(pt) Anarkismo.net: Joaquim Levy e o mito do governo em disputa by BrunoL (en, it)
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Sexta-Feira, 23 de Janeiro de 2015 - 17:36:01 CET
Parece que finalmente caiu a máscara e o poder central no 3º turno negociado expôs a sua
verdadeira face - ou ao menos a face hegemônica. Na reportagem de CartaCapital de 18 de
janeiro de 2015 (de Carlos Drummond) o ajuste fiscal aplicado pelo ministro da Fazenda
Joaquim Levy foi caracterizado como "punhalada fiscal". O bom repórter da publicação que
apoia o governo de centro-direita marcado pelo lulismo, ao ouvir fontes como dirigentes de
centrais sindicais mais que acostumados a "dialogar" com o governo, as medidas implicam em
tentativa de redução de déficit estrutural de 1,2% do PIB. A intenção de Levy e sua equipe
(ou a equipe econômica indicada por Dilma, pós-graduada em economia pela Unicamp) como se
sabe, intenta "sinalizar ao mercado" e outras balelas indicando que o Estado precisa
diminuir seu papel e reforçar seu caráter de classe.
Embora a sociedade brasileira seja bastante complexa para um país ocidental e o aparelho
de Estado do governo central esteja recheada de interesses diretos e insulamentos
tecnocráticos, no fundo o que está em jogo é a definição do caráter de classe do Estado e
a diminuição do poder do voto individual na democracia indireta apresentada como melhor saída
O protesto de metalúrgicos do ABC (em 12 de janeiro) contra as demissões na Volkswagen
(cerca de 800) juntou trabalhadores também da Mercedes e da Ford, totalizando mais de
20.000 trabalhadores.
O protesto de metalúrgicos do ABC (em 12 de janeiro) contra as demissões na Volkswagen
(cerca de 800) juntou trabalhadores também da Mercedes e da Ford, totalizando mais de
20.000 trabalhadores.
As Medidas Provisórias 664 e 665 (detalhadamente citadas na reportagem que está postada no
portal da revista) representam a nova fase do governo de Dilma em seu segundo mandato.
Para quem gosta de Teoria dos Jogos e das partidas em rodadas simultâneas em distintos
níveis, trata-se de um caso a modelar. Temos algumas disputas simultâneas:
- a intra-oligárquica (na briga das legendas oligárquicas para engolir para cargos e poder
de orçamento para o primeiro e segundo escalão);
- na disputa dentro do PT entre a possibilidade de uma acumulação entre Dilma e a DS e seu
círculo de confiança X o lulismo e a base de apoio no Campo Majoritário (sim, eu ainda os
chamo assim);
- a disputa entre o poder de governar de fato, entre o núcleo da Presidência (que mal ou
bem foi eleita) e a equipe econômica, cujos membros poderiam perfeitamente serem aprovados
em um governo tucano;
- por fim, o 3o turno que insiste em não terminar, estando o país mais tenso embora mais
desorganizado. O 3o turno e o fantasma da Venezuela aqui mobilizam parte da esquerda
restante para as hostes governistas, ou ao menos, para algum apoio critico desta. Quando a
esquerda eleitoral restante opta pelo combate político, gente como Emir Sader afirma que
eles e elas (os que são de esquerda e ainda insistem no eleitoralismo) fracassaram.
Reconheço o fato do malabarismo dos intelectuais engajados nos projetos policlassistas
costuma ser bastante criativo. Voltaremos ao tema mais à frente.
De volta ao pacotaço de Joaquim Levy (executivo de confiança do Bradesco e apoiador de
Armínio Fraga e Aécio Neves na última campanha presidencial), o volume de perdas para os
trabalhadores é astronômico, mas não faz nenhuma diferença para o montante dos gastos com
a maldita rolagem da dívida interna como já afirmamos aqui anteriormente. O problema de
fundo continua: com um movimento sindical corporativo, pelego e vinculado aos humores do
governo de turno e, em paralelo, com a desorganização sindical da esquerda restante
(eleitoral ou não), logo fica a dúvida: como a força de trabalho no Brasil vai conseguir
reagir?
Quando o Patrimonialismo e a Escola de Chicago que a direita que ganhou as eleições
colocou no poder
Ainda na mescla de análise de conjuntura e comentários dos textos postados em publicações
de centro-esquerda, observo no artigo que cito abaixo, modestamente e sem lê-lo antes,
este analista chegou à mesma conclusão de Luiz Gonzaga Belluzzo (Carta Capital, 11 de
janeiro de 2015). É uma falácia colocar a suposta racionalidade da economia competitiva
diante do Leviatã do Estado brasileiro como se este fosse a besta fera a impor jeitinhos e
privilégios contrapondo a competência e a capacidade de execução do agente econômico. Tudo
falso. Em debate na TVE-RS no final de novembro de 2014, este que escreve e dois
economistas (um da PUC-RS/BRDE e outro da UFRGS) chegamos à mesma conclusão. Ao decretar o
anúncio de aumento de carga tributária, o governo central vai bater a carteira do
trabalhador de forma indireta e deixar intacta a besta comedora de riquezas e compromissos
através da transferência pela lógica rentista da maldita rolagem da dívida interna. Os
dados de Belluzzo são inequívocos:
"Entre 1995 e 2011, o Estado brasileiro transferiu para os detentores da dívida pública,
sob a forma de pagamento de juros reais, um total acumulado de 109,8% do PIB. Se
avançarmos até 2014, essa transferência de renda e riqueza chega a 125% do PIB. Isso
significa atirar ao colo dos detentores de riqueza financeira, ao longo de 19 anos, um PIB
anual, mais um quarto. É pelo menos curioso que os idealizadores do "impostômetro" não
tenham pensado na criação do "jurômetro".
Não para por aí a mola mestra da acumulação do país dos banqueiros - onde até o ministro
da Fazenda é banqueiro de formação - pois a carga indireta morde fração maior das
economias dos que tem muito pouco ou quase nada. Eis os dados:
"Em 2011, a carga tributária bruta chegou a 35,31% do PIB. No Brasil os impostos
indiretos, como o IPI e o ICMS, representam 49,22% do total da carga tributária. Como se
sabe, esses impostos incidem sobre os gastos da população na aquisição de bens e serviços,
independentemente do nível de renda. Pobres e ricos pagam a mesma alíquota para comprar o
fogão e a geladeira, mas o Leão "democraticamente" devora uma fração maior das rendas
menores. Os chamados encargos sociais representavam 25,76% da carga total e o ônus estava,
então, distribuído entre empregados e empregadores."
Diante dessa monstruosidade, estamos diante de uma hipocrisia estrutural e desinformação
estruturante (através de Merval Pereira, Miriam Leitão e cia.) para justificar o
injustificável: a máquina de arrecadação do Planalto escoa os compromissos do país de quem
pouco pode pagar para os que tudo devem lucrar. A julgar pela procedência do ministro da
Fazenda e as forças hoje pouco ocultas que servem como fonte do boletim Focus, logo só
quem nunca é consultado é o povo brasileiro ao definir os destinos da riqueza nacional,
mesmo sob modo de produção capitalista semi-periférico e com regime de democracia indireta.
Depois tem gente como Emir Sader (o próximo tópico a seguir) que tem a coragem de afirmar
que o governo está em "disputa". Sim está sendo disputado entre o lobby do JBS e a base do
latifúndio representada pela ministra da Agricultura, Kátia Abreu.
O malabarismo de Emir Sader troca de alvo
Agora cabe a crítica por esquerda. O malabarismo de Emir Sader, ao afirmar "Porque a
extrema-esquerda fracassou e acabou isolada" (Carta Maior, 11 de janeiro de 2015) coloca o
PSOl na "extrema"-esquerda apenas porque a legenda não abandonou partes básicas do
reformismo radical do PT da década de sua fundação. Depois, o blogueiro e cientista
político que ainda acredita no "governo em disputa", condiciona o isolamento ao resultado
eleitoral, quando qualquer pessoa que faça política sabe que o resultado da urna reflete
indiretamente a capacidade de transformar a política em decisão coletiva.
Por fim, coloca na vala comum a "extrema"-esquerda apenas se referenciando a agrupações
trotsquistas, ignorando solenemente todo um universo que tende para a massificação em
momento de pico reivindicativo e tem perfil libertário e muitas vezes, agrupações
específicas animando e organizando. Uma pena, o triste fim da crítica de um sociólogo
transformado em equilibrista das palavras, cada vez mais atrapalhado. Pela tese absurda de
Emir Sader, no Brasil, Argentina, Uruguai, Venezuela, Bolívia e Equador, a
extrema-esquerda se isola da sociedade ao não perceber a contradição fundamental entre a
intencionalidade do poder central em orientar o Estado para o desenvolvimento e a produção
e combater o neoliberalismo, terminando assim (a esquerda restante) a isolar-se da massa
por não se postar ao seu lado. Vale citar o absurdo:
"Esse fracasso da extrema esquerda hoje na é generalizado nos países de governos
progressistas - Venezuela, Argentina, Uruguai, Bolívia, Equador -, com desempenhos mais ou
menos similares, mas a mesma incapacidade de compreender a natureza do período histórico
neoliberal e o papel progressista que tem esses governos. A extrema esquerda terminou
tomando como seus inimigos fundamentais a esses governos, aliando-se, tácita ou
explicitamente à direita contra eles, abandonando a possibilidade de compor um quadro da
esquerda, onde seriam a alternativa mais radical. Ficam isoladas, em posturas denuncistas,
sem propostas alternativas. Enquanto que os governos progressistas, a esquerda na era
neoliberal, se constituem, em escala mundial, na referencia central na luta antineoliberal."
Embora o texto se centre em bater no PSOL (sabe-se lá por quais motivos, pois semanas
antes do final do ano elogiava a esta legenda na mesma publicação), aponta a carapuça do
alinhamento cego que termina por "tácita ou oportunista" a apoiar a direita. Isto, se
levado às últimas consequências, implicaria no abandono das lutas sociais e a aceitação
integral do pensamento gramsciano de quinta categoria, quando tudo se resume a jogo de
posições e espaços no interior de instituições estatais ou para-estatais. Ou seja, tudo o
que levou ao reformismo radical a tornar-se uma ridícula e grotesca caricatura de si
mesmo, transformando a ex-guerrilheiros em presos comuns e corruptos tolerantes com os
oligarcas.
Apontando uma conclusão
Agora, diante do pacotaço de Levy e cia., a extrema-esquerda deveria sim estar mais
organizada e com capacidade de reação, distante da "estratégia" eleitoralista (não seria
uma tática cega e viciosa como sempre....) e aproximando-se das demandas mais urgentes do
povo brasileiro. 2013 provou que não há isolamento quando a pauta é justa e consegue se
massificar ultrapassando o bloqueio midiático e a sabotagem governista. Que nos sirva de
lição.
http://www.anarkismo.net/article/27814
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