(pt) Retomada do 1º de maio na construção da identidade rebelde em Joinville (SC) Por Flavio Solomon¹
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Sábado, 16 de Abril de 2016 - 08:51:23 CEST
“Todos os anos nos deparamos com as tais festas do Primeiro de Maio, promovidas pelas
grandes centrais sindicais e que enchem praças e avenidas com milhares de pessoas. Com o
objetivo de atrair o público, em meio aos shows de artistas famosos, sorteiam até carros e
apartamentos. Esquecemos, no entanto, das origens dessa data tão importante, que marca a
luta dos trabalhadores e das trabalhadoras contra as mazelas do capitalismo e suas brutais
consequências sobre homens e mulheres” ---- Organização Anarquista Socialismo Libertário
(OASL)² ---- O anarquismo atual tem uma breve história em Joinville. No contexto
pós-ditadura civil-militar é possível identificar as agitações anarquistas em meados da
década de 1990 até 2016. No primeiro momento, o anarquismo era uma expressão de setores da
juventude urbana ligada ao punk, que foi importante por promover a circulação de jornais,
informativos e literatura anarquista. Os primeiros anos do século XXI, novamente a
juventude se mobiliza em torno do anarquismo. Porém, é uma juventude que divide o seu
cotidiano entre o trabalho e os estudos. Neste segundo momento, o anarquismo é retomado
por meio das lutas sociais por direito à cidade e do movimento estudantil no ensino médio
e universitário.
É neste contexto que surge um grupo de estudos e ações da militância anarquista, com
objetivo de formar de uma organização de intenção revolucionária. Entre os diferentes
trabalhos realizados, uma das medidas é retomar a relação do anarquismo com o 1º de maio.
A medida tem por intuito central a construção de uma identidade rebelde do povo oprimido
inserido nas lutas sociais.
No informativo do Pró-Coletivo Anarquista Organizado, Palavras de Luta #02 de maio/junho
de 2010, iniciávamos o editorial sobre o 1º de maio como um:
“…momento trágico, e por isso heroico, da classe explorada, quando no ano de 1886, em
Chicago (EUA), travaram manifestações por 8 horas de trabalho, 8 horas de lazer e 8 horas
de descanso. Os patrões, através do Estado, violentamente reprimiram com assassinatos a
luta reivindicativa de trabalhadores que aspiravam uma vida digna (…) Passados 124 anos
desde 1886, a exploração continua ofuscando o sol da liberdade, eclipsando nossa história
de lutas por dignidade, nossas memórias libertárias. Os exploradores tentam nos fazer
acreditar que a transformação social não é possível. Ao realizarmos a Iº Feira de Cultura
Libertária, tendo como tema 1º de maio, uma história de luta, assumimos o compromisso
político de discutir, escrever e propagandear a nossa memória de luta, identificando a
exploração capitalista e estatal no presente, trilhando o caminho aberto por todos os
trabalhadores e trabalhadoras que se dedicaram à revolução social, que se entregaram à
liberdade”.
A Iª Feira de Cultura Libertária ocorreu na Associação de Moradores do Itaum, na zona sul
de Joinville. Promoveu manifestações artísticas e narrativas dos movimentos sociais e
entidades representativas, demonstrando que o dia 1ª de Maio é um momento de memória da
luta da classe explorada, sustentada na realidade, ainda presente, da exploração
capitalista e estatal. O evento procurou articular rodas de conversas sobre as lutas
sociais, banca de livros anarquistas, poesias e filmes curta metragens. A Iª Feira
aconteceu de modo a atender as expectativas da companheirada envolvida, inclusive
apontando para um norte de novas atividades com este formato. Depois da edição que
funcionou bem, infelizmente, em 2011, a militância anarquista não manteve os passos firmes
para continuar a realizar atividade na data.
Entre os anos de 2007 a 2013, a militância anarquista organizava o GEIPA, Grupo de Estudos
das Ideias e Práticas Anarquistas. O grupo de estudos tinha por objetivo debater a ampla
tradição anarquista e temas que julgava pertinentes, quando dialogavam de alguma maneira
com o anarquismo. Foi através dele que realizamos um debate no 1º de maio de 2012.
Em 2012, os trabalhadores e as trabalhadoras em educação de Santa Catarina entraram em
greve. Uma greve de curta duração, sem grande adesão da base da categoria, quase um
movimento das direções sindicais, o que indicava os elementos de burocracia que haviam
tomado conta do sindicalismo do magistério. Estes fatos motivaram o GEIPA a realizar a
exibição do documentário Um pequeno grão de areia, que aborda a realidade combativa dos
trabalhadores e das trabalhadoras da educação no México. A exibição do filme foi um
gatilho para o debate e a reflexão sobre as realidades do trabalho em educação e da luta
sindical em Joinville. O evento contou com professoras e professoras em sua grande
maioria, assim como a companheirada solidária de outras frentes.
Em 2013, a necessidade de retomar o 1º de maio estava presente nas discussões do Coletivo
Anarquista Bandeira Negra. Porém, a realidade apresentava um intenso trabalho de
construção nas pautas da mobilidade urbana e comunitária. Por conta disso, uma ação de
agitação e propaganda nas ruas foi a medida para marcarmos a data. A modesta ação
fortaleceu a convicção da necessidade de realizar de maneira mais efetiva o trabalho. A
dúvida que pairava era a melhor maneira de realizá-lo.
Conscientes das nossas condições, em 2014 a data não foi retomada do modo que desejávamos.
A razão era a forte repressão, especialmente por conta das prisões e aberturas de
processos que companheiros anarquistas sofreriam no contexto pós-jornadas de Junho de
2013. Isso nos levou a não realizar a atividade com o corte político anarquista, mas de
articular – junto a nossa militância inserida na luta sindical – uma atividade em formato
de mesa redonda sobre os rumos das lutas da classe trabalhadora, evento que ocorreu no
Centro dos Direitos Humanos Maria da Graça Bráz. É perceptível o quanto as conjunturas
muitas vezes desgastam as intenções militantes. Foi um recuo tático para concentrar as
energias rebeldes para resistir aos ataques dos patrões e dos governos.
Em 2015 o CABN idealizou o “I Sarau 1º de maio” na tentativa de construir uma identidade
de organização das e dos oprimidos, combate frente todas as formas de dominação. Afinal, o
1ª de maio é uma data fundamental na história dos e das trabalhadoras: empregadas e
desempregados, do campo e da cidade. A atividade foi destinada para cruzar a memória de
luta com as experiências de hoje, tendo como enredo as diferentes manifestações criativas
e combativas dos nossos companheiros e companheiras que se dispuseram a construir o ato.
Memoriando após um ano do evento realizado na sede do CDH, afirmamos que foi uma
importante ação de 1º de maio. Na ocasião, por volta de 80 companheiros e companheiras,
entre trabalhadores e estudantes, jovens e velhos, de diferentes lutas sociais
relacionaram o saber, o pão e a poesia com as lutas das mulheres curdas, com a perda do
escritor latino-americano Eduardo Galeano, a história contada pela compa Grazi, o teatro
comunitário e as canções de “Eu também sou Zé”. Em nossas memórias vibram sorrisos
rebeldes daquela noite de 1º de maio de 2015.
Agora, o CABN mantém o projeto de retomar o 1º de maio como um dia de luta e luto, de
construir uma identidade de luta da classe oprimida. É a forma que encontramos de realizar
uma proposta diferente dos governos, das entidades assistenciais e as grandes centrais
sindicais. Sem deixar de esquecer que os enfretamentos ocorrem em diferentes setores, como
nas memórias e histórias de lutas da classe trabalhadora que não entrega o seu passado aos
patrões e governantes.
[1] Flavio Solomon é militante do Coletivo Anarquista Bandeira Negra, integrante da
Coordenação Anarquista Brasileira.
[2] http://www.anarkismo.net/article/25449.
cabn.libertar.org
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