(pt) Nota da Organização Anarquista Terra e Liberdade (OATL) - Hideki e Rafael são soltos! Liberdade e justiça.
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Sábado, 9 de Agosto de 2014 - 09:39:41 CEST
LIBERDADE CONQUISTADA! ---- Após mais de 40 dias, finalmente, Fábio Hideki e Rafael
Lusvarghi saíram da prisão. Vê-los soltos é uma alegria para todas e todos nós,
independentemente se o conhecemos ou não. Isso, pois ela é uma vitória de todo mundo que
não teve medo de denunciar a violência do Estado, que desta vez os atingiram e que
aprisiona milhares de pessoas todos os dias. Violência que mata a cada segundo, violência
que tem farda, que estupra, que extermina, que usa da lei, da câmera, do jornal. ---- Vida
longa para vocês, Hideki e Rafael, vida longa aos que lutam, aos que sofrem, aos que
resistem. ---- A batalha está apenas começando. Ela não acaba hoje e nem dentro das
grades. ---- Ela irá até o fim. Até o fim da burguesia, do opressor, do presídio, do Estado.
Liberdade para todxs xs presxs políticos!
Libertem Rafael Braga, Caio, Fábio e Antonio Roza!
"Você é anarquista?" - Por que estamos sendo presxs e perseguidxs.
Por que estamos sendo presxs e perseguidxs?
Nota dxs professores e militantes de base do SEPE processados por "quadrilha armada".
"Você é anarquista?"
(Uma das primeiras perguntas feita na Cidade da Polícia aos presos do dia 12 de Junho de 2014)
Na luta, somos movidos por ideias, sonhos de uma sociedade diferente, com novas relações
entre as pessoas e a vida, capazes de reconstruir o mundo.
Os sindicatos, há muitos anos atrás, no século XIX, nasceram para organizar xs
trabalhadorxs, servir de meio de defesa dos seus interesses e necessidades contra a
exploração promovida pelos patrões. Tantas crianças morriam nas fábricas, em jornadas de
trabalho de 14 a 16 horas. Morria-se de fome. Morria-se de trabalhar ou de desemprego.
Esta dura realidade fez com que estas pessoas passassem a agir juntas, a enfrentar juntas
as dores que as atravessavam, e foi nesta época, e com este intuito, que fundaram os
primeiros sindicatos e organizações operárias.
A base que unia os sindicatos era a condição de classe, o trabalho, e as necessidades
materiais. Este fato, entretanto, não impedia que nos sindicatos existissem diversas
linhas de pensamento, "ideologias", que orientavam a ação das pessoas. O mesmo acontece
hoje, havendo diversos sindicatos e diversas linhas de pensamento entre trabalhadores da
mesma profissão, organizados em diversos grupos com diferentes matizes teóricas.
Um dos sindicatos mais atuantes no Brasil, apesar de se encontrar ainda burocratizado e
aparelhado por grupos políticos eleitorais - uma característica do sindicalismo de estado,
nascido com o regime ditatorial de Vargas e seu controle sobre estes - é o SEPE (Sindicato
Estadual dos Profissionais da Educação). Pela existência, ainda, de fóruns democráticos
dentro deste sindicato que garantem a participação dxs trabalhadorxs nas suas deliberações
- como assembleias gerais, regionais e congressos -, duas fortíssimas greves foram puxadas
pela base desta categoria em 2013 e 2014, sendo responsáveis por manter a chama da revolta
iniciada com o levante popular de Junho e por trazer centenas de novxs educadorxs pra luta.
Estas duas greves rebelaram-se contra o silêncio imposto sobre as condições de trabalho e
ensino nas escolas municipais e estaduais do Rio de Janeiro. Motivos não faltavam para que
xs trabalhadorxs da educação fossem para as ruas exigindo outra forma de educação. Somos a
categoria que lidera os índices de suicídio e depressão por condição de trabalho. Vivemos
o adoecimento pelas péssimas condições do ensino público, pelas salas superlotadas,
quentes, pela pressão das direções, pelos baixos salários, pela violência presente no
espaço escolar. Todos os dias dezenas de educadorxs pedem licença médica ou abandonam suas
matrículas por não suportarem mais trabalhar desta forma. Nossxs alunxs são mortos
diariamente pela polícia nas suas comunidades e ainda são obrigados a conviver com a
presença desta mesma polícia dentro das escolas estaduais.
Portanto, a nossa luta é justa e necessária, sendo a greve um dos nossos instrumentos de luta.
Presentes na lista que persegue 23 manifestantes do Rio pelo artigo 288, "quadrilha
armada", nós 3 - Rebeca, Filipe e Pedro - somos professores da rede estadual e estamos
sendo perseguidos por nossa luta nestas greves, pela nossa militância no sindicato e por
nossa ideologia. Nos encontramos hoje, após o habeas corpus concedido pelo desembargador
Siro Darlan, em "liberdade provisória", não podendo sair da cidade do Rio sem autorização
judicial, tendo que nos apresentar frequentemente à justiça, continuando com nossos
telefones grampeados e sofrendo ainda vigilância nas ruas como se fôssemos criminosos. O
processo é claro ao nos colocar neste inquérito fantasioso, baseado em argumentos vazios e
fatos inventados: querem atingir não apenas organizações políticas e militantes
independentes, mas também os sindicatos e movimentos sociais, e para este fim nós fomos
escolhidos como o "bode espiatório", simplesmente por militarmos no sindicato e também em
uma das organizações atualmente perseguidas.
Antes de citar passagens deste inquérito que fundamentam nossa argumentação, gostaríamos
de frisar que não restringimos nossa luta a greves ou assembleias do sindicato. Nossa
atuação se inicia no chão das escolas, com nossas alunas e alunos, colegas e comunidades.
Começamos nossa atuação sindical ali, onde a burocracia não está. Construímos os comitês
escola-comunidade, debatendo com alunxs, professorxs, funcionárixs e comunidade a própria
escola, sua existência, seu sentido, suas necessidades. Nós três, nas escolas onde
trabalhamos, ajudamos a puxar assembleias comunitárias e tentamos construir uma democracia
direta nos espaço escolares, pensando a escola como um espaço comum. As greves e
manifestações são apenas parte de uma concepção tratada pelo Estado como crime. O que
buscamos, enquanto educação, é o que muitxs companheirxs também buscam. Queremos uma
educação que valorize nossxs alunxs e seus trabalhadorxs, que ensine para a liberdade, que
questione o formato atual de escola, que garanta a participação de toda a comunidade
escolar em suas decisões, que trabalhe a partir de novos parâmetros pedagógicos e novos
currículos, que critique toda forma de opressão, controle e hierarquia, e que participe da
construção de uma sociedade nova. A diferença, em relação a algumxs companheirxs, é que
não acreditamos mais, para alcançar estes objetivos, no sistema representativo, não
queremos ser candidatos ao parlamento ou apoiar outrxs que sejam do nosso partido, não
acreditamos em acordões, como os que encerraram as últimas duas greves, e também não
queremos um sindicato que reproduza a imagem do Estado, totalmente hierarquizado, repleto
de "representantes" que decidem por nós e que ainda acredita no legislativo, em reuniões
de gabinetes e solicitações a deputados e vereadores, para alcançar vitórias. Acreditamos
na democracia direta, numa forma de organização de baixo pra cima, com assembleias,
comissões e porta-vozes (delegados), e na ação direta, forma de luta imediata que recorre
apenas à nossa força e nossos passos (atos, ocupações, acampamentos, panfletagens, pressão
no executivo, etc), como caminho e forma de luta, como fizemos por tantas vezes nas
últimas greves e como ficou marcado em Junho. Por estes aspectos nos consideramos
anarquistas, militamos numa organização anarquista e somos hoje perseguidos nos mesmos
moldes e com os mesmos estereótipos que atingiram operárixs anarquistas há um século
atrás. Não somos anarquistas porque andamos com "bombas nas mochilas", somos "contra
coletivos" e queremos a "destruição de tudo", como aparece na imprensa e no próprio
inquérito. Somos contra este estereótipo criado para criminalizar lutadorxs! Somos
anarquistas porque queremos uma sociedade igualitária, acreditamos na liberdade e não
acreditamos que estas possam ser criadas por meio de reformas no capitalismo e por um
Estado que nasceu para prender e proteger a fonte da desigualdade. Lutamos por formas de
organização da sociedade, formas possíveis, como as que existem hoje entre os Zapatistas,
no México, como a Comuna de Oaxaca (2009), a Comuna de Paris, como a Catalunha
autogestionária da Guerra Civil Espanhola (1936-1939), como a Rússia de 1917-19 antes da
burocracia estatal e do partido único, entre outras experiências nascidas no século XX,
derrotadas, mas que nos indicam caminhos e nos fazem aprender com a história e seus erros.
Não concordamos, portanto, com as fundamentações do inquérito policial 218-01-646-2013
(Polícia Civil) que classifica o anarquismo como uma filosofia criminosa, associada ao
terror e a violência, e a Organização Anarquista Terra e Liberdade (OATL), da qual fazemos
parte, como a representante desta doutrina no Rio de Janeiro e no SEPE, sindicato no qual
atuamos. Segundo o inquérito, somos os responsáveis pelo que chamam de violência nos atos
do sindicato, o que resulta num completo absurdo já que a violência sempre foi promovida
pela polícia e de forma generalizada. O inquérito diz: "Parte da liderança da OATL faz
parte do SEPE (Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação do Rio de Janeiro). São os
que fomentam e incentivam o quebra-quebra nas manifestações do SEPE junto ao governo do
estado. Nas últimas manifestações do SEPE os integrantes da OATL que dele fazem parte
foram detidos". Em outra passagem, destaca: "Os fundadores da OATL são professores do
estado e do município do Rio de Janeiro. A OATL é o braço anarquista da FIP e carrega em
si todas as referências desta filosofia e arraigado o uso da violência em suas
manifestações, o deixar fazer, o não proibir e a ausência de lideranças, embora ela seja
exercida internamente. O incentivo ao cometimento de crimes seria um dos motes, um dos
modos de atuar".
Tirando o fato de que atuamos no SEPE, todas as considerações deste processo são absurdas.
Em nenhum momento "fomentamos" a violência, pelo contrário (se fomentamos algo, é a
liberdade e a resistência). Nós, como toda a categoria, somos vítimas da ação de um Estado
que age com violência ao nos agredir nas passeatas, ao nos prender, ao nos ameaçar de
demissão, ao nos processar, ao descontar nosso salário. Desde o ano passado sofremos com
violências deste tipo. Um professor e militante da OATL ficou internado por mais de 2
semanas no hospital Souza Aguiar por ter sido atingido pela polícia na manifestação do dia
15 de Outubro, onde mais de 200 pessoas foram presas arbitrariamente. Uma companheira teve
a casa dos pais invadida pela polícia federal. Um dos companheiros detidos nas últimas
manifestações, como se refere o inquérito, foi agredido por 15 policiais que ainda o
arrastaram pelas ruas da lapa e o carregaram por mais de 2 horas no camburão de uma
viatura. Todoxs xs nossxs militantes que atuam no SEPE foram descontadxs em seus salários
e sofreram processos de abandono. O companheiro Filipe Proença, preso e perseguido por
este inquérito, está sofrendo agora com outro processo de abandono. Como ele trabalha em
Magé e está impedido judicialmente de sair da comarca do Rio, como estabelece o habeas
corpus, ele não pode assumir suas turmas e a SEEDUC se aproveita desse fato absurdo para
processá-lo e ameaçá-lo de demissão, ao invés de transferi-lo para escolas do Rio onde
faltam professores ou aguardar a autorização do Juiz para que ele possa passar a semana em
Magé, onde trabalha e reside a maior parte da semana.
Na segunda passagem do inquérito que destacamos, este associa a filosofia anarquista e a
OATL ao "uso da violência" e ao "incentivo ao cometimento de crimes", o que é uma mera
reprodução (enganosa) das imagens que criminalizam o anarquismo desde que ele surgiu. No
dia 1 de Dezembro de 1892, por exemplo, verifica-se um ofício de um chefe de polícia do
Rio de Janeiro ao Ministro da Justiça onde ele relata que foram detidos operários
estrangeiros que "se vangloriavam de ser anarquistas; que tinham declarado guerra de morte
ao capital; que proclamaram a emancipação do trabalho; que haviam de obter pelo incêndio,
pelo punhal e pela dinamite". O ofício encerrava-se solicitando "a ordem para deportação
desses estrangeiros". Neste mesmo ano, o delegado da 8. Circunstrição Urbana Dr. Vaz Pinto
anunciava a prisão de alguns revolucionários, entre eles Antônio Thabio, considerado o
chefe dos anarquistas: "Encontraram, os policiais, na diligência feita à casa de Thabio,
rua Visconde de Uruguai n.9, em Niterói, um caderno com escritos, entre eles o seguinte:
'para se conseguir o bem-estar físico e moral é preciso a dinamite e o punhal".
Percebe-se, pela narrativa, que o flagrante forjado é um instrumento velho para prender
militantes e criminalizar uma ideologia. Na prisão de um operário anarquista, nos anos 20,
afirmava-se com semelhança aos dias atuais, tanto na discrição como na invenção das
provas: "Todas as malas dos dois homens foram revistadas, e, numa delas foi encontrada
muito bem acondicionada, uma bomba das mais poderosas que até aqui se tem empregado. Essa
bomba foi apreendida e com ela grande quantidade de livros e panfletos de propaganda
anarquista. Também foi apreendida uma bandeira vermelha e preta com a inscrição 'Sindicato
dos Panificadores'". Em 1921, chegou-se a criar um decreto, n. 4269, com o subtítulo
"Regula a Repressão do Anarquismo". Em 1924, dezenas de operários são presos e
classificados como "agitadores anarquistas", sendo levados para o campo de concentração de
prisioneiros políticos conhecido como Clevelândia (Amapá).
Recorrendo a nossa própria história, vemos como estas classificações são baseadas em
estereótipos que sempre serviram de fundo para criar um inimigo público e a partir da
prisão deste espalhar o medo. Sabemos que foram os anarquistas que fundaram os primeiros
sindicatos livres no Brasil, que puxaram as primeiras greves, que criaram as primeiras
escolas para operárixs, os primeiros teatros proletárixs, feiras de apoio-mútuo, creches,
associações de bairro, associações camponesas, entre outras formas de organização e
solidariedade de classe. Mesmo assim, a imagem construída sobre eles foi esta, que
destacamos acima, assim como hoje recebemos as mesmas classificações, estereótipos que
desconsideram que a OATL ajuda a construir projetos de educação popular no Morro da
Providência, na Mangueira, na Ocupação sem-teto Chiquinha Gonzaga, no coletivo sem-teto
Quilombo das Guerreiras, nas comunidades de Maricá, em escolas públicas e universidades,
entre outros lugares. Temos a força da nossa militância no movimento social, acreditamos
na organização e ação do povo, mas como outrxs anarquistas, há um século atrás, somos
caracterizados como criminosos que andam com punhais e armas apontados para qualquer um,
como se achássemos que a ação de um ou poucos indivíduos, ainda que justas em sua revolta,
pudessem construir o mundo que buscamos.
Para aumentar o teor criminoso do nosso grupo, nos processam também por "aliciação de
menores". Segundo o inquérito: "Função também constituinte da OATL é a de cooptação ou
arregimentação de novos integrantes e ou simpatizantes". Segundo este, de forma
completamente absurda, "o uso de menores de idade pela OATL é comum, não havendo a
proteção referente a condição de menoridade deste ou daquele cooptado. O que vale é o
crescimento numérico, o braço que luta. Se está disposto a abraçar a causa, serve.
Segundo as palavras do próprio depoente: 'Não importa se tem nove ou dezenove. É apenas
mais um soldado". Por esta lógica, fica marcada a impossibilidade e a dimensão criminosa
de qualquer militância junto ao movimento estudantil e de qualquer trabalho com educação
que envolva crianças e adolescentes. Em outra passagem, seguindo uma lógica parecida, a
polícia aproveita para criminalizar outro movimento social, o GEP (Grupo de Educação
Popular), que não é e nunca foi um "braço da OATL", tendo nascido, inclusive, anos antes
desta organização: "A doutrina anarquista da OATL também é difundida através do pano de
fundo de GRUPOS DE EDUCAÇÃO POPULAR, também chamados GEP. Ao mesmo tempo que leva o
louvável trabalho de pré-vestibular gratuito às favelas que atente usa o canal como meio
de incutir a doutrina anarquista e trazer mais e mais membros para o seio da OATL".
Achamos interessante que o inquérito considere como "louvável" o "trabalho de
pré-vestibular gratuito às favelas", pois nossa militância nasceu desta atuação e muito
antes do levante popular de junho e da justa revolta do povo nas ruas. Acontece que somos
anarquistas e como anarquistas não acreditamos em "panos de fundo", não achamos que o
movimento social deva ser dirigido e comandado por organizações políticas, não acreditamos
em cooptações, nem em doutrinas ou autoridades. Como dissemos, o GEP nasceu antes de nós e
é apenas um dos espaços onde atuamos junto a outrxs militantxs independentes que compõem o
grupo. Nossa atuação no SEPE, inclusive, como militantxs da OATL, se dá no GEP Educação
Pública, que é a área de atuação do GEP nas escolas públicas com alunxs e educadorxs. Mas,
claro, o Estado não pensa dessa forma e usa dos estigmas negativos que recaem sobre o
anarquismo para evidenciarem a OATL e nos criminalizarem. Mas as mentiras estão sendo
expostas, toda a ficção que monta este processo está sendo exposta, e podemos perceber que
não é apenas o anarquismo ou determinados grupos que estão sendo perseguidos, mas o
próprio direito de pensar, de lutar e de se organizar em movimentos sociais. Por isso não
podemos recuar e nem temer! Precisamos nos organizar cada vez mais e continuar fazendo
aquilo que sempre fizemos, que é dialogar com xs trabalhadorxs em seu cotidiano, nas
escolas, nas favelas, nos locais de trabalho, no campo, para fortalecer o movimento social
e a resistência da nossa classe contra o Estado, contra a Justiça do Estado e contra os
patrões.
ANISTIA PARA TODXS XS PRESXS E PROCESSADXS!
CONSTRUIR O PODER DO POVO.
Organização Anarquista Terra e Liberdade (OATL) - Frente Sindical.
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