(pt) anarkismo.net: Bakunin, Malatesta e o Debate da Plataforma by Felipe Corrêa e Rafael Viana da Silva
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Segunda-Feira, 18 de Maio de 2015 - 13:56:15 CEST
A questão da organização política anarquista ---- Nesse artigo, os autores realizam uma
discussão da organização política anarquista. Partem das contribuições relativas ao tema
de Mikhail Bakunin e Errico Malatesta mostrando que há similaridades entre elas e a da
Plataforma Organizacional da União Geral dos Anarquistas. Conforme apontam, Bakunin
constitui a base teórica da Plataforma e Malatesta possui posições que alguma vezes
aproximam-se dela e outras da Síntese Anarquista. Consideram, assim, que nenhuma das
posições em questão pode ser coerentemente inscrita no campo do marxismo/bolchevismo ou de
um suposto "anarcobolchevismo". Os autores analisam o debate entre Malatesta e Nestor
Makhno sobre a Plataforma mostrando onde, realmente, estão as divergências entre ambos.
Por meio de uma reflexão histórica do impacto da Plataforma, demonstram como as críticas
estabelecidas nos anos 1920, em grande medida realizadas por leituras ideologizadas,
somadas a duas experiências práticas dos anos 1950 e a hegemonia francesa na discussão do
tema, vêm pautando erroneamente o debate.
O presente texto - cujo cerne foi retirado da introdução que escrevemos para a edição em
francês de Anarquismo Social e Organização, da Federação Anarquista do Rio de Janeiro[1] -
tem por objetivo discutir a questão da organização política específica anarquista, a
partir das contribuições de Mikhail Bakunin, Errico Malatesta e da "Plataforma
Organizacional da União Geral dos Anarquistas", escrita pelos militantes articulados em
torno da revista Dielo Truda, dentre os quais se encontram Nestor Makhno e Piotr Arshinov.[2]
Para tanto, retomaremos contribuições de Bakunin e de Malatesta e estabeleceremos um
diálogo entre elas e a Plataforma, especialmente por meio do debate entre Malatesta e
Makhno/Arshinov. Discutiremos, também, similaridades e diferenças entre os anarquistas que
defendem o dualismo organizacional e os bolcheviques, as aproximações de Malatesta com a
Síntese, assim como o impacto histórico da Plataforma, que permitirá elucidar as posições
que vêm sendo difundidas acerca desse debate.
***
Conforme demonstram Michael Schmidt e Lucien van der Walt em Black Flame: the
revolutionary class politics of anarchism and syndicalism - livro em que levam a cabo uma
análise teórico-histórica do anarquismo tomando em conta toda sua trajetória nos cinco
continentes -, o anarquismo, como uma ideologia político-doutrinária que emerge durante o
século XIX, teve hegemonia das estratégias de massa, em especial o sindicalismo de
intenção revolucionária (sindicalismo revolucionário e anarco-sindicalismo).
Dentre as posições fundamentais do "anarquismo de massas" estão: a defesa da organização,
das reformas como possível caminho para a revolução (se devidamente conquistadas por meio
da luta de classes) e a utilização da violência devidamente associada a movimentos
populares previamente articulados. Tais noções distinguem-se de outras, comuns, ainda que
minoritárias: antiorganizacionismo, posição contrária às lutas por reformas e violência
utilizada como gatilho para a mobilização popular ("propaganda pelo fato").
Aqueles que tomaram parte no anarquismo de massas e que defenderam o dualismo
organizacional - a organização concomitante em dois níveis, um político e anarquista e
outro social e de massas - não foram maioria. Entretanto, dentre eles há autores
relevantes, posições significativas e, principalmente, uma experiência histórica sólida,
apoiada na construção teórica e prática de organizações anarquistas.[3]
Contribuições de Bakunin
Apesar das obras completas de Bakunin terem sido publicadas recentemente em francês - na
edição de 2000 do IIHS de Amsterdã, depois de tentativas importantes de compilar parte
significativa de sua obra -, seus escritos sobre as chamadas "Fraternidade", de 1864, e
"Aliança", de 1868, para utilizar a terminologia proposta por Max Nettlau, são pouquíssimo
conhecidos.
A estratégia de massas de Bakunin vem sendo melhor discutida, em textos relevantes como,
por exemplo, Bakunin: fundador do sindicalismo revolucionário, de Gastón Leval[4] e vários
outros de René Berthier.[5] No entanto, sua teoria da organização política, amplamente
abordada em documentos escritos com o intuito de fundamentar - em termos de princípios,
programa, estratégia e organicidade - suas propostas político-organizativas, é pouco ou
quase nada discutida.
Parece haver, em especial entre os anarquistas franceses, certo constrangimento desses
escritos, como se constituíssem parte de uma herança autoritária, talvez de inspiração
blanquista e jacobina, que permaneceu no pensamento do autor e que não deveria ser trazida
a tona.[6]
Consideramos que as posições de Bakunin sobre a organização política anarquista, de 1868
em diante, podem ser conciliadas plenamente com sua estratégia de massas, proposta para a
Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT), e, assim, ser considerada parte
relevante de seu anarquismo. Tais posições parecem ter força, ainda hoje, para subsidiar
reflexões frutíferas acerca do modelo organizativo mais adequado para uma intervenção
anarquista na realidade.
Bakunin sustentou que a Aliança da Democracia Socialista (ADS) deveria ter um duplo
objetivo; por um lado, estimular o crescimento e o fortalecimento da AIT[7] ; por outro,
aglutinar em torno de princípios, de um programa e de uma estratégia comum, aqueles que
tivessem afinidades político-ideológicas com o anarquismo - ou, como em geral se chamava à
época, do socialismo ou coletivismo revolucionário.[8] Em suma, criar/fortalecer uma
organização política e um movimento de massas, o dualismo organizacional:
"Eles [os militantes da ADS] formarão a alma inspiradora e vivificante desse imenso corpo
a que chamamos Associação Internacional dos Trabalhadores [...]; em seguida, se ocuparão
das questões que são impossíveis de serem tratadas publicamente - eles formarão a ponte
necessária entre a propaganda das teorias socialistas e a prática revolucionária."[9]
Para Bakunin, a ADS não precisaria ter uma quantidade muito grande de militantes: "o
número desses indivíduos não deve, pois, ser imenso"; ela deveria constituir uma
organização política, pública e secreta, de minoria ativa, com responsabilidade coletiva
entre os integrantes, que reunisse "os membros mais seguros, os mais devotados, os mais
inteligentes e os mais enérgicos, em uma palavra, os mais íntimos", nucleados em diversos
países, com condições influenciar determinantemente as massas trabalhadoras.[10]
Essa organização deveria ter por base comum um regulamento interno e um programa
estratégico, os quais estabeleceriam, respectivamente, seu funcionamento orgânico, suas
bases político-ideológicas e programático-estratégicas, forjando um eixo comum para a
atuação anarquista.
Poderia tornar-se membro da organização somente "aquele que tiver francamente aceitado
todo o programa com todas suas consequências teóricas e práticas e que, junto à
inteligência, à energia, à honestidade e à discrição, tenham ainda a paixão
revolucionária".[11]
Internamente, a organização política bakuniniana não possui hierarquia entre os membros e
as decisões são tomadas de baixo para cima, em geral por maioria (variando do consenso à
maioria simples, a depender da relevância da questão), e com todos os membros acatando as
decisões tomadas coletivamente. Isso significa aplicar o federalismo - defendido como
forma de organização social, que deve descentralizar o poder e criar "uma organização
revolucionária de baixo para cima e da circunferência ao centro" - nas instâncias internas
da organização anarquista.
Externamente, a ADS não deve exercer relação de dominação e/ou hierarquia sobre a AIT, mas
a complementar; o inverso também seria verdadeiro. Juntas, essas duas instâncias
organizativas se complementam e potencializam o projeto revolucionário dos trabalhadores,
sem a submissão de qualquer uma das partes.
"A Aliança é o complemento necessário da Internacional... - Mas a Internacional e a
Aliança, tendendo para o mesmo objetivo final, perseguem ao mesmo tempo objetivos
diferentes. Uma tem por missão reunir as massas operárias, os milhões de trabalhadores,
com suas diferenças de profissões e países, através das fronteiras de todos os Estados, em
um só corpo imenso e compacto; a outra, a Aliança, tem por missão dar às massas uma
direção realmente revolucionária. Os programas de uma e de outra, sem serem de modo algum
opostos, são diferentes pelo próprio grau do seu desenvolvimento respectivo. O da
Internacional, se tomado a sério, contém em germe, mas somente em germe, todo o programa
da Aliança. O programa da Aliança é a explicação última do [programa] da Internacional."[12]
O dualismo organizacional bakuniniano caracteriza-se pela união dessas duas organizações -
uma política, de minorias (quadros); outra social, de maiorias (massas) - e sua
articulação horizontal e permanente potencializaria a força dos trabalhadores e aumentaria
as chances do processo de transformação social com fins anarquistas.
Dentro do movimento de massas, a organização política dá mais eficácia aos anarquistas nas
disputa de posições e na construção de um projeto revolucionário. Ela contrapõe,
organizadamente e em favor de seu programa, forças que agem em sentido distinto e que
buscam: elevar à condição de princípio uma das diferentes posições político-ideológicas
e/ou religiosas, minimizar seu caráter eminentemente classista, fortalecer as posições
reformistas (que veem as reformas como um fim) e a perda de combatividade do movimento,
estabelecer hierarquias internas e/ou relações de dominação, direcionar a força dos
trabalhadores para as eleições e/ou para estratégias de mudança que envolvam a tomada do
Estado, atrelar o movimento a partidos, Estados ou outros organismos que retiram, neste
processo, o protagonismo das classes oprimidas e de suas instituições.
Contribuições de Malatesta
Diversas concepções de Malatesta assemelham-se às previamente expostas[13] , em especial,
um conjunto de proposições organizativas sobre o "partido anarquista" - nome que este
autor utilizava para referir-se à organização específica anarquista. "Partidos" desse tipo
tomaram corpo historicamente e contaram com sua participação, como foram os casos do
Partido Revolucionário Socialista Anarquista, de 1891, do Partido Anarquista de Ancona, de
1913 e da União Anarquista Italiana, de 1919-1920.[14]
Malatesta conceituou o partido anarquista como "o conjunto daqueles que querem contribuir
para realizar a anarquia, e que, por consequência, precisam fixar um objetivo a alcançar e
um caminho a percorrer". Para ele, "permanecer isolado, agindo ou querendo agir cada um
por sua conta, sem se entender com os outros, sem preparar-se, sem enfeixar as fracas
forças dos isolados, significa condenar-se à fraqueza, desperdiçar sua energia em pequenos
atos ineficazes, perder rapidamente a fé no objetivo e cair na completa inação."[15]
Para que os anarquistas pudessem ser eficazes em sua ação, deveriam estabelecer uma
estratégia comum, um programa e superar a forma dos grupos de afinidade sem contato com as
lutas sociais. O objetivo do partido é assim esclarecido: "queremos agir sobre ela [a
massa] e impeli-la ao caminho que acreditamos ser o melhor; mas como nosso objetivo é
libertar e não dominar, queremos habituá-la à livre iniciativa e à livre ação."[16] Esse
caminho seria, evidentemente o da revolução social.
O partido malatestiano fundamenta-se na disciplina revolucionária e nos critérios de
união. "Sem entendimento, sem coordenação dos esforços de cada um para uma ação comum e
simultânea, a vitória não é materialmente possível". Entretanto, "a disciplina não deve
ser uma disciplina servil, uma devoção cega a chefes, uma obediência àquele que sempre diz
para não se mexer". Trata-se de uma disciplina revolucionária, que significa "a coerência
com as ideias aceitas, a fidelidade aos compromissos assumidos, [...] sentir-se obrigado a
partilhar o trabalho e os riscos com os companheiros de luta."[17]
Os critérios de união estabelecem que não basta, como plataforma de associação, a
autoidentificação como anarquista; ainda que desejasse ver todos os anarquistas unidos,
Malatesta afirma: "não acreditamos na solidez das organizações feitas à força de
concessões e de restrições, onde não há entre os membros simpatia e concordância real". E
continua: "É melhor estarmos desunidos que mal unidos".[18]
A propaganda e a educação seriam atividades fundamentais a serem levadas a cabo pelos
anarquistas. "Fazemos a propaganda para elevar o nível moral das massas e induzi-las a
conquistar por si mesmas sua emancipação." Entretanto, esta propaganda precisaria ser
organizada e planejada: "a propaganda isolada, casual, que se faz constantemente para
acalmar a própria consciência ou simplesmente para desafogar a paixão de discutir, serve
pouco ou nada". Para ele, "sementes lançadas ao vento" teriam significativa dificuldade de
germinar e constituir raízes. Seria, assim, necessário "um trabalho contínuo, paciente,
coordenado, adaptado aos diversos ambientes e às diversas circunstâncias". Os anarquistas
também deveriam investir na educação, "educar para a liberdade", "elevar a consciência de
sua própria força e de sua capacidade dos homens que estão habituados à obediência e à
passividade".[19]
Entretanto, a propaganda e a educação, sozinhas, não são suficientes. "Enganaríamos ao
pensar que a propaganda é suficiente para elevá-los [os homens] ao patamar do
desenvolvimento intelectual e moral necessário à realização de nosso ideal."[20] Em
relação à educação, critica os "educacionistas" que
"acreditaram e ainda creem, todavia, que por razão de propagarem a instrução, de
defenderem o livre pensamento, a ciência positiva etc., de fundarem universidades
populares e escolas modernas, pode-se destruir nas massas o preconceito religioso, a
sujeição moral ao domínio estatal, a crença nos direitos sacrossantos da propriedade."[21]
Na realidade, estas iniciativas são muito limitadas: "os educacionistas deveriam, assim,
ver o quão impotentes são seus generosos esforços". A consciência das massas não pode ser
sensivelmente elevada e o ambiente não tem como ser transformado "enquanto durarem as
condições econômicas e políticas atuais".[22]
Assim, Malatesta propõe a realização de um trabalho de base e organizativo, a ser levado a
cabo cotidianamente pelos anarquistas: "em tempos normais", diz, é necessário
"realizar o trabalho amplo e paciente de preparação e organização popular e não cair na
ilusão da revolução em curto prazo, factível somente pela iniciativa de poucos, sem
participação suficiente das massas. A essa preparação, contanto que ela possa ser
realizada em um ambiente adverso, há, entre outras coisas, a propaganda, a agitação e a
organização das massas, que nunca devem ser descuidadas."[23]
As atividades dos anarquistas organizados seriam, portanto, "propaganda do ideal;
organização das forças populares; combate contínuo, pacífico ou violento, segundo as
circunstâncias, contra o governo e os proprietários, para conquistar o máximo de liberdade
e bem-estar para todos."[24]
Bakunin, Malatesta e a Plataforma: "anarcobolchevismo"?
Antes de tudo, quando Bakunin desenvolveu sua práxis - e, assim, sua teoria e sua prática
da organização política anarquista -, a qual influenciará diretamente Malatesta, Lênin
estava nascendo e o bolchevismo demoraria anos para existir. Nesse caso, acusar o dualismo
organizacional bakuniniano de "leninista" implica um lapso histórico considerável.[25]
Ao mesmo tempo, parece também problemático assumir que, por defenderem o dualismo
organizacional, Bakunin, Malatesta e Lênin devem ser considerados parte de uma mesma
corrente ou tradição político-ideológica, assemelhando-se em alguma medida. Como se sabe,
este dualismo foi entendido e praticado de maneira muito distinta na tradição anarquista e
na tradição leninista, incluindo suas variações trotskistas e outras. Qualquer texto
canônico do marxismo-leninismo a este respeito - como, por exemplo, O Que Fazer? de
Lênin[26] - deixa isso evidente. Para além do trabalho paralelo em dois níveis distintos,
um do partido de quadros e outro dos movimentos de massas, não há maiores similaridades.
Bastante sinteticamente, podem-se apontar duas diferenças fundamentais entre a práxis
organizativa de Bakunin e Malatesta e a de Lênin: estrutura interna da organização,
relação entre organização e movimentos de massa.
Em primeiro lugar, a organização política anarquista possui democracia interna e as
decisões são tomadas de baixo para cima. São seus organismos de base, ou mesmo os próprios
militantes da base, que discutem e resolvem todas as questões na organização, visto que
não há hierarquia entre os membros e nem a cisão direção-base. A organização política
leninista, distintamente, baseia-se no "centralismo democrático", que prevê um modelo
organizativo hierárquico, com cisão direção-base, e mesmo que consulte a base para as
decisões, quem de fato delibera é a direção, mesmo contra a posição da base. Não há, por
isso, democracia interna e as decisões são tomadas de cima para baixo.
Muitas vezes se confunde a unidade de ação, defendida por um setor do anarquismo, com o
centralismo democrático. O que marca a diferença entre as duas posições não é a
obrigatoriedade em relação às decisões tomadas, comum em ambos os casos, mas quem toma as
decisões e como elas são tomadas. Nas organizações anarquistas, todos participam e
efetivamente deliberam sobre todas as questões (ainda que por maioria); nas leninistas,
mesmo que haja consulta da base, quem decide e impõe hierarquicamente as decisões é a
direção.
Em segundo lugar, a organização política anarquista funciona de maneira complementar aos
movimentos de massa e não pretende impor qualquer relação de hierarquia e/ou dominação em
relação a eles; sua função é fortalecer o protagonismo desses movimentos, já que as
massas, no projeto anarquista, devem ser as responsáveis pela transformação social
revolucionária. Essa organização é parte das massas e reúne um setor ideologicamente afim
visando fortalecer sua posição nas disputas políticas. A organização leninista,
diferentemente, considera que os movimentos populares possuem somente capacidade para as
lutas de curto prazo, reivindicativas. É o partido que deve dotar-lhes de capacidade
transformadora e, ele próprio, protagonizar a transformação social revolucionária. O
partido é compreendido como um setor separado das massas e busca exercer relação de
hierarquia e dominação em relação a eles, retirando-lhes a independência de classe e o
próprio protagonismo.
Por isso, não concordamos com a afirmação de que essas posições de Bakunin e de Malatesta
- resgatadas, a nosso ver e conforme argumentaremos, em vários de seus aspectos, pela
Plataforma e por diversas organizações políticas anarquistas - constituam algum tipo de
"anarcobolchevismo" ou que apresentem traços leninistas. Tanto Bakunin quanto Malatesta -
e, posteriormente, Makhno, Arshinov, Ida Mett e outros - tiveram como um de seus
importantes temas de reflexão a organização política anarquista estabeleceram seus marcos
dentro dos princípios anarquistas. O vínculo estabelecido entre o dualismo organizacional
anarquista e o leninismo, realizado com alguma frequência no passado e no presente, não
possui qualquer fundamento historiográfico e nem mesmo teórico-lógico. Ele parece estar
muito mais radicado nas lentes daqueles que o realizam, do que no fenômeno histórico em si.
Qualquer um que se debruce no tema com o mínimo de seriedade e honestidade intelectual
verificará o descabimento desta relação de Bakunin, Malatesta e mesmo da Plataforma com o
bolchevismo. No caso da Plataforma, seus principais aspectos baseiam-se na longa tradição
política anarquista e seus autores viveram a experiência de uma revolução social concreta,
esmagada pela política autoritária dos bolcheviques, o que só torna mais absurda a
caracterização de seus autores como anarcobolcheviques.[27]
A Plataforma e o debate entre os anarquistas
"A Plataforma Organizacional da União Geral dos Anarquistas", escrita por um grupo de
russos/ucranianos exilados na França, em 1926, constitui um marco na discussão da
organização anarquista. A nosso ver, o debate sobre este documento tem sido relativamente
truncado e, por alguns motivos, incompreendido por parte significativa das pessoas que se
interessam pelo tema.
Resultado de um processo de autocrítica dos anarquistas em função dos desdobramentos da
Revolução Russa e Ucraniana, a Plataforma foi publicada como uma proposta de programa para
os anarquistas. Dividida em três grandes seções - geral, construtiva e organizacional -,
ela sustenta, entre outras noções: a crítica da sociedade capitalista, do Estado e da
democracia representativa e a centralidade da luta de classes; a necessidade de
protagonismo das massas na revolução, por meio de uma intervenção classista e federalista;
a crítica da ditadura do proletariado como período de transição; a defesa do sindicalismo
de intenção revolucionária como um meio relevante de ação anarquista; o estabelecimento de
uma sociedade pós-revolucionária em que a produção e a terra tenham sido socializadas; a
criação de órgãos para a defesa da revolução; a conformação de uma organização política
anarquista programática pautada na unidade teórica e tática, na responsabilidade e no
federalismo.[28]
Dois motivos podem ser apontados, no que tange à incompreensão da Plataforma,
especialmente tomando em conta as contribuições de Bakunin e Malatesta anteriormente
discutidas.
Em relação a Bakunin, a falta de conhecimento acerca de seus textos sobre a ADS tem
impedido que se notem as similaridades entre a concepção de organização política de
Bakunin e a Plataforma.
Em relação a Malatesta, a divulgação parcial e o enfoque excessivo em parte de sua troca
de correspondências com Makhno acerca da Plataforma - especificamente, a primeira carta
enviada pelo italiano - têm impedido a compreensão mais clara sobre as posições de Malatesta.
Há, ainda, um terceiro motivo, relacionado aos setores que têm pautado este debate no
mundo e, em certa medida, estabelecido a versão sustentada por muitos pesquisadores e
militantes. Parte significativa da discussão sobre a Plataforma vem sendo monopolizada
pela interpretação dominante no anarquismo europeu em geral, e francês em particular,
majoritariamente crítico à Plataforma.
Buscaremos, em seguida, discutir elementos que contribuam com nossa posição acerca dessas
três relevantes questões.
Bakunin e os fundamentos da Plataforma
Compartilhamos com pesquisadores como Schmidt, van der Walt e Frank Mintz[29] , que a
Plataforma, muito mais do que introduzir um novo debate organizativo entre os anarquistas,
retoma elementos fundamentais da estratégia bakuniniana.
Schmidt e van der Walt afirmam corretamente que "Makhno e Arshinov ligaram explicitamente
a Plataforma à herança bakuninista". Citando C. M. Darch sobre a makhnovitchina, eles
afirmam:
"As aspirações de Bakunin 'relativas às organizações, assim como sua atividade na Primeira
Internacional nos dão todo direito' de enxergá-lo como um 'ativo defensor' da ideia que o
anarquismo 'deve unir suas forças em uma organização, em agitação permanente, conforme
exigido pela realidade e a estratégia da luta de classes'."[30]
Elementos fundamentais encontrados na Plataforma são certamente tributários de Bakunin.
Dentre eles a crítica social à dominação capitalista e estatista e a centralidade da luta
de classes, a necessidade de uma intervenção dos anarquistas simultaneamente em dois
níveis, organização anarquista e movimentos de massas (dualismo organizacional), a
necessidade de uma revolução social violenta e as linhas gerais do socialismo libertário
como proposta de sociedade futura.
Mesmo que, em uma análise mais pormenorizada, possamos encontrar diferenças, há
similaridade nas grandes linhas. O funcionamento federalista da organização anarquista,
sem hierarquia ou dominação entre os membros, e sua relação complementar com os movimentos
de massas, também são elementos marcantes, que permitem relacionar Bakunin à Plataforma.
Não é esse o momento para tanto, mas seria possível, sem grandes dificuldades, estabelecer
todos esses paralelos de maneira mais detalhada e bem fundamentada.
Assim, conforme a compreendemos e de acordo com o que mencionamos anteriormente, a
Plataforma, longe de inovar, simplesmente propõe um "retorno", mediante um contexto
histórico concreto, à estratégia organizativa bakuniniana do período pós-1867. E devemos
lembrar que este modelo tomou corpo, em termos teóricos e práticos, em diversas outras
circunstâncias, nas mais distintas épocas e localidades, sendo a Plataforma somente um
desses casos. Por esse motivo, compreendemos que o qualificativo "plataformista" - ainda
que tenha o mérito de diferenciar, entre os anarquistas, uma estratégia organizativa
particular - poderia, sem dificuldades, ser substituído por outros, que fizessem
referência a outros autores, experiências, alguns dos quais apresentaram-se na primeira
grande onda do anarquismo no mundo.
Malatesta, a Plataforma e a Síntese
Ao analisar a polêmica travada em torno da Plataforma[31] , na qual se destaca o debate
Makhno-Malatesta, a aproximação entre Malatesta e a Plataforma não é evidente,
distintamente do que ocorre com Bakunin. Conforme colocamos, tomando em conta as mais de
seis décadas de anarquismo de Malatesta, há momentos em que suas posições são mais
próximas da Plataforma e outros da Síntese Anarquista.[32]
Textos como os publicados em 1897, em L'Agitazione, em especial, "A Organização I" e "A
Organização II"[33] , e compilações como Ideologia Anarquista[34] , permitem que se
identifiquem posições bastante semelhantes às da Plataforma. Entretanto, textos como
"Comunismo e Individualismo"[35] , "Individualismo e Comunismo no Anarquismo"[36] , assim
como as intervenções de Malatesta no Congresso Anarquista de Amsterdã, em 1907[37] ,
possibilitam que se encontrem posições mais próximas da Síntese.
Nos textos mais próximos da Síntese, Malatesta critica o fato de que "anarquistas de
várias tendências, apesar de quererem basicamente a mesma coisa, encontram-se em suas
vidas diárias e em sua propaganda, numa feroz oposição uns aos outros". Defende, a partir
dessa crítica, a necessidade de "chegar a algum entendimento" e "quando o acordo não for
possível, [...] saber como tolerar uns aos outros. Trabalhar juntos quando houver consenso
e quando não houver permitir aos outros que ajam como acharem que for melhor, sem
interferência."[38] Isso deveria ser feito pois o "anarquismo comunista e individualista
são somente uma coisa, ou quase a mesma coisa"; "não existem diferenças fundamentais".[39]
No Congresso de Amsterdã, tentando intermediar as posições dos anarquistas sindicalistas e
outros com influências individualistas, Malatesta afirmou: "a cooperação é indispensável,
hoje mais do que nunca. Sem dúvidas, a associação deve permitir aos membros individuais
completa autonomia e a federação deve respeitar essa mesma autonomia para seus grupos." Se
por um lado ele compreende ser "errado apresentar os 'organizacionistas', os federalistas,
como autoritários", por outro, "é igualmente errado imaginar que os
'antiorganizacionistas', os individualistas, tenham deliberadamente se condenado ao
isolamento." A disputa entre individualistas e organizacionistas seria uma "simples
disputa de palavras".[40]
Essas e outras posições permitiram que autores como Schmidt e van der Walt afirmassem
corretamente que Malatesta "flertou com a posição sintetista em algumas ocasiões".[41] Os
autores também reconhecem que, apesar disso, há momentos em que defende posições bastante
distintas.
O debate entre Makhno e Malatesta: esclarecimentos necessários
No que concerne ao debate entre Makhno e Malatesta sobre a Plataforma[42] , as posições de
Malatesta também se modificam ao longo do debate, truncado por questões de contexto e de
compreensão mútua.
Alguns aspectos relativos ao contexto devem aqui ser pontuados: o fato de Malatesta estar
em prisão domiciliar (domicilio coatto) e bastante afastado das discussões anarquistas; o
problema da tradução da Plataforma que, realizada por Volin, um de seus maiores
opositores, foi "ajustada" ao seu ponto de vista por uma série de escolhas
terminológicas[43] ; uma certa diferença na avaliação do anarquismo no período, sendo os
russos muito mais críticos que Malatesta e, por isso, considerando necessária uma mudança
mais significativa nos padrões organizativos anarquistas. Essa posição crítica também tem
relação com a experiência histórica do anarquismo russo/ucraniano, em que seus progressos
e derrotas contribuíram para reforçar a importância da organização específica anarquista e
de seus eixos fundamentais.[44] Consideramos relevante discutir mais pormenorizadamente
algumas questões desse debate.
Em primeiro lugar, devemos apontar que, para nós, sem dúvidas, tanto Malatesta, quanto
Makhno e os outros russos que escreveram a Plataforma são anarquistas, tomando em conta
uma abordagem histórica e global do anarquismo; ambas as posições podem ser mais ou menos
identificadas historicamente em diversos autores e episódios anarquistas. Malatesta,
principalmente em sua primeira carta, exagera e comete equívocos em sua crítica da
Plataforma. Não há motivos para sua afirmação de que a Plataforma é "tipicamente
autoritária" e que não constitui um documento do anarquismo, mas "um governo, uma igreja",
afirmação que Makhno negou-se a comentar, tamanho era seu descabimento. Malatesta ainda
insinua que a Plataforma admite que "organizar-se significa submeter-se a chefes, aderir a
um organismo autoritário e centralizador, que sufoca toda livre iniciativa".[45] Para nós,
não há dúvidas que a Plataforma é anarquista e não se relaciona com governos, igrejas ou
qualquer tipo de autoritarismo; insere-se, sem qualquer dificuldade, dentro da tradição
histórica do anarquismo e não implica, como foi acusada desde sua publicação por seus
detratores, qualquer desvio bolchevique.
Em segundo lugar, há similaridades inquestionáveis entre as posições de Makhno e
Malatesta, que concordam, por exemplo, sobre a necessidade de os anarquistas
articularem-se em uma organização política revolucionária ("união geral" para o primeiro,
e "partido anarquista" para o segundo). Ambos também concordam, excetuando a problemática
terminológica envolvida[46] , que os anarquistas devem conceber sua organização de maneira
a promover suas ideias e práticas entre as massas (e para isso usam termos como
"influência", "orientação", "sugestão" ou mesmo "direção"), orientando os rumos das lutas
e dos movimentos de trabalhadores para a revolução social e o socialismo/comunismo
libertário.
Malatesta afirma:
"Acredito que nós, anarquistas, convencidos da validade de nosso programa, devemos nos
esforçar para adquirir uma enorme influência e atrair o movimento para a realização de
nossos ideais. Mas tal influência deve ser obtida fazendo mais e melhor do que os outros,
e será útil apenas se a obtivermos dessa forma."[47]
Makhno, similarmente, defende que "o anarquismo é uma doutrina social revolucionária que
deve inspirar os explorados e oprimidos"[48] nas lutas pela transformação social, ou, como
propõe a Plataforma, deve fazer penetrar as "posições anarquistas revolucionárias" nos
movimentos de "trabalhadores e camponeses"; constituir-se como "pioneiro" e "guia teórico"
das organizações populares das cidades e dos campos.[49] O "Suplemento à Plataforma"
afirma que as ferramentas para a influência das massas devem ser: "a propaganda, a força
da opinião, a argumentação pela palavra e os escritos".[50]
Em terceiro lugar, devemos colocar que duas das críticas de Malatesta à Plataforma são
completamente descabidas: que os russos estariam propondo uma organização hierárquica e
que o Comitê Executivo (apesar do seu nome, que indica que ele executa e não delibera)
deveria controlar as decisões da organização.
Não foi a toa que Makhno surpreendeu-se com o primeiro texto de Malatesta, dizendo: "minha
impressão é que você não compreendeu o projeto da 'Plataforma'"[51] , o que, convenhamos,
em alguma medida é verdade.
A Plataforma é clara no que diz respeito às funções do Comitê Executivo:
"A execução das decisões tomadas pela União com as quais são confiados; a orientação
teórica e organizacional da atividade de organizações isoladas consistente com as posições
teóricas e a linha geral tática da União; a monitoração do estado geral do movimento; a
manutenção das relações de trabalho e organizacionais entre todas as organizações da
União; e com outras organizações."[52]
Trata-se, a nosso ver, de um tipo de secretariado que encaminha as decisões tomadas pela
base da organização.
A forma organizativa proposta é federalista, construída pela base, de baixo para cima,
conciliando "a independência e a iniciativa dos indivíduos e da organização que servem à
causa comum". Contudo, para que as "decisões compartilhadas" - ou seja, socializadas entre
o conjunto da militância e estabelecidas coletivamente - possam ser levadas a cabo, o
federalismo exige que os militantes "assumam deveres organizacionais fixos e exige a
execução de decisões compartilhadas".[53]
Não há nada na Plataforma e nos documentos relacionados a ela que permita relacioná-la a
um modelo de organização hierárquica ou com dominação (interna ou em relação às massas) e
nem conceber o Comitê Executivo como um tipo de comitê central que decidiria os rumos da
União Geral.
O debate entre Makhno e Malatesta: divergências reais
Neste momento, identificaremos questões que, realmente, tomando em conta todo o debate,
constituem discordâncias reais entre ambos os militantes.
A questão que, sem dúvidas, ocupou a maior parte do debate foi a da responsabilidade
coletiva. Para Malatesta, num primeiro momento, a ideia de que haveria uma
responsabilidade mútua entre militante e organização ("toda a união será responsável pela
atividade revolucionária e política de cada membro; e cada membro será responsável pela
atividade revolucionária e política da união"[54] ) constituiria uma "absoluta negação de
toda independência individual, de toda liberdade de iniciativa e de ação".[55]
Responsabilidade, para Malatesta, significa, neste texto, autonomia e independência dos
indivíduos e grupos: "Total autonomia, total independência e, portanto, total
responsabilidade de indivíduos e grupos."[56]
Makhno, em sua primeira resposta, afirma que Malatesta sempre aceitou a responsabilidade
individual dos militantes anarquistas: "você mesmo, querido Malatesta, admite a
responsabilidade individual do revolucionário anarquista"[57] ; sua rejeição da
responsabilidade coletiva seria, para Makhno, fundamentada na "falta de bases" e "perigosa
para a revolução social".[58] Makhno relaciona, ainda, a responsabilidade coletiva à
questão da influência ideológica anarquista das massas:
"O espírito coletivo e a responsabilidade coletiva de seus militantes permitirão ao
anarquismo moderno eliminar de seus círculos a ideia, historicamente falsa, de que o
anarquismo não pode ser um guia - seja ideologicamente, seja na prática - para a massa
trabalhadora num período revolucionário, e portanto não poderia exigir a responsabilidade
total."[59]
Arshinov, reforçando as posições de Makhno e criticando Malatesta, reforça o sentido da
responsabilidade coletiva da seguinte maneira:
"A atividade prática de um membro da organização encontra-se naturalmente em plena
harmonia com a atividade geral e, inversamente, a atividade de toda a organização não
poderia estar em contradição com a consciência e com a atividade de qualquer um de seus
membros, se ele aceitou o programa que funda a organização."[60]
Uma organização anarquista só poderia fundamentar-se em tal princípio, visto que cada
membro "não poderia realizar seu trabalho político e revolucionário senão no espírito
político da União" e "sua atividade não poderia ser contrária ao que foi elaborado por
todos os seus membros".[61]
Na resposta seguinte, Malatesta relativiza e, ainda que dizendo ser possível relacionar a
responsabilidade coletiva a militares que matam soldados rebeldes, exércitos que dizimam
populações em invasões e governos - outra comparação, a nosso ver, completamente descabida
- assume:
"Apoio a visão de que qualquer um que se associa e coopera com outros por uma causa comum
deve: coordenar suas ações com a de seus companheiros e não fazer nada que prejudique o
ação dos outros e, portanto, a causa comum; respeitar os acordos feitos - exceto quando
pretendem deixar a associação por diferenças de opinião, mudança de circunstâncias ou
conflito sobre métodos escolhidos tornam a cooperação impossível ou imprópria. Assim, eu
sustento que aqueles que não sentem nem praticam tais deveres têm de ser expulsos da
associação."[62]
Ele complementa sua relativização dizendo que "talvez, falando de responsabilidade
coletiva, você se refira precisamente ao acordo e à solidariedade que devem existir entre
os membros de uma associação" e enfatizando que, se fosse esse o caso, "logo alcançaríamos
a concordância".[63]
Makhno, na resposta seguinte, volta a afirmar que "a ação anarquista em grande escala só
pode alcançar resultados se possui uma base organizativa bem definida, inspirada e guiada
pelo princípio da responsabilidade coletiva dos militantes".[64]
Malatesta chega a afirmar, algum tempo depois, que a responsabilidade é essencialmente
individual: "a responsabilidade moral (pois no nosso caso não pode senão tratar-se de
responsabilidade moral) é individual pela sua própria natureza".[65] E mais: "Se entre
homens que se puseram de acordo para fazer alguma coisa, algum destes, faltando ao seu
compromisso, faz fracassar a iniciativa, todos dirão que é ele o culpado e portanto o
responsável, e não aqueles que fizeram até ao fim tudo o que deviam fazer."[66]
Em suma, pode-se dizer que há alguns pontos de acordo e outros de divergência nessa
polêmica entre Malatesta e os redatores de Dielo Truda. Malatesta não abre mão de que a
responsabilidade é essencialmente individual, ainda que compreenda a necessidade de ações
coordenadas, acordo e respeito destas ações e destes acordos por parte dos membros da
organização anarquista. Para Makhno e Arshinov, a responsabilidade é individual e
coletiva, vincula necessariamente militante e organização, fazendo um responsável pelo
outro, e relaciona-se à função de guia do anarquismo no processo revolucionário. Há,
conforme nota o próprio Malatesta[67] , uma incompatibilidade entre a noção de
responsabilidade coletiva e a posição de completa independência e autonomia que ele mesmo
defende.
Outra divergência relaciona-se à necessidade maior ou menor de unificação dos anarquistas:
ao passo que os russos defendem que a organização anarquista deve reunir a maioria, senão
todo o setor organizado e revolucionário dos anarquistas - enfatizando a "grande
necessidade de uma organização que [reúna] a maioria dos participantes do movimento
anarquista"[68] -, Malatesta afirma: "abandonemos, portanto a ideia de reunir todos numa
única organização". Ao passo que a fragmentação para os russos constituía um problema
central, ela parece não ser tão essencial para Malatesta.
Há ainda divergências muito importantes em relação à organicidade - ou seja, o
funcionamento orgânico desse agrupamento de anarquistas -, que envolve o nível de
compromisso e autonomia dos membros e grupos que pertencem à organização em relação às
decisões coletivas e o método decisório utilizado para deliberação.
Para Makhno e os russos, seria fundamental a atuação com uma estratégia e um programa
claros que, mais do que princípios anarquistas, estabelecesse um caminho comum e unitário
para o conjunto da organização: "esse papel [dos anarquistas na revolução] só pode ser
desempenhado com sucesso quando nosso partido é ideologicamente homogêneo e unificado à
partir do ponto de vista das táticas".[69] Makhno afirma ainda: "nosso Partido deve [...]
definir sua unidade política e seu caráter organizativo"[70] ; posição similar ao que
Arshinov chamou de "programa teórico e prático homogêneo"[71] , o qual, deliberado
coletivamente, seria obrigatório para todos seus membros.
Para Malatesta, todos os membros e grupos da organização deveriam ter a mais completa
autonomia: as decisões não seriam obrigatórias, mas apenas recomendações que poderiam ou
não ser seguidas: "total autonomia, total independência e, portanto, total
responsabilidade de indivíduos e grupos", sendo que as decisões congressuais dessa
organização "não são regras obrigatórias mas sugestões, recomendações, propostas".
Malatesta chega mesmo a elevar essa posição - a nosso ver relacionada à estratégia
organizativa - à condição de princípio do anarquismo, quando enfatiza os "princípios da
autonomia e da livre iniciativa que os anarquistas professam"[72] , o que não nos parece
verdadeiro desde um ponto de vista histórico.
Arshinov questiona: "Qual seria o valor de um congresso que só faria emitir 'opiniões' e
que não se encarregaria de realizá-las na vida? Nenhum. Em um vasto movimento, uma
responsabilidade unicamente moral e não-organizacional perde todo o seu valor."[73]
Aborda, indiretamente, a questão da responsabilidade coletiva anteriormente discutida.
Quando trata de assuntos relacionados ao programa da organização anarquista, Malatesta os
relaciona mais com os princípios anarquistas do que com uma estratégia bem definida. Ele
chega a afirmar, distintamente dos textos de 1897, que o partido anarquista é "o conjunto
dos que estão do mesmo lado, que têm as mesmas aspirações gerais, que de uma maneira ou de
outra lutam pelo mesmo fim contra adversários e inimigos comuns"; ou seja, esse partido
seria conformado quase automaticamente, pelo simples fato de existirem anarquistas,
"partidários" do anarquismo.
Makhno e os russos defendem que, para a conformação de uma estratégia coerente e de um
programa para a organização anarquista, em caso de divergência nas posições, adote-se a
votação por maioria, sendo o conjunto da organização vinculado completamente às
deliberações e obrigado a cumpri-las - se decidir permanecer na organização, visto que há
direito pleno de cisão.
Malatesta critica as decisões por maioria e propõe que as divergências sejam ajustadas
voluntariamente, por meio de um certo tipo de consenso-dissenso, que dependeria do bom
senso da militância em contribuir com o andamento das atividades organizativas: "adaptação
[que] deve ser recíproca, voluntária e derivar da consciência da necessidade de não
paralisar a vida social por mera teimosia". Trata-se, para ele, de trabalhar com um
programa amplo, em torno dos princípios anarquistas, que permita a cada membro e grupo da
organização colocar quaisquer ações em prática que julguem estar contribuindo para este
programa.
Malatesta, mais próximo da Síntese ou da Plataforma?
Como as obras completas de Malatesta não estão ainda publicadas, sequer em italiano,
teremos de esperar até que isso seja feito para aprofundar as discussões sobre as posições
de Malatesta: quais foram majoritárias, quais foram minoritárias, se essas posições podem
ser relacionadas a períodos determinados de sua vida etc.
O que se pode concluir, por ora, é que, conforme afirmamos, há posições variadas que
permitem diferentes interpretações; especificamente no que diz respeito ao debate
Plataforma-Síntese, pode-se, sem grandes dificuldades, aproximar suas posições de um ou
outro campo, a depender dos textos e trechos tomados em consideração.
Debate, impacto histórico da Plataforma e domínio da interpretação sintetista
A desconfiança de grande parte dos anarquistas em relação aos elementos que culminariam na
formalização da Plataforma começou em 1923, logo após a publicação do livro A História do
Movimento Makhnovista, de Arshinov.[74] Ela foi difundida em pouco tempo por meio das
redes políticas que os anarquistas faziam parte.
Marc Mrachny, ex-membro da organização Nabat que passou alguns dias com os makhnovistas,
publicou uma série de críticas a eles, em julho de 1923, no periódico Via Operária, órgão
dos anarco-sindicalistas russos editado em Berlim. Escreveu ele que o papel de Makhno foi
supervalorizado por alguns anarquistas em detrimento da classe trabalhadora e que a
makhnovitchina constituiu uma espécie de "anarquismo militar". No mesmo número da revista,
Mrachny escreveu uma resenha do livro de Arshinov, que havia causado certo desconforto em
função da crítica realizada a determinados setores "intelectuais" do movimento
anarquista.[75] O último capítulo deste livro de Arshinov, intitulado "A Makhnovitchina e
o Anarquismo", possui vários elementos que posteriormente serão aprofundados pelos membros
de Dielo Truda e expostos na Plataforma. Possivelmente, esta é a primeira contribuição que
dará origem à Plataforma alguns anos depois.[76]
Em março de 1924, foi a vez do anarquista V. Judoley comparar pejorativamente os
anarquistas russos aos socialistas de esquerda, que atuavam por meio de uma organização
política hierarquizada. Em outro artigo crítico, escrito por E. Z. Dolinin (Moravsky), os
sovietes livres da Ucrânia foram considerados uma forma de Estado, que "convém muito bem
'aos mais honestos marxistas bolcheviques do que aos anarquistas'". À crítica realizada
por Arshinov, de que parte considerável dos anarquistas não participou da insurreição na
Ucrânia, Moravsky respondeu que o "anarquismo não pode apoiar-se em baionetas, não pode
ser senão o produto da cultura espiritual da humanidade."[77]
Como se pode perceber, as críticas à makhnovitchina, fenômeno oriundo da luta popular
ucraniana e dos anarquistas naquela região, foram geralmente descabidas e refletem um
desconhecimento não somente do episódio histórico em questão, mas mesmo do próprio
anarquismo. Tais críticas equivocaram-se ao tentar desvincular os makhnovistas da tradição
anarquista, em função da utilização da violência revolucionária, visto que esta foi
utilizada por praticamente todos os anarquistas que se envolveram em episódios
revolucionários na história. Essa violência constituiu-se, ao mesmo tempo, como
resistência aos ataques de seus múltiplos inimigos e como ferramenta para impulsionar seu
programa revolucionário anarquista. Essas e outras críticas ao movimento makhnovista foram
respondidas por Arshinov e Makhno, em longos artigos. Elas foram responsáveis por gerar
desagradáveis polêmicas no interior do anarquismo internacional, especialmente o europeu.
As críticas aos setores intelectuais anarquistas não foram exclusividade de Arshinov.
Anatol Gorelik - anarquista russo, que se exilou na Argentina em 1922 e que contribuiu de
Buenos Aires com Dielo Truda - publicou em junho do mesmo ano Os Anarquistas na Revolução
Russa. Além de um apanhado geral sobre os eventos na Rússia, ele criticou os intelectuais
anarquistas que se isolaram do movimento dos trabalhadores.[78]
Com a publicação da Plataforma em 1926, o debate que vinha se dando em relação ao processo
revolucionário russo e ucraniano e as contribuições escritas de seus membros pôde ser
aprofundado; além disso, seus defensores tiveram melhores condições para buscar a
concretização de seu projeto organizativo.
Um profundo debate, possivelmente o maior na história acerca da organização anarquista,
durou até o início dos anos 1930. Contou com a participação não somente de Makhno e
Malatesta, mas Arshinov, Volin, Luigi Fabbri, Camilo Berneri, Sébastien Faure, Maria
Isidin, G. P. Maximoff entre outros. Ao passo que os membros de Dielo Truda explicavam e
aprofundavam as linhas da Plataforma, os outros anarquistas, em geral, a criticavam. Como
no debate entre Makhno e Malatesta, algumas destas críticas demonstravam divergências
reais e outras fundamentavam-se em mal-entendidos ou mesmo em disparates grosseiros.[79]
Dentre esses absurdos, encontram-se as posições de Volin e outros sintetistas que, em
1927, concluíam que a Plataforma constituía um "revisionismo em direção ao bolchevismo,
escondido pelos autores".[80] Posição esta que, apesar de não possuir fundamento, foi
adotada posteriormente por vários anarquistas e estudiosos do anarquismo.
Na tentativa de concretizar seu projeto organizativo, em 1927, os anarquistas de Dielo
Truda lançaram um chamado para a constituição de uma federação internacional a partir das
bases da Plataforma. Para tanto, realizaram, em 5 de fevereiro de 1927, uma reunião
preliminar em Paris, com o objetivo de articular uma conferência internacional naquele
mesmo ano. Participaram desta reunião militantes de Bulgária, China, Espanha, França,
Itália, Polônia e Rússia. Uma comissão provisória foi formada pelos anarquistas Chen
(chinês), Makhno (ucraniano) e Ranko (polonês).
Circulares foram enviadas a diversos grupos anarquistas. A conferência internacional
ocorreu efetivamente em 20 de abril de 1927, também em Paris. Ao final do encontro, os
militantes chegaram a alguns acordos: reconhecer a luta de classes como o aspecto mais
importante da idéia anarquista, o anarco-comunismo como base do movimento e o sindicalismo
como principal método de luta; reconhecer a necessidade de uma união geral dos anarquistas
baseada na unidade tática, ideológica e na responsabilidade coletiva e, além disso, a
necessidade de um programa positivo para realização da revolução social.
No entanto, a conferência sofreu um grande revés: a polícia invadiu e prendeu todos os
presentes. Makhno só não foi deportado devido a uma campanha feita pelos anarquistas
franceses. Mesmo com as propostas estabelecidas, muitos grupos, inclusive dos
participantes desta conferência, não puderam ou não conseguiram levar a cabo as resoluções
tiradas no encontro.[81]
Apesar disso, houve alguns resultados práticos dessas iniciativas. Na França, os
plataformistas foram responsáveis pela transformação, em 1927, da Union Anarchiste
Communiste em Union Anarchiste Communiste Révolutionnaire, cujas posições eram
majoritárias na organização, que durou três anos; eles também criaram a Fédération
Communiste Libertaire, cuja existência deu-se entre 1934 e 1936.[82]
Na Itália, os plataformistas criaram a União Anarquista Comunista, de existência breve.
Ainda assim, a experiência mais relevante do período foi levada a cabo na Bulgária, quando
a Federação dos Anarco-Comunistas da Bulgária (FAKB), fundada em 1919, adotou a Plataforma
um pouco após sua publicação, a qual serviu para subsidiar sua prática política. A
experiência do plataformismo búlgaro destacou-se entre os grandes episódios do anarquismo
durante as décadas de 1920 e 1940 e envolveu uma expressão de massas considerável,
abarcando sindicalismo urbano e rural, cooperativas, guerrilha e mobilização de
juventude.[83] A Plataforma da Federação dos Anarco-Comunistas da Bulgária, publicada em
1945, possui influência direta da Plataforma e aborda "questões cruciais em termos de
tática e organização, rejeitando a forma de organização em partido político" e subsidiou
um movimento que "tinha clareza significativa para defender-se dos bolcheviques", mas foi
dizimado pelo stalinismo e pelo fascismo.[84]
Esse debate ressurgiu com força entre os anarquistas depois da Segunda Guerra Mundial,
mais significativamente na França e na Itália. A Plataforma influenciou tanto a Fédération
Communiste Libertaire (FCL), francesa, como os Gruppi Anarchici di Azione Proletaria
(GAAP), italianos, ambos dos anos 50 e que se coordenaram numa Internacional Comunista
Libertária de inspiração plataformista.[85]
O caso da Federação Anarquista francesa/francófona (FAF) foi o mais emblemático, no que se
refere às consequências desse debate organizativo. Fundada em 1945, a FAF tomava como base
organizativa a Síntese de Sébastien Faure e possuía diferentes tendências em seu seio:
individualistas, humanistas, sindicalistas, comunistas libertários entre outros.[86] A
partir de 1950, uma tendência encabeçada por Georges Fontenis e influenciada pela
Plataforma passou a reunir-se sem o conhecimento dos demais e fundou a Organisation Pensée
et Bataille (OPB), uma organização secreta cujo objetivo era dar à FAF uma direção
revolucionária, afastando dela aqueles contrários à luta de classes e ao anarquismo
social.[87]
Nos três anos posteriores à sua fundação, a OPB cresceu em influência e, no Congresso de
Paris, em 1953, já sem muitos de seus membros, a FAF tornou-se, por influência dos
plataformistas, Fédération Communiste Libertaire (FCL), e adotou o "Manifesto Comunista
Libertário" de Fontenis, também inspirado na Plataforma, como documento programático.[88]
Sua existência foi relativamente breve e, entre 1956 e 1957, a FCL encerrou suas
atividades, principalmente em função da Guerra de Independência da Argélia de 1954, na
qual seus militantes tomaram parte, da repressão, da ascensão do Partido Comunista Francês
e de seus próprios equívocos.[89]
No entanto, tal processo não se deu sem imensos traumas, especialmente em função da
exclusão dos membros da FAF, que envolveu todos seus fundadores, e do modo como se
constituiu a OPB e como ela fez valer suas ideias. Já nos fins de 1953, a FAF
reconstituiu-se retomando a proposição sintetista e a disputa com a FCL permaneceu até seu
fim.[90] Além da incorporação de elementos teóricos do marxismo, tais como o materialismo
dialético[91] , o que já seria controverso, a FCL envolveu-se em dois episódios mais
complicados. O primeiro, ao decidir, em 1955, apresentar candidatos para a campanha
eleitoral de 1956, fato que, mesmo sendo posteriormente objeto de autocrítica de seus
membros, rendeu na época críticas tanto por parte dos sintetistas quanto cisões de setores
plataformistas importantes, como aqueles que conformaram em seguida os Groupes Anarchistes
d'Action Révolutionnaire (GAAR) e o periódico Noir et Rouge. O segundo, a proximidade com
André Marty, que se candidatou às eleições de 1956 junto com Fontenis e outros da FCL.
Marty era um ex-membro do Partido Comunista Francês e, durante a Revolução Espanhola,
havia ficado responsável pelas Brigadas Internacionais e ordenado a matança de dezenas de
anarquistas.[92]
Na Itália, a constituição dos Gruppi Anarchici di Azione Proletaria (GAAP) foi levada a
cabo por um setor plataformista da Federação Anarquista Italiana. Expulso em 1950, este
setor - que criticava o reformismo e o idealismo da organização de origem e propunha a
criação de um partido anarquista inspirado pela Plataforma - continuou sua atuação como
GAAP até 1956, quando se fundiu com outros grupos marxistas para conformar a Azione
Comunista, setor à extrema-esquerda do Partido Comunista Italiano que contribuiu, em
seguida, com a conformação do Movimento della Sinistra Comunista.[93]
Apesar dessas questões, tanto o plataformismo francês como italiano tiveram desdobramentos
ulteriores, influenciando organizações que existem até o presente e que se inscrevem, em
sua ampla maioria, dentro do campo anarquista.
Não é difícil prever as consequências das análises do plataformismo francês e italiano
desse período e sua generalização para todos os setores do anarquismo inspirados no
dualismo organizacional em geral e na Plataforma em particular. Apesar das virtudes dos
projetos em questão - e não há dúvidas de que há contribuições relevantes no campo teórico
e prático por parte dos plataformistas franceses e dos italianos dos anos 1950 -, nos
parece claro que parte significativa deles, em especial nos casos da FCL e do GAAP,
implicou graves problemas. O modo de constituição e de atuação da OPB, a posição em favor
das eleições da FCL e sua aproximação com um comunista autoritário do porte de Marty e a
fusão do GAAP com os marxistas são exemplos que, mesmo constituindo parte de um contexto
específico, romperam com os princípios e a estratégia anarquistas enunciados na Plataforma.
E, sem dúvidas, municiaram os adversários da Plataforma de poderosos argumentos. Se a
polêmica da Plataforma foi complicada em sua época, envolvendo os problemas anteriormente
apresentados, e se, desde sua publicação, foi acusada por seus detratores de ser um desvio
bolchevique, os casos francês e italiano reforçaram essas críticas.
Abstendo-se de uma análise menos ideologizada da Plataforma, de uma comparação entre seus
elementos fundamentais e os clássicos anarquistas e esquecendo-se voluntariamente do caso
do plataformismo búlgaro[94] , os sintetistas terminaram generalizando esses exemplos,
especialmente o chamado "caso Fontenis" [L' affaire Fontenis], na França, e colocando-os
como típicos do modus operandi plataformista.
Constituiu-se, assim, o argumento que passou a equiparar, em grande parte dos casos, o
dualismo organizacional bakuniniano[95] e plataformista, a um tipo de desvio marxista e/ou
bolchevique no anarquismo, a um tipo de anarcobolchevismo. O domínio interpretativo da
Plataforma por parte dos sintetistas franceses e a difusão desse argumento, por via oral e
escrita, explicam como tais posições se consolidaram acriticamente pelo mundo, entre
pesquisadores e militantes.
Concluindo
Mesmo que o dualismo organizacional não tenha sido defendido pela maioria dos anarquistas
organizacionistas, ele possui representantes de inquestionável importância e envergadura
entre os anarquistas: Bakunin, Malatesta e os redatores de Dielo Truda, dentre os quais se
encontram Makhno e Arshinov.
Bakunin levou a cabo uma práxis a partir do fim dos anos 1860 que, tomada em conta desde
seus aspectos teóricos e práticos, abarca a Aliança da Democracia Socialista e a
Associação Internacional dos Trabalhadores, e permite extrair importantes contribuições
para o debate em torno da organização política anarquista. São,a nosso ver, estas posições
que constituem os fundamentos basilares da Plataforma do Dielo Truda. Malatesta também
possui posições que se aproximam da Plataforma, ainda que, conforme colocamos, isso não
ocorra em todos seus escritos sobre o tema. Ele não somente apresenta divergências em
relação à algumas questões da Plataforma, mas, em variados momentos, chega a se aproximar
da Síntese.
Levando em conta o papel de Bakunin e de Malatesta no anarquismo e mesmo o de figuras como
Makhno e Arshinov, parece impossível querer equiparar suas posições a algum tipo de desvio
leninista/bolchevique ou a um suposto "anarcobolchevismo". Por uma questão lógica, afirmar
que a Plataforma possui posições autoritárias significa imputar a mesma responsabilidade a
Bakunin. E, sem dúvida alguma, parece-nos bastante evidente que ambos são anarquistas e
que suas posições acerca da organização política anarquista são plenamente conciliáveis
com suas outras posições.
Ao analisar o debate entre Malatesta e Makhno/Arshinov podemos concluir o seguinte. Como
afirmamos, não há dúvida que as posições em questão são anarquistas, que elas estão de
acordo sobre a necessidade de se organizar os anarquistas em dois níveis - como
trabalhadores nos movimentos populares de massas e como anarquistas nas organizações
políticas revolucionárias - e sobre o dever dos anarquistas de influenciar o máximo
possível os trabalhadores em geral. Ao mesmo tempo, consideramos descabidas as críticas de
Malatesta de que a Plataforma estaria propondo um modelo hierárquico de organização e de
que o Comitê Executivo proposto por ela teria como função controlar as decisões da
organização.
De qualquer forma, é possível identificar ao menos três divergências reais entre Malatesta
e Makhno/Arshinov, que envolvem as seguintes questões: responsabilidade individual e
coletiva, problema da fragmentação e necessidade de união dos anarquistas, nível de
autonomia e independência de indivíduos e grupos na organização anarquista. Se para
Malatesta a responsabilidade é essencialmente individual, para Makhno e Arshinov ela é
individual e coletiva, vinculando ao mesmo tempo militante e organização. Se para
Malatesta a fragmentação dos anarquistas não é problema de primeira ordem, para Makhno e
Arshinov esta fragmentação deve ser superada a todo custo, permitindo a união do maior
número de anarquistas possível, desde que estejam de acordo com o programa e a estratégia
da organização. Se para Malatesta os indivíduos devem ter as mais amplas autonomia e
independência nos grupos e estes nas federações, para Makhno e Arshinov a unidade de ação
é fundamental, ainda que atingida se for necessário, por meio de votação da maioria.
Finalmente, devemos dizer que, para nós, há um nexo entre determinadas posições de
Bakunin, de Malatesta e da Plataforma, que permitem conformar uma potente teoria da
organização política anarquista e que serviu de inspiração para experiências políticas
importantes. No caso específico da Plataforma, ela inspirou um conjunto considerável de
práticas políticas anarquistas e, conforme apontado, as experiências francesas e italianas
dos anos 1950, apesar de suas virtudes, ofereceram elementos para o argumento do "desvio
bolchevique" que vinha sendo pregado desde que a Plataforma foi publicada. Considerando a
análise ideologizada do debate e os casos em questão, e adicionando o domínio francês na
discussão do tema, temos a explicação do porquê a Plataforma tem sido considerada como um
elemento bolchevizante do anarquismo, ou mesmo algo estranho à tradição anarquista. O que
procuramos mostrar que não possui qualquer fundamento.
No Brasil, ainda que haja notícias sobre o recebimento de Dielo Truda pelos anarquistas
russos sediados no Rio Grande do Sul[96] , a Plataforma parece não ter sido discutida
naquele momento e nas décadas posteriores. Mesmo havendo variadas posições de anarquistas
ao longo do século XX que possuem similaridades com as noções esposadas na Plataforma[97]
, foi somente entre o fim dos anos 1990 e o início dos 2000 que o texto foi lido,
traduzido e discutido pela militância brasileira.[98] Quem encabeçou o debate foram
aqueles que estavam envolvidos com o especifismo anarquista, influenciado pela Federação
Anarquista Uruguaia que, se não conheceu a Plataforma em sua constituição, chegou, por
meio das posições de Bakunin e Malatesta a concepções bastante similares.
Sem dúvida alguma, a reflexão sobre a Plataforma não deve ser tomada como um guia
inflexível para a estruturação de uma organização política. Mas rejeitá-la sob o falso
argumento de que esta configuraria um "desvio autoritário" no anarquismo ou que suas
contribuições estariam apenas circunstritas a um contexto específico é ignorar todos os
debates políticos organizativos anteriores e posteriores a este documento, que conectam a
discussão organizativa anarquista a um longo fio condutor. Juntamente com outras
contribuições - como nos casos específicos de Bakunin e Malatesta, mas também de muitas
outras elaborações distintas, tanto teóricas quanto práticas -, entendemos ser possível
avançar no debate acerca da organização política anarquista. Continuar a trabalhar no
sentido de aprofundar esse debate parece-nos uma necessidade premente.
Notas:
1. CORRÊA, Felipe; SILVA, Rafael V. "Introduction à l'Édition Francophone". In: FARJ.
Anarchisme Social et Organization. Lyon: Brasero Social, 2013.
2. Há duas traduções da Plataforma em português no Nestor Makhno Archive
[http://www.nestormakhno.info/portuguese/index.htm]. Uma delas foi publicada em: MAKHNO,
Nestor. Anarquia e Organização. São Paulo: Luta Libertária, 2001. Uma tradução definitiva
em português está sendo preparada e deve ser publicada em breve.
3. SCHMIDT, Michael; VAN DER WALT, Lucien. Black Flame: the revolutionary class politics
of anarchism and syndicalism. Oakland: AK Press, 2009.
4. LEVAL, Gaston. Bakunin, Fundador do Sindicalismo Revolucionário. São Paulo:
Imaginário/Faísca, 2007.
5. Cf., por exemplo: BERTHIER, René. "Bakounine: une théorie de l'organisation". In: Monde
Nouveau, 2012. Idem. "Postface". In: ANTONIOLI, Maurizio. Bakounine: entre syndicalisme
révolutionnaire et anarchisme. Paris: Noir et Rouge, 2014.
6. Nas últimas décadas, o constrangimento dos anarquistas franceses com parte da obra de
Bakunin é notável, especialmente no que diz respeito ao tema da organização política.
Praticamente nenhum dos numerosos programas da Aliança da Democracia Socialista foi
incluído nos livros publicados deste anarquista. Talvez isso possa ser explicado pela
hipótese de René Berthier, relatada numa palestra de 2014 no Brasil. Para ele, durante
muito tempo, os franceses aproximaram Bakunin do marxismo ou mesmo de um suposto "marxismo
libertário" defendido por Daniel Guérin. Poder-se-ia justificar, assim, ainda segundo ele,
o fato de uma revista como Itineraire, que dedicou seus números aos "grandes anarquistas"
da história, não ter um número sobre Bakunin. É o próprio Berthier que, em certa medida, e
junto com alguns outros pesquisadores e militantes, tem retomado mais recentemente a
discussão da obra bakuninana.
7. A maior realização histórica concreta de militantes que estiveram envolvidos com a ADS
foi a criação da AIT em países onde ela ainda não existia e o estabelecimento de novas
seções da Internacional onde ela já estava em funcionamento; tais foram os casos da
Espanha, da Itália, de Portugal e da Suíça, além de casos na América Latina, estimulados
por correspondências. Cf. CORRÊA, Felipe. Surgimento e Breve Perspectiva Histórica do
Anarquismo (1868-2012). São Paulo: Biblioteca Virtual Faísca, 2013.
8. BAKUNIN, Mikhail. "Carta a Morago de 21 de maio de 1872". In: CD-ROM Bakounine: Ouvres
Completes, IIHS de Amsterdã, 2000.
9. Idem. "Carta a Cerretti de 13-27 de março de 1872". In: CD-BOC.
10. Idem. "Status Secrets de l'Alliance: programme et objet de l'organization
révolutionnaire des frères internationaux". In: CD-BOC. Idem. "Carta a Cerretti de 13-27
de março de 1872". In: CD-BOC. Idem. "Carta a Morago de 21 de maio de 1872". In: CD-BOC.
11. Idem. "Status Secrets de l'Alliance: organization de l'Alliance des frères
internationaux". In: CD-BOC. Idem. "Status Secrets de l'Alliance: programme et objet de
l'organization révolutionnaire des frères internationaux". In: CD-BOC.
12. Idem. "Carta a Morago de 21 de maio de 1872". In: CD-BOC.
13. Deve-se ressaltar que, durante sua longa trajetória anarquista, que abarca mais de 60
anos, Malatesta defendeu diferentes posições acerca da organização política anarquista. Se
em alguns casos elas aproximam-se das concepções de Bakunin e, conforme argumentaremos, da
Plataforma, em outras elas possuem mais relação com a Síntese.
14. É preciso destacar que o termo "partido", utilizado por Malatesta neste período, deve
ser colocado em seu contexto histórico. Ele passa a ser gradativamente abandonado pelos
anarquistas, principalmente após a Revolução Russa de 1917, quando se vincula mais
diretamente ao bolchevismo e a outras iniciativas que pretendem conquistar o Estado, seja
por meio de revolução ou eleições.
15. MALATESTA, Errico. "A Organização II". In: Escritos Revolucionários. São Paulo:
Imaginário, 2000, pp. 55-56.
16. Idem. "Enfim" O que é a 'Ditadura do Proletariado". In: Anarquistas, Socialistas e
Comunistas. São Paulo: Cortez, 1989, p. 87.
17. Idem. "Ação e Disciplina". In: Anarquistas, Socialistas e Comunistas, p. 24.
18. Idem. "A Organização II". In: Escritos Revolucionários, p. 62.
19. Idem. "La Propaganda Anarquista". In: RICHARDS, Vernon (org.). Malatesta: pensamiento
y acción revolucionarios. Buenos Aires: Tupac, 2007, pp. 170-172.
20. Idem. "Programa Anarquista". In: Escritos Revolucionários, p. 14.
21. Idem. Ideología Anarquista. Montevidéu: Recortes, 2008, p. 193.
22. Ibidem.
23. Ibidem, p. 31.
24. Idem. "Programa Anarquista". In: Escritos Revolucionários, p. 26.
25. À despeito da forma leninista de partido estar dada pelo menos desde 1902, na obra O
Que Fazer? de Lênin, esse modelo só será internacionalmente divulgado após a Revolução
Russa de 1917.
26. LÊNIN, V. I. O Que Fazer? São Paulo: Hucitec, 1988.
27. Qualquer pesquisador sério se horrorizaria ao ouvir essa caracterização dos membros de
Dielo Truda. Na referida palestra realizada em 2014, por exemplo, o pesquisador René
Berthier (que, além de um pesquisador sério é membro de uma organização sintetista) foi
enfático quando escutou tal caracterização ser realizada por outro sintetista, afirmando:
"isso não existe".
28. DIELO TRUDA. "Plataforma Organizacional dos Comunistas Libertários". In: MAKHNO,
Nestor. Anarquia e Organização. São Paulo: Luta Libertária, 2001.
29. SCHMIDT, Michael; VAN DER WALT, Lucien. Black Flame. MINTZ, Frank. "Contexto de la
Plataforma". In: Anarkismo.net, 2007.
30. SCHMIDT Michael; VAN DER WALT, Lucien. Black Flame, p. 256.
31. Grande parte dos textos do debate estão no Nestor Makhno Archive
[http://www.nestormakhno.info]. Dentre os anarquistas que contribuíram com esse amplo
debate, encontram-se: Malatesta, Makhno e os próprios autores da Plataforma - Piotr
Arshinov, Ida Mett, Jean Walecki, Benjamin Goldberg (Ranko) -, além de G. P. Maximoff,
Volin, Senya Fleshin, Camilo Berneri, Luigi Fabbri, Sébastién Faure, Maria Isidin e outros.
32. Há dois textos históricos homônimos que, mesmo possuindo diferenças bem
significativas, fundamentaram teoricamente a "síntese anarquista". FAURE, Sébastien. "A
Síntese Anarquista". In: Anarkismo.net, 2009. VOLIN. "A Síntese Anarquista". In: RAYNAUD,
Jean-Marc. Apelo à Unidade do Movimento Libertário. São Paulo: Imaginário, 2003.
33. MALATESTA, Errico. "A Organização I". In: Escritos Revolucionários. Idem. "A
Organização II". In: Escritos Revolucionários.
34. Idem. Ideología Anarquista.
35. Idem. "Communism and Individualism". In: The Anarchist Revolution: polemical articles
1924-1931. Londres: Freedom Press, 1995.
36. Idem. "Individualism and Communism in Anarchism". In: The Anarchist Revolution.
37. ANTONIOLI, Maurizio (org.). The International Anarchist Congress: Amsterdam (1907).
Edmonton: Black Cat, 2009.
38. MALATESTA, Errico. "Individualism and Communism in Anarchism". In: The Anarchist
Revolution. pp. 14; 18.
39. Ibidem, pp. 19; 21.
40. Idem. "Intervention, 6th Session". In: ANTONIOLI, Maurizio (org.). The International
Anarchist Congress, p. 96.
41. SCHMIDT Michael; VAN DER WALT, Lucien. Black Flame, p. 250.
42. O conjunto dessa correspondência é o seguinte: MALATESTA, Errico. "Um Projeto de
Organização Anarquista" ou "Anarquia e Organização"; "Resposta de Malatesta a Nestor
Makhno", que podem ser encontrados no Nestor Maknho Archive
[http://www.nestormakhno.info/portuguese/mala_reply_pt.htm] e em MALATESTA, Errico.
Autoritarismo e Anarquismo. São Paulo: Imaginário, 2004. MAKHNO, Nestor. "Resposta a 'Um
Projeto de Organização Anarquista'"
[http://www.nestormakhno.info/portuguese/mala_reply_pt.h...akhno]; "Uma Segunda Carta a
Malatesta" [http://www.anarkismo.net/article/25241]. O artigo "A Propósito da
Responsabilidade Coletiva"
[http://www.nestormakhno.info/portuguese/mala_reply_pt.h...esta3] também pode ser útil.
43. Alexandre Skirda, tradutor russo, foi responsável pela publicação da nova tradução da
Plataforma ao francês, além de parte do debate que a envolve; sobre a questão da tradução
original da Plataforma, ele afirma: "Lembremos que a primeira tradução efetuada por Volin
fora contestada por ser 'ruim e pesada', o tradutor não tendo 'tomado cuidado de adaptar a
terminologia, as frases ao espírito do movimento francês'. [Le Libertaire 106, 15/04/1927]
Procuramos saber a que podiam aplicar-se essas censuras e encontramos, com efeito, vários
termos conscientemente deformados: napravlenie, que significa tanto 'direção' como
'orientação', foi sistematicamente empregado no primeiro sentido; idem para o termo
rukovodsvto, significando 'conduta', e o verbo que nele originou-se, 'guiar, conduzir,
dirigir, administrar', foi também sistematicamente traduzido por 'dirigir'. O caso é ainda
mais flagrante na última frase da Plataforma, zastrelchtchik, significando 'instigador';
foi traduzido por 'vanguarda'. Foi assim que, por leves pinceladas, o sentido profundo do
texto pôde ser alterado." SKIRDA, Alexandre. Autonomie Individuelle et Force Collective:
les anarchistes et l'organization de Proudhon à nos jours. Paris: A.S., 1987, pp. 245-246.
44. Podemos mencionar o caso da Confederação Nabat, que reuniu diversas organizações
anarquistas. Apesar das divergências de análise entre os historiadores e os próprios
anarquistas sobre a concepção organizativa e de anarquismo da Nabat, que não nos permitem
ainda saber ao certo se ela aproximava-se mais da concepção da Síntese ou da Plataforma,
podemos afirmar que ela, conjuntamente com a experiência da Revolução Russa e Ucraniana,
contribuiu para as linhas gerais da Plataforma. Cf. ARSHINOV, Piotr. Historia del
Movimiento Makhnovista. Buenos Aires: Tupac, 2008.
45. MALATESTA, Errico. "Um Projeto de Organização Anarquista".
46. A discussão entre Malatesta e Makhno também foi bastante complicada por problemas
terminológicos; as questões de tradução anteriormente apontadas contribuíram com isso.
47. MALATESTA, Errico. "Resposta de Malatesta a Nestor Makhno".
48. MAKHNO, Nestor. "Uma Segunda Carta a Malatesta".
49. DIELO TRUDA. "Plataforma Organizacional dos Comunistas Libertários".
50. Idem. "Suplemento a la Plataforma Organizativa (Preguntas y Respuestas), Nestor Makhno
Archive.
51. MAKHNO, Nestor. "Resposta a 'Um Projeto de Organização Anarquista'".
52. DIELO TRUDA. "Plataforma Organizacional dos Comunistas Libertários".
53. Ibidem.
54. Ibidem.
55. MALATESTA, Errico. "Um Projeto de Organização Anarquista".
56. Ibidem.
57. MAKHNO, Nestor. "Resposta a 'Um Projeto de Organização Anarquista'".
58. Ibidem.
59. Ibidem.
60. ARSHINOV, Piotr. "O Velho e o Novo no Anarquismo". Nestor Makhno Archive.
61. Ibidem.
62. MALATESTA, Errico. "Resposta de Malatesta a Nestor Makhno".
63. Ibidem.
64. MAKHNO, Nestor. "Uma Segunda Carta a Malatesta".
65. MALATESTA, Errico. "A Propósito da Responsabilidade Coletiva".
66. Ibidem.
67. MALATESTA, Errico. "Resposta de Malatesta a Nestor Makhno".
68. DIELO TRUDA. "Plataforma Organizacional dos Comunistas Libertários".
69. MAKHNO, Nestor. "Uma Segunda Carta a Malatesta".
70. Ibidem.
71. ARSHINOV, Piotr. "O Velho e o Novo no Anarquismo".
72. MALATESTA, Errico. "Resposta de Malatesta a Nestor Makhno".
73. ARSHINOV, Piotr. "O Velho e o Novo no Anarquismo".
74. ARSHINOV, Piotr. Historia del Movimiento Makhnovista. Buenos Aires: Tupac, 2008.
75. "Polemicas en Torno del Libro de Archinov: Historia del Movimiento Makhnovista". In:
ARSHINOV, Piotr. Historia del Movimiento Makhnovista. Buenos Aires: Tupac, 2008, p. 232.
76. ARSHINOV, Piotr. "A Makhnovitchina e o Anarquismo". In: Anarkismo.net, 2015.
77. "Polemicas en Torno del Libro de Archinov", pp. 233-234.
78. Cf. este e outros escritos do autor em MINTZ, Frank (org.). Anatol Gorelik: el
anarquismo en la Revolución Rusa. Buenos Aires: Anarres, 2007.
79. Estamos trabalhando numa compilação completa das intervenções neste debate, que deverá
ser publicada, em algum tempo, no site do Instituto de Teoria e História Anarquista. (ITHA).
80. VOLIN et alli. "Reply to the Platform (Synthesist)". Nestor Makhno Archive.
81. HEAT, Nick. "Introdução Histórica". In: DIELO TRUDA. "Plataforma Organizacional dos
Comunistas Libertários", Nestor Makhno Archive.
82. BERRY, David. A History of the French Anarchist Movement (1917-1945). Oakland: AK
Press, 2009, pp. 174-176.
83. SCHMIDT Michael; VAN DER WALT, Lucien. Black Flame, p. 258.
84. SCHMIDT, Michael. Anarquismo Búlgaro em Armas: A Linha de Massas Anarco-Comunista.
Parte I. São Paulo, Faísca, 2009, p. 40. A Plataforma dos búlgaros consta como anexo deste
livro.
85. HEAT, Nick. "Introdução Histórica". DANTON, José A. G. "Para Pensar el Anarquismo
desde Nuestra Realidad: sobre el Manifiesto Comunista Libertario". In: El Manifiesto
Comunista Libertario y Otros Textos. Santiago: Pensamiento y Batalla, 2014, p. 19.
86. JOYEUX, Maurice. "L'Affaire Fontenis". In: La Rue, num. 28. Paris: Groupe Louise
Michel, 1980.
87. SKIRDA, Alexandre. Autonomie Individuelle et Force Collective, pp. 203-213.
88. FONTENIS, George. Manifeste du Communisme Libertaire. NEFAC, 2006.
89. DANTON, José A. G. "Para Pensar el Anarquismo desde Nuestra Realidad: sobre el
Manifiesto Comunista Libertario", pp. 19-20.
90. JOYEUX, Maurice. "L'Affaire Fontenis".
91. SKIRDA, Alexandre. Autonomie Individuelle et Force Collective, p. 343.
92. "Organisation Pensée Bataille." In: Noir et Rouge. Cahiers d'etudes Anarchistes
Revolutionnaires: anthologie, 1956-1970. Paris, s/d. GUÉRIN, Cédric. Pensée et Action des
Anarchistes en France: 1956-1970. Lille: Lille 3, 2000. JOYEUX, Maurice. "L'Affaire
Fontenis", p. 81.
93. DANTON, José A. G. "Para Pensar el Anarquismo desde Nuestra Realidad: sobre el
Manifiesto Comunista Libertario", p. 20. FdCA. Anarchist Communists: a question of class.
FdCA, 2005, p. 107.
94. O plataformismo búlgaro constitui um exemplo bastante distinto dos casos francês e
italiano dos anos 1950 e era conhecido na França por meio das publicações de Gr.
Balkansky. Cf., por exemplo, este livro, publicado inclusive por um grupo da FAF:
BALKANSKY, Gr. Histoire du Movement Libertaire en Bulgarie. Antony: Groupe Fresnes-Antony
(Fédération Anarchiste), 1982.
95. Recordemos que, como apontamos anteriormente, os franceses já atribuíam um certo
caráter autoritário à parte importante da obra de Bakunin.
96. RODRIGUES, Edgar; RAMOS, Renato; SAMIS, Alexandre. Against All Tyranny! Essays of
Anarchism in Brazil. Londres: Kate Sharpley Library, 2003, p. 19.
97. Para uma análise das experiências dos anos 1940 a 1960 em São Paulo e no Rio de
Janeiro, cf. SILVA, Rafael Viana da. Elementos Inflamáveis: Organizações e Militância
Anarquista no Rio de Janeiro e São Paulo (1945-1964). Dissertação (Mestrado em História).
Seropédica: UFRRJ, 2014.
98. DIELO TRUDA. "Plataforma Organizacional dos Comunistas Libertários". In: MAKHNO,
Nestor. Anarquia e Organização. São Paulo: Luta Libertária, 2001.
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[http://www.nestormakhno.info/english/volrep.htm]
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