(pt) UNIPA, VIA combative #3 - O Levante dos Marginalizados:análise sociológica dos protestos e manifestações populares no Brasil
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Sexta-Feira, 18 de Abril de 2014 - 19:11:01 CEST
"Pela flor do proletariado, eu entendo sobretudo esta grande massa, estes milhões de não
civilizados, de deserdados, de miseráveis e de analfabetos que o Sr.Engels e o Sr. Marx
pretendem submeter ao regime paternal de um governo muito forte... Por flor do
proletariado, eu entendo esta carne para governo, esta grande canalha popular que, estando
quase virgem de toda civilização burguesa, traz no seu seio, nas suas paixões, nos seus
instintos, nas suas aspirações, em todas as necessidades e misérias de sua posição
coletiva, todos os germes do socialismo futuro, e que só ela é suficientemente forte para
inaugurar e para fazer triunfar a Revolução Social" -- Mikhail Bakunin ---- Uma analise
teórica é necessária do presente levante popular. A dimensão e significado que o levante
assumiu já o torna um dos eventos mais importantes da história da classe trabalhadora e
das lutas sociais no Brasil nos últimos 30 anos.
O que o levante popular ex-
plicitou? As contradições de classe
e os limites do reformismo como
política e do marxismo como teo-
ria. A política apresentada por qua-
se todas as organizações marxistas
e socialdemocratas, partidos políti-
cos e sindicatos foi contrarrevolu-
cionária. Alinharam-se ao Gover-
no, à Polícia e a mídia burguesa. A
sua análise teórica da realidade foi
equivocada. Tomaram como prin-
cipal uma contradição secundária
entre "direita e esquerda", que há
muito perdeu o conteúdo e igno-
raram as contradições de classe
e sociopolíticas profundas que se
manifestaram. No campo socialista
e revolucionário, dentre as poucas
organizações anarquistas existen-
tes a UNIPA foi à única que apre-
sentou uma análise teórica coeren-
te com uma prática revolucionária
diante do levante popular. A teoria
não se improvisa. E agora é preci-
so, mais do que nunca, uma teoria.
A UNIPA vem desenvolven-
do desde 2003 uma série de te-
ses e argumentos que apontavam
para como as diferentes contradi-
ções sociais e políticas levariam,
cedo ou tarde, a formação de mo-
vimentos espontâneos da classe
trabalhadora, reagindo a contra-
dições estruturais e conjunturais.
É exatamente esses argumentos
que iremos recuperar agora para
analisar o presente Levante Popu-
lar. Em 2003, as Resoluções do II
Congresso da UNIPA apresentavam
nossa análise das contradições es-
truturais da sociedade brasileira e
do nosso capitalismo dependente,
em que indicávamos 8 contradi-
ções estruturais entre as diferentes
frações de classe. Além da contra-
dição capital/trabalho materializa-
da em diferentes frações de classe
(ex: proletariado industrial x bur-
guesia industrial), colocávamos o
seguinte:
"Tomando por base todos os da-
dos apresentados, o II Congres-
so entendeu que seria preciso
qualificar as contradições ine-
rentes ao sistema social capita-
lista, ou seja, que fazem parte
da dinâmica das relações sociais
e instituições políticas e econô-
micas, manifestas no cotidiano
do país. As contradições, ou os
conflitos estruturais da socieda-
de brasileira podem ser assim
resumidos: 4) Burguesia Ru-
ral, Pequena Burguesia Rural X
Proletariado Rural e Campone-
ses - dada pelas relações com a
terra, as relações de trabalho e
os direitos a elas associados. 6)
Estado X Proletariado Marginal -
dada pela exclusão das relações
de trabalho, tendo objetos diver-
sos de disputa, mas envolvendo
principalmente direitos sociais
e civis. 7) Estado, Burguesia X
camadas populares - dada por
fatores diversos (políticos, his-
tóricos, culturais), envolvendo
principalmente direitos sociais e
civis e se dá devido ao racismo e
machismo existente na socieda-
de brasileira." (Resoluções do II
Congresso da UNIPA, Março de
2004)
Essa análise de classes visa-
va exatamente traçar o papel das
diferentes frações da classe traba-
lhadora e camadas populares num
processo revolucionário e na luta
de classe s no Brasil
"Quais serão então as forças .
principais da revolução brasi-
leira? O II Congresso, levando
em consideração os elementos
de nossa teoria, entendeu que
no Brasil, existem duas frações
proletárias que serão as for-
ças principais: 1) o proletaria-
do marginal: 2) o campesina-
to. Eles constituem uma massa
de pelo menos 47 milhões de
pessoas (mais que o dobro das
demais frações proletárias da
sociedade brasileira). São tam-
bém a parcela da população em
que os níveis de pobreza sãos
maiores e as condições de vida
são mais precárias. Não que as
demais frações doproletariado
gozem de condições muito supe-
riores, mas nestas frações, elas
têm graus realmente absurdos.
É preciso também definir o que
chamamos de força principal.
Por força principal, entende-
mos as principais frações a se-
rem mobilizadas devido: 1) ao
antagonismo potencial de seus
"Assim, a reestruturação pro-
interesses, expresso pelas con-
dutiva e as reformas do Estado,
dições materiais de existência
presentes na atual etapa do im-
(pobreza, violência, injustiça)
sob que vivem; 2) a quantidade
demográfica destas frações, que
faz com elas tenham um peso
específico pelo fato de serem
muito volumosas, logo, pode-
rem mobilizar grandes efetivos e
ter um grande potencial político.
Segundo nosso entendimento,
as forças principais da revolução
social no Brasil serão compos-
tas pelo proletariado marginal
e o campesinato. O proletaria-
do marginal, ao contrário dos
segmentos sociais mais instru-
ídos, engajados na economia
formal e auferindo rendimentos
elevados, é aquela fração que
proporcionalmente menos se
engaja em atividades políticas
e associativas. Justamente por
isso que devemos empenhar
nossos esforços no sentido de
sua organização e mobilização
(Resoluções do II Congresso da
UNIPA, Março de 2004)
De maneira geral, o conceito
de proletariado marginal abrangia
trabalhadores informais e subem-
pregados. No nosso III Congresso
em 2007 ampliamos esse conceito
para abranger todos os trabalhado-
res super-explorados. De maneira
geral, esses trabalhadores "margi-
nais" no sistema econômico o são
também no sistema político. São
marginalizados num duplo sentido
Ao mesmo tempo, são os trabalha-
dores que são mais vitimados pela
repressão e violência policial. Logo,
não somente eles são marginais na
economia e na vida política, eles
são marginalizados legalmente e
obrigados a viver no limiar da clan-
destinidade.
O acúmulo teórico nos per-
mitiu situar essa analise de classes
numa teoria do desenvolvimento
capitalista. No III Congresso apon-
tamos que o atual período históri-
co, das reformas neoliberais e re-
estruturações produtivas, podem
ser consideradas como o capitalis-
mo ultramonopolista. Apontamos
que a polarização entre neolibe-
ralismo e neodesenvolvimentismo
era falsa. Ao mesmo tempo faziam
avançar as reformas neoliberais, a
reestruturação produtiva e o papel
do Estado, especialmente policial.
Como podemos ver pelo trecho
abaixo:
"Assim, a reestruturação pro-
dutiva e as reformas do Estado,
presentes na atual etapa do im-
perialismo, levam a mudanças
nas relações do centro com a
periferia e a semi-periferia, e
acentua ainda mais a importân-
cia da depreciação da taxa de
salários como formula de resol-
ver a crise do capital e retomar
o crescimento e o desenvolvi-
mento da acumulação de capi-
tal. Isso significa que, mais do
que nunca, o imperialismo ope-
ra especialmente pela super-ex-
ploração do trabalho e não pe-
las trocas desiguais. Mas o traço
principal do período ultra-mono-
polista do capitalismo, é que ele
estende mecanismos que esta-
vam presentes na estrutura do
imperialismo na época do capi-
talismo monopolista de Estado,
especialmente o "duplo mercado
de trabalho" que é um dos prin-
cipais mecanismos de ação do
imperialismo. O duplo mercado
permitiu uma segmentação do
proletariado por condição socio-
econômica, criando um mercado
de trabalho relativamente pro-
tegido e bem remunerado que
correspondia de maneira geral à
divisão entre países de centro e
periferia (incluída aqui a semi-
periferia), ou dentro do centro e
da periferia, em um mercado de
ocupações bem remuneradas,
qualificadas, com garantias jurí-
dicas e socialmente valorizadas,
e outras ocupações desprovidas
disso. Um dos principais efei-
tos dessas mudanças em esca-
la internacional é a extensão do
proletariado marginal (pelos tra-
balhadores submetidos à esfera
inferior do duplo mercado e for-
mas de acumulação primária).
Se o sindicalismo não se colocar
a necessidade de organizar a
fração do proletariado marginal
(terceirizado, precarizado, de-
sempregado, etc.) continuarão
reduzidas as possibilidades de
avanços na luta da classe como
um todo, isso porque a nova fase
do capitalismo coloca uma nova
estrutura de classe, onde essa
fração tem um papel central na
acumulação de capital. 74) Po-
demos dizer que o capitalismo
ultra-monopolista se caracteriza
pela: 1) Flexibilização (comer-
cial, tributária, trabalhista), o
que significa eliminar ou dimi-
nuir os regulamentos legais que
impedem as empresas de obter
o lucro; 2) Internacionalização
e concentração de capitais, os
setores que até duas décadas
eram controlados por monopó-
lios estatais ou empresas nacio-
nais, passam para o controle de
multinacionais; 3) Volatilidade -
os investimentos realizados po-
dem em razão da flexibilização
podem ser retirados pelas em-
presas a qualquer momento; 4)
desestruturação do mundo do
trabalho através da terceiriza-
ção, da precarização e do de-
semprego estrutural". (Resolu-
ções do III Congresso da UNIPA,
2007)
Esse duplo mercado de tra-
balho também gera uma contra-
dição geracional e ocupacional. As
reformas neoliberais e reformas do
Estado com precarização das con-
dições de trabalho e estudo atin-
gem especialmente a juventude.
Ou seja, os estudantes e a juven-
tude não tem e não terão a mesma
proteção que certas categorias de
trabalhadores têm hoje. Por outro
lado, a massa dos trabalhadores
super-explorados e precarizados é
vista apenas como alvo de políticas
compensatórias pelo sistema polí-
tico. A aristocracia sindical e par-
tidária quer defender seus interes-
ses econômico-corporativos e sua
posição no sistema político e entra
em antagonismo tanto com o pro-
letariado marginal, quanto com di-
ferentes categorias como a juven-
tude e os estudantes, que não são
e não serão detentores dos privilé-
gios da aristocracia sindical e parti-
dária. Daí as contradições entre as
burocracias sindicais e partidárias
e os diferentes setores mobilizados
nos protestos.
Dessa maneira, tínhamos
apontado muito claramente que a
sociedade brasileira vivia uma con-
tradição estrutural, entre um pro-
letariado marginal e o campesina-
to x Estado e a burguesia rural. O
neoliberalismo e o desenvolvimen-
tismo eram duas políticas econô-
micas não antagônicas, eram dois
instrumentos do imperialismo den-
tro da sua fase ultra-monopolista.
O Governo do PT tinha construído
um bloco ou coalizão partidária e
de classes sociais, e sua principal
missão era realizar a transição ple-
na de um regime político interven-
cionista (legado pelo varguismo e
pelos militares) a um regime ne-
oliberal, como argumentamos em
2005 no comunicado "As Reformas
do Governo Lula e as Tarefas do
Proletariado". Assim, a polariza-
ção PT (intervencionismo) x PSDB
(neoliberalismo) era falsa. A luta
anti-capitalista deveria ser contra
os projetos neoliberais e neode-
senvolvimentistas que estavam co-
locando como contradições sociais
principais aquelas do proletariado
marginal e do campesinato (o que
continua acontecendo).
Apesar do PT ter a hegemonia
da maioria das organizações sin-
dicais e de trabalhadores, sempre
apontamos que essa hegemonia
não anulava as contradições dos
setores não-organizados e a pos-
sibilidade de movimentos espontâ-
neos e imprevistos. A nossa análi-
se das eleições já vinha apontando
como os dados do "Não Voto" indi-
cavam uma profunda marginaliza-
ção voluntária das massas em rela-
ção ao processo político e também
um profundo potencial anti-hege-
mônico e anti-sistêmico existente
nas reivindicações econômicas e
políticas derivadas das contradi-
ções estruturais apontadas acima.
"Podemos afirmar, ironica-
mente, que a outra tendência
de crescimento nas eleições,
além do crescimento petista, é
o crescimento do não voto, ou
seja, das abstenções, do voto
nulo e do voto em branco. Já
temos elementos para afirmar
que o não voto é uma variável
estrutural do processo eleitoral
e consequentemente, da luta
de classes no Brasil. (...) O Bra-
sil possui cerca de 138,5 mi-
lhões de eleitores segundo Tri-
bunal Superior Eleitoral (TSE).
No primeiro turno das eleições
municipais de 2012, 23milhões
de brasileiros se abstiveram do
processo eleitoral, o que repre-
senta 16,6% do total de eleito-
res. Os votos nulos foram 9,1
milhões e os votos brancos 3,8
milhões. Ou seja, o "não voto"
representou 35,9 milhões de
brasileiros, cerca de 25,9% do
total de eleitores. (...) Os núme-
ros do não voto são ainda mais
significativos quando analisa-
mos alguns casos específicos.
No primeiro turno das eleições
na cidade de São Paulo, o não
voto totalizou 2,3 milhões de
paulistanos, superando os dois
candidatos que foram para o se-
gundo turno (...)Na capital flu-
minense o totalizou 1,4 milhões
dos eleitores. O prefeito reelei-
to no primeiro turno, Eduardo
Paes (PMDB), recebeu 2 milhões
de votos e o segundo colocado,
Marcelo Freixo (PSOL), recebeu
pouco mais de 900 mil votos.
Em Fortaleza o não voto chegou
a 353 mil eleitores, contra 318
mil votos de Elmano (PT) e 291
mil de Roberto Claudio (PSB).
Poderíamos dar outros exem-
plos e o resultado seria o mes-
mo: o crescimento significativo
do não voto nas eleições. (...) Os
comentaristas políticos da mídia
burguesa também abordaram o
tema, procurando explicações a
partir de perspectivas liberais e
idealistas, afirmam que o abs-
tencionismo é resultado do de-
sencantamento da população
com a política. Setores reformis-
tas e marxistas qualificam o não
voto como sendo "alienado",
ou seja, ou como resultado da
ignorância ou do apoliticismo.
(...) Para a teoria bakuninista,
um fenômeno social e político
não podem ser explicados de
maneira tão simplista e a partir
de pressupostos idealistas. Ain-
da não existem condições para
uma análise mais profunda do
fenômeno do não voto, mas com
os dados disponíveis é possível
tecer considerações e chegar a
algumas conclusões prelimina-
res. Em primeiro lugar, como já
afirmamos, a recorrência do não
voto e o seu crescimento nos
permitem afirmar que estamos
diante de um fenômeno estrutu-
ral, ou seja, é parte integrante
da luta de classes no Brasil con-
temporâneo. Em segundo lugar,
o não voto está longe de ser uma
expressão da alienação política
ou o simples resultado da des-
politização. Antes, é uma ex-
pressão difusa de contesta-
ção da ordem instituída; um
questionamento da legitimi-
dade do poder político esta-
tal. Trata-se de um potencial
antiestatista, fruto do atual
contexto da luta de classes
no Brasil marcada pela crise
do governismo". (Comunicado
No 36, Dezembro de 2012)
Ou seja, os dados acima aju-
dam a mostrar como existia uma
recusa das massas a política bur-
guesa e ao sistema político estatal.
Também tínhamos desenvolvido o
argumento de que o Governo do
PT e a coalizão partidária e social
estavam perdendo os instrumen-
tos de cooptação. Desde 2010 no
nosso IV Congresso apontávamos
claramente nessa direção.
"As perspectivas de médio prazo
indicariam (caso a crise econô-
mica se confirme e os demais
fatores políticos e econômicos
se mantenham inalterados) que
um futuro e provável Governo
Dilma terão condições menos
favoráveis que as atuais. E terá
de assumir o confronto contra
os interesses dos trabalhadores,
reduzindo o déficit fiscal que
tenderá a crescer e protegendo
os interesses dos latifundiários e
do próprio capital associado. Mas
a questão é que isso pode acon-
tecer em um ano ou em quatro,
cinco, dependendo da evolução
dos fatores econômicos e políti-
cos. Temos então dois cenários
distintos dentro do atual contex-
to de crise, o de curto prazo e o
de médio prazo. No curto prazo
o setor reformista e governista
(PT e PCdoB) sairá fortalecido
na conjuntura de crise. No mé-
dio prazo, é possível que mais
uma vez o bloco governista te-
nha que coordenar um ataque à
classe trabalhadora (como foi na
ocasião das reformas de 2003).
E essa seria uma ocasião para a
criação de uma alternativa na-
cional de sindicalismo, um sin-
dicalismo de tipo revolucionário
de massas" (Resoluções do IV
Congresso, Março de 2010)
Ou seja, o desgaste do PT, da
sua coalizão social e política e da
capacidade do reformismo partidá-
rio e sindical em responderem ou
gerirem as contradições sociais já
estavam se acumulando e demons-
trando seus limites. A eclosão de
um movimento espontâneo sempre
figurou como uma variável na nos-
sa análise como podemos ver nas
Resoluções da II Assembleia Na-
cional (Fevereiro de 2012) em que
apontamos o seguinte:
"Ao mesmo tempo, o novo ci-
clo de luta de classes na Europa
(2008-2011) e na África (2011-
2012) serve também para mos-
trar as limitações dos movi-
mentos de massa e possíveis
questões para a luta de classes
no Brasil. No caso da Europa, os
heroicos protestos dos insurre-
cionalistas gregos são uma lição
para todos os trabalhadores do
mundo (...) O mesmo acontece
na Espanha (com os protestos
da juventude desempregada) e
França (com a população da pe-
riferia e imigrante). Os ciclos de
luta têm levado a um avanço da
reação e nazi-fascismo: o ata-
que nazista na Dinamarca contra
o Partido Socialista acobertado
pelo Governo e o crescimen-
to do nazismo no leste europeu
provam isso. Assim, o avanço da
crise gera uma dialética ascen-
dente de revolução/reação. É
preciso levar a sério essa situa-
ção, pois elas sempre tenderam
a se mundializar. (...) O Gover-
no Dilma está aprofundando o
abismo com os movimentos so-
ciais. Estão se criando as condi-
ções para uma segunda crise do
governismo, só que essa mais
profunda. Pois dessa crise ou irá
surgir uma ofensiva burguesa
avassaladora que contará com o
apoio explicito da CUT e CTB ou
desencadeará movimentos
espontâneos que sofrerão a
pressão dessas forças." (2a
Assembleia Nacional, fevereiro-
março de 2012)
Foram exatamente essas
contradições que se explicitaram
no Levante Popular de Junho de
2013 em várias regiões do país.
A espontaneidade do levante está
diretamente ligada às contradições
sociais e econômicas estruturais
que o produziram e uma serie de
fatores sociológicos que explicam
como esse levante começa com
mobilizações estudantis que ex-
pressavam uma cisão entre entida-
des governistas ou ligadas a forças
governistas (explicitando as ten-
sões geracionais entre a juventude
e aristocracia sindical e partidária)
e rapidamente é transformada num
movimento de massas depois das
brutais repressões policiais (ex-
plicitando as contradições laten-
tes entre o Proletariado marginal
x Estado). Os Fóruns de Luta pelo
Transporte (RJ) e o Movimento Pas-
se-Livre (SP) expressaram assim a
crise dentro do governismo. Muitas
entidades estudantis ligadas ao go-
vernismo convocaram as mobiliza-
ções. Mas foi a repressão estatal
que deu ao movimento um caráter
de massas e de confronto que não
tínhamos testemunhado no Brasil.
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Os militantes identificados como Black Bloc tiveram/tem uma aparição em escala nacional e
tem sido alvo de perseguições. A polícia e os governos tentam colocálos na prisão como
criminosos. Partidos como o PT, PSOL e o PSTU e as direções sindicais pelegas fazem o
mesmo. Tentam fazer a crítica de que os Black Bloc "atrapalham" as ações de massa.Esta
esquerda oportunista ataca o Black Bloc e toda a forma de violência de massa porque ela
precisa mostrar que respeita os limites da ordem burguesa. A tática Black Bloc é apenas
uma dentro da história da luta dos trabalhadores. A tática do Black Bloc e sua dimensão
defensiva e ofensiva podem e devem ser integrados por uma estratégia revolucionária. A
massa de trabalhadores marginalizados está nos ensinando e criando condições para mudanças
sociais efetivas no Brasil. Sem o uso dessa tática, da violência de massas, não existe
revolução. Porém, somente a violência de massas sem uma organização e um programa não é
suficiente. Corre-se o risco de transformar o "meio em fim". Ou ainda considerar as ações
de violência de massas como uma encenação, para satisfazer o desejo individual de
expressão. Por isso é preciso e devemos evitar dois erros: o pacifismo
contrarevolucionário; e o mito da violência como um fim em si.A tática Black Bloc precisa
se integrar na Estratégia do Sindicalismo Revolucionário, uma organização de massas que
eduque e politize, ao mesmo tempo que lute contra a burocracia sindical e dos partidos
políticos.
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Depois da repressão policial
em São Paulo o eixo dos atos e sua
forma de ação se modificaram. A
massa radicalizou e apresentou
a contradição com o Estado. São
Paulo, Rio de Janeiro e Fortaleza
rapidamente assumiram destaque
exatamente porque acumularam
contradições estruturais e conjun-
turais: 1) as contradições estru-
turais, entre os interesses do pro-
letariado marginal e das camadas
populares x Estado, já que essas
cidades estão entre aquelas com
maiores índices de violência poli-
cial do Brasil, desigualdade e racis-
mo; 2) como vimos, são cidades
também em que a marginalidade
em relação ao sistema político é
extremamente significativa, ex-
pressa pelo "Não Voto" como um
componente difuso da consciência
popular; 3) conjunturalmente, são
cidades Sedes da Copa das Confe-
derações e da Copa do Mundo em
que o custo de vida e do transpor-
te aumentou significativamente,
de maneira que a massa sabe que
sua qualidade de vida diminui na
proporção em que os investimen-
tos públicos na Copa do Mundo au-
mentam. Ou seja, o Levante é es-
pontâneo. Mas as contradições que
o produziram já vinham se acumu-
lando e nós apontamos por diver-
sas vezes que essa situação estava
se delineando de forma cada vez
mais clara. Assim, a contradição
Estado X Proletariado Marginal dá
um caráter de classe e anti-estatis-
ta que pudemos observar em gran-
des setores da massa e por suas
palavras de ordem anti-militaristas
e contra a polícia. O mesmo se
deu pela ação direta de resistência
e confronto com os símbolos e as
forças policiais do poder de Estado.
Do ponto de vista sociológi-
co, um movimento de massas de
milhões de pessoas nunca é homo-
gêneo. Mas podemos dizer que eles
se dividem em pelo menos três
grandes formas de abordagem:
1o) do ponto de vista da compo-
sição de classe, o levante popular
reuniu especialmente o proleta-
riado marginal, e todas as demais
frações de classe (proletariado in-
dustrial, proletariado dos serviços
e também setores da pequena bur-
guesia urbana e aristocracia operá-
ria); 2o) do ponto de vista da com-
posição ocupacional, o movimento
estudantil e os trabalhadores não-
organizados estiveram na vanguar-
da das mobilizações e compuseram
a grande massa nas ruas; 3o) do
ponto de vista das reivindicações
e programa, predominaram as rei-
vindicações por transporte, saúde
e educação pública, o que mostra
como as reivindicações econômicas
de natureza coletiva predominam
sobre a de natureza corporativa.
Esse conjunto de fatores
marca que desde o ponto de vis-
ta da composição de classe, das
contradições estruturais e conjun-
turais e das reivindicações existe
um potencial antagonismo anti-
hegemônico e anti-sistêmico no
levante popular. Pois questionam
a privatização dos serviços públi-
cos e sua subordinação ao capital,
anulando os direitos sociais dos
trabalhadores. O anti-partidarismo
(que tem diversas bases, inclusive
uma tentativa de grupos de direi-
ta de fortalecer o Estado e negar
os "partidos") não foi expressão
de uma percepção "conservadora",
mas sim das contradições de classe
e estruturais da sociedade brasilei-
ra e da condição de marginalidade
em relação ao sistema político. As
massas são heterogêneas. Mas o
maior contingente mobilizado, ex-
cetuando a pequena burguesia e
setores reformistas das demais fra-
ções e categorias, estão em contra-
dição estrutural com "a direita e a
esquerda", com o sistema político,
o regime econômico e as decisões
e pacotes de política econômica.
Uma entrevista realizada com um
manifestante que participou das
ações de resistência e do "quebra-
quebra" em Porto Alegre ilustra
perfeitamente nossos argumentos:
CMA - Queremos saber mais
sobre a tua vida. Tu é de
onde?
João - Tenho 23 anos e nasci
na região metropolitana de Por-
to Alegre. Mano, terminei os es-
tudos faz um tempinho. Nunca
nem pensei em ir pra faculdade
porque tive que trabalhar cedo.
Nunca tive um emprego decen-
te.
CMA - O que tu faz pra viver?
João - Vivo de bico. Já vendi
DVD, entreguei água e fui bal-
conista em papelaria. Trabalho
e não tenho grana para nada.
Tudo está cada vez mais caro,
e a gente vai ficando cada vez
mais pobre. Enquanto isso no
lado rico da cidade, os políti-
cos enchem os bolsos e andam
de namoro com os empresários
graúdos, dono de empresa de
ônibus, empreiteiro... obra su-
perfaturada, suborno, e a gente
de baixo cada vez mais fodida.
Isso é injustiça! Isso é violência!
Quem se dá conta da sacana-
gem, começa a ficar indignado.
CMA - Tu é filiado a algum
partido ou organização? Está
ligado a algum grupo de con-
tracultura?
João - Não sou de partido ne-
nhum. Detesto todos os partidos
do mesmo jeito. São todos um
bando de safados competindo
entre si para nos enganar. Eles
não me representam. Também
não tenho organização, tenho
uns amigos que são punk e tam-
bém gosto de hip-hop. Se vou
para as manifestações vou junto
com amigos e vizinhos. A gente
fecha uma galera e vai. A gente
se cuida, e cuida para não ser
reconhecido nem pego.
CMA - Por que você tu prefe-
riu a forma de manifestação
violenta ao invés de se ma-
nifestar pacificamente, como
os jornais e a maior parte
das pessoas defende?
João - Se eu to me sentindo
violentado pela forma como sou
tratado, se to sendo atacado por
que eu que to em baixo, sou eu
que tenho que ser o pacífico?
Ninguém tem cancha para dizer
como eu tenho que me mani-
festar, porque ninguém aprende
pela minha pele. Só eu sei pelo
que tenho passado pela falta de
grana. Com a passagem subin-
do eu perco meu direito de ir e
vir, e não tem lei que proíba a
gente de passar fome. (Entre-
vista realizada pelo Centro de
Mídia Autônoma - http://www.
midiaindependente.org/pt/
blue/2013/06/520365.shtml)
A contradição desses protes-
tos é também com a política refor-
mista e social-democrata, seus mé-
todos de ação parlamentaristas e
suas reivindicações corporativistas.
O levante popular questionou ao
mesmo tempo o fundamento des-
sas organizações e explicitou todas
suas contradições e limites. Nesse
sentido, toda tentativa de qualifi-
car os protestos e o levante popu-
lar como um todo de estar sendo
ganho pela "direita" só mostra a
incapacidade do marxismo e refor-
mismo brasileiro. Por outro lado, a
burguesia tenta se apropriar de um
movimento que ela ajuda a produ-
zir. E isso será ineficaz. Ou seja,
esse movimento tende a se repro-
duzir na marginalidade em que ele
surgiu até se formar uma força re-
volucionária capaz de potencializar
sua expressão.
O levante popular tem suas
raízes nas contradições de classe,
nas contradições com o Estado e
nos efeitos que o modelo de de-
senvolvimento capitalista e a crise
mundial começam a produzir. Por
outro lado, o levante parece marcar
o nascimento de um novo sujeito
sociopolítico: o proletariado margi-
nal se constituindo na ação coleti-
va e de massas, marcando assim a
emergência de um novo sujeito his-
tórico com potencial revolucionário.
Mesmo que a aristocracia sindical e
partidária consigam desmobilizar
os protestos agora e aprofundar o
caráter policial do Estado, eles não
eliminarão essas contradições es-
truturais e, logo, outras explosões
serão questão de tempo e lugar.
Diante do Levante Popular,
consolidou-se a ruptura desse su-
jeito sociopolítico e suas manifes-
tações concretas com a aristocra-
cia sindical e partidária e o sistema
político burguês. Também marcou
a emergência do anarquismo como
referencia para as massas, seja
através da ação direta anarquista,
seja através da luta da burguesia
contra o anarquismo (através da
campanha de criminalização). Além
disso, esse processo está possivel-
mente marcando o início de um
novo ciclo histórico. A emergência
das lutas, dessas formas de ação
e organização são estruturais. Mes-
mo com um refluxo temporário, es-
sas questões irão marcar a dinâmi-
ca da luta de classes no Brasil.
É importante situar também
esse Levante, quase que essen-
cialmente urbano e metropolitano,
dentro das demais lutas. Porém
"Em primeiro lugar temos de si-
tuar historicamente os protes-
tos. Podemos dizer que o Go-
verno Lula teve instrumentos
de contenção dos movimentos
sociais. Tanto macroeconômicos
quanto políticos, de cooptação.
A partir da posse de Dilma es-
ses instrumentos entraram em
processo de deterioração. As
lutas dos operários das grandes
obras, as lutas dos indígenas.
Depois a grande greve do fun-
cionalismo público e das univer-
sidades de 2012. A greve das
universidades e a participação
do movimento estudantil na luta
contra o Governo Dilma prepa-
rou em parte o terreno para as
lutas que eclodiriam em 2013.
Muitos militantes de hoje foram
formados nessas jornadas (...)
Os atos foram direcionados para
dois alvos principais: os mega-
eventos, ou seja, o modelo de-
senvolvimentista do PT e con-
tra os núcleos do poder estatal.
Devemos fazer uma análise dos
acontecimentos e questionar a
campanha burguesa de crimina-
lização da ação direta popular.
Devemos situar a eclosão dos
protestos violentos no quadro
histórico recente. (Viva o Levan-
te Popular, 20/06/2013)
Logo, não podemos esquecer
que as lutas no campo já estavam
se dando, opondo um campesina-
to indígena e o proletariado rural
aos efeitos do modelo de desen-
volvimento capitalista no campo.
O modelo de desenvolvimento ca-
pitalista está colocando assim as
contradições no campo e na cida-
de, criando as condições para um
novo tipo de aliança operário-cam-
ponesa. O levante popular somado
as contradições e lutas no campo
marcam o início de um novo ciclo
histórico e de lutas sociais, em que
as contradições de classe colocarão
em rota de colisão o proletariado
marginal, o campesinato e o Es-
tado e seu modelo de desenvolvi-
mento capitalista.
Isso aumenta nossa respon-
sabilidade histórica. Qual a tarefa
dos anarquistas revolucionários
ante essa nova conjuntura? A nos-
sa linha foi traçada desde 2010:
"Será justamente o trabalho das
oposições, orientadas correta-
mente por uma linha de massas
combativa e classista, desgas-
tando o governismo e o reformis-
mo, que construirá as condições
necessárias para a conformação
de um movimento nacional de
oposições sindicais-populares-
estudantis. A constituição de tal
movimento é tarefa importante
para unificar os militantes com-
bativos e aplicar corretamente
uma política de reorganização
das lutas proletárias. O primeiro
poder que os trabalhadores têm
que conquistar é o poder sobre
suas próprias organizações, isso
é autonomia. Essa organização
visa impulsionar as lutas e dar
um direcionamento especifico
por meio de um programa de
reivindicações e táticas diferen-
ciadas de ação e organização; a
ação direta no local de trabalho,
a greve geral e as organizações
intercategorias de base. Esse
tipo de organização assumirá a
forma de oposições, mantendo
sua forma de organização dife-
renciada das entidades repre-
sentativas dos trabalhadores.
Para isso devemos ter clareza
que as centrais e a maioria dos
sindicatos serão possivelmente
veículos para paralisar e com-
bater a luta dos trabalhadores.
(...) Mas a critica não se trans-
forma em niilismo e imobilismo.
Transforma-se numa linha de
ação alternativa. Como os Sin-
dicatos e demais organizações
de trabalhadores se encontram
sob tutela do Estado e contro-
lados pela burocracia, uma pa-
lavra de ordem fundamental
será a convocação de Comis-
sões de Base. Essas Comissões
devem ser criadas em cada lo-
cal (empresa, unidade produti-
va, unidade de ensino, unidade
de trabalho rural) para juntar o
que o capitalismo fragmentou:
as diferentes categorias ocupa-
cionais e ofícios, os trabalhado-
res temporários e permanentes,
precarizados e integrados. O
objetivo único dessa forma or-
ganizativa é o de realizar a luta
por meio da Greve, Boicote e
demais formas de Ação Dire-
ta. Coordenando todos os tra-
balhadores e/ou estudantes na
Base. Essas Comissões de Base
devem convocar assembleias e
reuniões de todos os trabalha-
dores sempre que o sindicato ou
associação de representação se
apresentar inoperante ou aber-
tamente contrários à luta de
classes. Essas comissões são
formas temporárias, irão repre-
sentar uma forma de ginástica
de sindicalismo revolucionário,
ou seja, exercitar e fortalecer
nos trabalhadores a estrutura
de consciência de classe e o cor-
po organizativo por meios de or-
ganização informal. Esse caráter
temporário reflete um momento
do desenvolvimento da força co-
letiva do proletariado, já que o
objetivo é fazer com que essas
organizações tornem-se perante
os trabalhadores expressão do
seu poder organizacional e con-
sequentemente expressão per-
manente de sua representação.
Mas isso não se dará artificial-
mente, mas a partir de recorren-
tes experiências de luta através
dessas formas organizativas. A
convocação das Comissões de
Base será assim o a tática para
o próximo período, como forma
de criar focos de resistência e
oposição nos sindicatos domi-
nados pela burocracia pelega e
oficialista ou então totalmente
tutelados pelo Estado. Levantar
as Barricadas! É a palavra de
ordem da tática antiestatista e
anti-neoliberal para agrupar os
trabalhadores em torno do pro-
grama econômico-reivindicativo
e político-organizativo. E a Bar-
ricada é construção das oposi-
ções e das Comissões de Base,
como alternativa à capitulação
das centrais sindicais e dos mo-
vimentos sociais e estudantis.
(Resoluções do IV Congresso,
2010)
O combate ao reformismo
através das oposições, impulsio-
nando a auto-organização da clas-
se é essencial. Deixar que a mas-
sa fique à mercê dos reformistas e
do aparelho repressivo de Estado,
da ofensiva burguesa é um crime.
A espontaneidade não está em
contradição com a organização.
A auto-organização é o prolonga-
mento da espontaneidade sob for-
mas mais elaboradas e duradouras.
Nesse sentido, a tarefa de todos os
revolucionários é se lançar nesse
trabalho de construção de uma al-
ternativa de organização de mas-
sas classista e internacionalista.
Dessa maneira, a tarefa ime-
diata é a construção pela base, a
única saída classista e combativa
dentro dessa conjuntura. A luta
não começou agora, mas foi eleva-
da a um novo patamar. As massas
avançaram. Agora nossa tarefa é
nos elevarmos até seu nível e con-
seguir enriquecer sua experiência
com uma teoria e um programa
que esteja à altura dessas lutas.
No futuro, construir a aliança entre
o proletariado marginal e o campe-
sinato. Nesse momento a tarefa é
aprofundar a auto-organização dos
trabalhadores.
Anarquismo é Luta! Todo po-
der às comissões, organiza-
ções e assembleias de base!
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