pobres coitados com diploma, rezando para o mês acabar antes da
chegada do próximo boleto de contas atrasadas - e vendo a maioria com asco e distância.
Nunca é demais recordar que o famigerado general Hamilton Mourão Filho, o militar que
comandou a coluna golpista que desceu a estrada Rio-Bahia no sentido do Rio de Janeiro,
era, na década de '30, membro do setor de inteligência da laia dos "galinhas verdes", a
famigerada Ação Integralista Brasileira. Ou seja, a difusão das estupidezes de Plínio
Salgado e Gustavo Barroso - este por sua vida retrógrada era um anti-cristão na
Restauração Católica, espécie de versão brasileira do franquismo - penetrou, e fundo, no
Estado Brasileiro, em especial no período da ditadura getulista ainda sob a Lei de
Segurança Nacional e depois no Estado Novo.
Se vale a comparação, ao difundir as cloacas jorrantes da nova-velha direita na América
Latina - versões atuais dos Chicago Boys e posturas demenciais a favor do proto-fascismo
militar - tais manifestações de pensamento entram com vigor no aparelho de Estado, assim
como sempre seguiram atuando no aparelho policial deste nosso país campeão em execuções
extra-judiciais. A manilha de esgoto já estourou, os dólares gastos pela fundação dos
Irmãos Koch, a lavagem cerebral promovida pela Atlas Network e adjacências já penetrou em
camadas sociais médias e a ideologia do empresariado selvagem pode vir a superar a velha
panaceia oligárquica nacional.
Aconteça o que acontecer em outubro de 2018, a cancha está aberta em 2019 e tudo,
absolutamente tudo, pode vir a acontecer. A esquerda mais à esquerda terá tanta chance de
influenciar nos acontecimentos quanto mais força social e organização de base devidamente
articulada e fazendo sentido com a maioria, estes setores puderem incidir. A campanha
eleitoral formal ainda não começou, mas a luta antifascista não espera soar o gongo para
entrar no ringue.
Bruno Lima Rocha é pós-doutorando em economia política, doutor e mestre em ciência
política, professor de relações internacionais e de jornalismo, editor do portal
Estratégia & Análise (estrategiaeanaliseblog.com / blimarocha gmail.com)
https://www.anarkismo.net/article/31070
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