(pt) anarkismo.net: 2018 e o quarto turno de 2014 que não vai terminar -- todas as fichas estarão apostadas no primeiro semestre de 2019 by BrunoL
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Quarta-Feira, 20 de Dezembro de 2017 - 06:50:47 CET
A única condição de exercício de governo que não a continuidade do período de Temer e do
desmonte seria um pacote revogatório das medidas privatizantes tomadas desde abril de
2016. ---- Bruno Lima Rocha, 13 de dezembro de 2017 ---- É tarefa difícil projetar o ano
de 2018, sendo que o corrente ano não terminou e ainda pelo fato de vivermos o
prolongamento do terceiro turno das eleições presidenciais de 2014. Mas, como o tema
eleitoral está judicializado (a começar pelo julgamento do ex-presidente Lula, marcada a
segunda instância no TRF-4 em 24 de janeiro) e as possibilidades das urnas através da
democracia indireta dependem de manobras do Supremo (caso, por exemplo, o ex-presidente
hipoteticamente condenado venha a recorrer, dentre outras variáveis); acórdãos de última
hora (através de um xeque mate do semiparlamentarismo, não de fato, mas na forma da
"lei"); legislação em causa própria das regras eleitorais pelo Congresso (como o
autofinanciamento sem limite ou a permissividade de participação de empresas estrangeiras
na campanha cibernética); cabe antever aquilo que já está observável. Parece lugar comum,
mas o fato é que o Brasil está vivendo um trauma difícil de cicatrizar.
Em abril de 2016 a presidenta reeleita Dilma Rousseff foi afastada do cargo pela Câmara,
consumando o impeachment no Senado em agosto, sendo que dificilmente a cidadania
brasileira saberá explicar a razão da perda do mandato. As tais "pedaladas" são uma
"piada" grosseira, e a justificativa legal é uma lei de 1950, jamais inteiramente
respeitada, e escrita às pressas para colocar um freio no governo Vargas que iniciaria em
1951, terminando com seu suicídio em 24 de agosto de 1954. Como não há causa jurídica, o
resultado foi fruto do golpe parlamentar, com os legisladores julgando o "conjunto da
obra". Ou seja, uma manobra típica do parlamentarismo.
Em termos de conformação de classe, o "golpe jurídico-midiático-parlamentar" resulta tanto
na quebra de uma aliança de classes espelhada pelo lulismo, como a ascensão - fragmentada,
é verdade - de uma tecnocracia de Estado com ares de estamento e nítida acumulação de
poderes. Se entre 1935 e 1964, com alguns intervalos, as Forças Armadas operaram como um
recurso de tipo Poder Moderador, agora o fator interveniente não veste farda, mas toga.
Refiro-me aos cerca de 17 mil juízes, 13 mil procuradores e órgãos correcionais ou
fiscalizadores, como os delegados da Polícia Federal e auditores da Receita, dentre outros.
O esvaziamento do Poder Executivo, que pela tradição brasileira é o reflexo de um voto que
tende a ser plebiscitário, é acompanhado da incapacidade de exercício de governo. Porque,
além dos dois poderes acima mencionados - o Parlamento com evidente representação de
classe dominante e o Estamento Togado, com ascensão e poder de veto ou moderador - ainda
temos no controle central da economia aos financistas ou seus representantes,
especialmente dentro do na prática "independente" Banco Central (BC). Com o uso e abuso da
taxa básica de juros (Selic), o tripé macroeconômico (e sujeito aos ataques especulativos
do valor do dólar) e a DRU (Desvinculação de Receitas da União) que dispõe de 30% do
orçamento federal para a equipe econômica (ministérios da Fazenda, Planejamento, além do
BC), já é quase impossível governar de acordo com o programa escolhido nas urnas.
Vale observar que "os analistas econômicos" - aqueles que operam no "mercado de notícias
sobre o tal do mercado" - insistem que a baixa da Selic é reflexo do "ajuste e dever de
casa", sendo possível sua elevação para o meio da corrida eleitoral de 2018; vindo a
agravar-se no primeiro trimestre de 2019. Enfim, uma explícita chantagem midiatizada, onde
os mercadores de "notícias plantadas" vociferam o fontismo empresarial e especialmente
especulativo, condicionam o último suspiro democrático na democracia liberal periférica e
capitalista brasileira - a soberania popular manipulada nas campanhas eleitorais - às
vontades dos donos da banca, literalmente.
Infelizmente as restritas condições institucionais existentes no pacto de classes do
lulismo se agravaram após o golpe. Em 2016, o governo ilegítimo de Temer (atado por um
fiapo de legalidade, ou de legalidade questionável) conseguiu aprovar no Congresso a PEC
55/241, ou o Novo Regime Fiscal - do teto dos gastos, conhecida também como a PEC do Fim
do Mundo. Esta Emenda na Constituição simplesmente colide com cláusulas pétreas de
orçamento vinculado, mas o STF nada fez - como quase nada faz quando é para garantir
direitos ou distribuir renda. Mesmo que ocorra a vitória de uma candidatura de
centro-esquerda ou de esquerda, a capacidade de governar dependerá diretamente da
mobilização social em defesa dos direitos adquiridos e retirados de forma ilegítima.
A única condição de exercício de governo que não a continuidade do período de Temer e do
desmonte seria um pacote revogatório das medidas privatizantes tomadas desde abril de
2016. Podemos reconhecer que boa parte da agenda regressiva já estava pautada no segundo
governo de Dilma, mas o golpe liberou os demônios, escancarando a tampa do esgoto
oligárquico e entreguista. Não há muita alternativa, para conter o "processo de
mexicanização", com retirada de direitos e aumento da presença tanto de capital
transnacional no investimento e infraestrutura como o aumento do espaço dos financistas
nas decisões centrais do aparelho de Estado, só revertendo legalmente o que foi feito na
forma de uma "ditadura de classe" através do "semi-presidencialismo de coalizão". Ou seja,
não há mais espaço para um pacto de classes. Ganhe quem ganhe em 2018, ainda será o 4º
turno de 2014.
https://www.anarkismo.net/article/30737
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