(pt) Brazil, Anarkio.net: A-Infos #17 - TRABALHO ESCRAVO NO BRASIL- Pietro Anarchist (en)
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Sábado, 2 de Março de 2013 - 16:21:18 CET
A ocupação forçada da “América” pelos europeus se fez baseada na escravidão e genocídio
dos nativos. Não bastasse essa agressão preliminar, por um período de quase trezentos anos
se forçou a vinda de milhões de africanos para a América também em regime de trabalho
forçado. Esse doentio “direito” das elites brancas européias adquiridas por sua condição
de aristocratas ou burgueses, apoiados por uma malta de religiosos canalhas e
inescrupulosos criou na América uma sociedade totalmente excludente e escravocrata,
possivelmente sem precedentes na historia da humanidade. Embora de todas as formas os
escravos (paleoameríndios e africanos) tenham procurado resistir, a luta se mostrou sempre
desigual, tendo o escravocrata logrado êxito na manutenção de sua ordem exploradora –
regime servil -, forjando e impondo ao longo dos anos uma sociedade totalmente desigual.
De um lado os ricos latifundiários que tinham acesso a todas as benesses de seu tempo, no
outro estremo os escravos tolhidos de qualquer direito. Entre as duas classes temos
milhões de brancos pobres e mestiços miseráveis que serviram para alimentar os exércitos
dos brancos escravocratas, os seminários religiosos, e produzir os alimentos necessários a
nutrição do conjunto da sociedade. Foi quase que regra na América a adoção das Plantations
na agricultura, utilizando-se exclusivamente mão de obra servil, extensivo o modelo a
mineração no Brasil e América Espanhola. Nesse mundo de exploradores e escravos, os que
eram livres sobrevivam como posseiros, coletores ou meeiros e estavam em geral envolvidos
no cultivo da alimentação básica para si e para os latifundiários.
O Brasil nesse triste cenário ocupou lugar de destaque, sendo um dos últimos a aceitar o
fim do regime escravista. Quando da abolição, 1888, essa feita de forma parcial e
incompleta, os milhares de cativos, pura e simplesmente foram expulsos das fazendas
passando a engrossar os cinturões de miséria das incipientes cidades e vilas brasileiras.
Com a chamada abertura dos portos em 1808 intensificasse a vinda de pobres e miseráveis
para o Brasil, os quais fogem das varias guerras européias, da perseguição religiosa,
política e em busca de uma oportunidade de romper com seu passado de necessidades. Na
seqüência da alteração de nossa condição política de Colônia para Império, começam a se
possibilitar a formação de minifúndios os quais passam a ser ocupados e cultivados em sua
quase totalidade por brancos pobres que imigram em geral acompanhados de seus familiares.
Nesse particular se observa que ao cativo alem de ter negada a sua liberdade a ele se
impede o acesso a terra, por menor que seja a parcela. Notadamente nas fazendas de café da
Região Sudeste do Brasil, gradativamente o braço escravo vai sendo também substituído por
brancos pobres, geralmente estrangeiros, que são submetidos, a um nefasto sistema de
parcerias. Embora denominado de regime de assalariamento, a regra foi de que estas
mulheres, homens e crianças dificilmente viram chegar as suas mãos valores em dinheiro. A
importação de mão-de-obra branca também teve uma lógica macabra, pois para cá migraram
milhares de indivíduos que não encontraram nenhum tipo de ocupação e de oportunidade no
Brasil. Os cortiços em cidades como Santos, São Paulo e Rio de Janeiro eram
majoritariamente ocupados por imigrados. Cidades como Porto Alegre e Curitiba também viram
surgir ao redor de seus centros formados no período colonial Vilas constituídas de
miseráveis que rapidamente passam a ser explorados na incipiente indústria que vinha se
espraiando desde o segundo reinado.
Os ex-escravos, sem escola, sem trabalho fixo, sem direitos de cidadania, pois não podiam
sequer votar, pois eram mantidos no analfabetismo, acabou por formar uma camada social
totalmente a margem, servindo unicamente como reserva de mão-de-obra e vivendo em
precárias condições nos cinturões de miséria que passam a estar dispostos ao redor de
todas as grandes cidades brasileiras. A eles se somam os milhões de brasileiros livres,
porém pobres, destituídos de qualquer posse e sequer do elementar acesso a educação. Não
bastasse isso, como já citamos anteriormente, milhões de pobres vêm, sobretudo da Europa
“tentar a sorte” num país que sequer ainda tinha deixa o sistema servil de lado. As elites
obviamente tinham tudo planejado com vistas a “libertar” os cativos, mas com isso se
organizavam com o fito de terem braços excedentes tanto para a lavoura quanto para a
indústria que se formava.
O resultado não poderia ser outro, uma sociedade totalmente estratificada, com uma elite
no topo, detentora de todos os privilégios e milhões de miseráveis na base que para
sobreviver tinham e ainda tem que se sujeitarem as mais brutais formas de exploração. A
resistência anti-escravidão presente desde o período colonial toma corpo no segundo
Império quando já próximo do Século XX, logra êxito. Embora nominal a libertação dos
escravos e conquistada nos locais mais populosos do Brasil, nas regiões distantes e nos
vilarejos do interior do país ela conseguiu se manter disfarçada até nossos dias (2013).
Os jornais comerciais e partidários, mesmo os do reacionário Partido Republicano detentor
absoluto do poder a partir de 1889, denunciavam rotineiramente a presença de mão-de-obra
em regime escravista no “interland” brasileiro. Custodiados por jagunços – pistoleiros - e
mantidos em condições piores que os escravos das fazendas de café milhares de
trabalhadores eram – e ainda são - explorados, em fazendas de gado, no plantio e colheita
da cana-de-açúcar, na extração do látex e mesmo na construção de inúmeras ferrovias
durante o período denominado Primeira República.
A construção da Ferrovia São Paulo ao Rio Grande do Sul junto com a Noroeste do Brasil, só
para citarmos um exemplo, nos primeiros anos do Século XX, tinha como regra os maus tratos
aos trabalhadores, a falta constante de pagamento, a exploração no fornecimento dos
alimentos obrigando o trabalhador a comprar sempre do Patrão ou de seus prepostos e com
isso ficando sempre em débito com o armazém. Lembrando também que a jornada de trabalho
tinha horário para iniciar e nunca para terminar. A regra era de estrela a estrela, e com
qualquer tempo. Não raro levas de trabalhadores eram assassinados por se revoltarem ou
tentarem deixar os canteiros de obras. Os que ficavam enfermos era regra conduzi-los a
locais ermos e deixá-los ao abandono até que a morte os acolhesse.
Na sucessão de “Estados de Sitio” que o Brasil passa a viver com o advento da Republica
Velha e na seqüência por duas ditaduras ostensivas – Estado Novo e Redentora - o tema
escravidão torna-se tabu e crime de lesa pátria. Quem se atrevesse somente a comentar o
tema, estava sujeito aos rigores da lei e condenado inclusive a desaparecer. Nas Escolas
Públicas e particulares constava nos currículos de Historia, Estudos Sociais, Moral e
Cívica e Organização Social e Política do Brasil que a “mancha da escravidão” havia sido
solvida em 13 de maio de 1888, não existindo mais esse nefasto instituto no Brasil, sendo,
portanto, todos livres.
Discordar desse discurso ufanista, reacionário e nazifascista era não amar o Brasil, coisa
de subversivo e bom que se calasse para o bem de nosso desenvolvimento. O assunto
timidamente volta a ser comentado com o processo de abertura lenta e gradual verificado
nos anos 80 do Século XX. A pressão internacional embora incipiente determinasse que
algumas ações governamentais tivessem curso, obviamente insuficientes e insubsistentes, a
nosso ver particular totalmente de fachada. Mesmo assim os números oficiais, que não
condizem efetivamente com a realidade, são preocupantes. Milhares de brasileiros são
explorados no meio rural na condição precisa de trabalho escravo. Em Centros Urbanos como
São Paulo se verifica ainda o emprego de mão-de-obra escrava com a exploração de milhares
de estrangeiros em situação supostamente irregular visto terem entrado no país sem
observar as leis de imigração vigentes no Brasil.
Esse problema se deve ao fato de que em seus países de origem, sobretudo no caso dos
bolivianos, a situação em sua “pátria” de origem ser muito pior. As ações de resgate no
meio rural, retirada dos explorados dos locais de trabalho escravo tem se mostrado
inócuas. Não raro os trabalhadores premidos pela necessidade, pela absoluta falta de
trabalho em seus locais de origem e pelo fato de não terem acesso sequer as séries
iniciais do estudo formal procuram novamente os “gatos” – agenciadores de mão-de-obra – e
voltam para fazendas localizadas em lugares remotos onde trabalham em troca de um prato de
comida. Outro agravante é que a punição a esse tipo de crime e totalmente frágil, não há
registro de cumprimento de pena de parte dos aliciadores de mão-de-obra escrava – gatos –
nem dos escravocratas titulados de proprietários de fazendas ou prósperos e eminentes
industriais.
O fardo da escravidão para o Brasil e notório. Na maioria dos centros urbanos ainda temos
milhões de favelados, totalmente excluídos dos princípios básicos da cidadania propostos e
defendidos pelo Estado Liberal Burguês, autodenominado de “bem estar social”. Fiquemos
somente no exemplo que segue: Temos mais de sete milhões de empregados domésticos no
Brasil (conforme PNAD 2009). Cinco milhões ou mais sem Carteira de Trabalho assinada,
portanto, sem direitos sociais como salário mínimo, férias entre outros. A grande maioria
com baixa escolaridade, quando não totalmente analfabetos.
A Constituição Federal ainda os discrimina dos outros trabalhadores, pois não tem jornada
de trabalho definida em lei entre outros direitos. Para encerrar a maioria é constituída
de mulheres, as quais em larga maioria descentes de escravos. “Mesmo com o "título" de
profissão com o maior número de mulheres no Brasil, ocupada por mais de 8 milhões de
pessoas, as trabalhadoras domésticas do País possuem apenas 9 dos 34 direitos assegurados
às demais categorias profissionais.” Em 2011 o Governo de plantão do Brasil foi um dos
signatários da Convenção 189 da OIT, porém as alterações constitucionais e
infra-constitucionais não foram ainda feitas, caindo tudo na vala recorrente da demagogia.
Resta observar que esse problema não é exclusividade do Brasil, visto que milhões de
pessoas estão sujeitas em todo mundo, inclusive na Europa, caso majoritário dos
imigrantes, a trabalhos penosos, insalubres e perigosos, sem direitos sociais, portanto,
na condição de escravos. Cumpre a nós manter a luta contra a escravidão, independente da
máscara que se utilize para maquiá-la ou tentar escondê-la. Denunciar a escravidão também
é papel de todos os que lutam contra o capital e a exploração buscando engajar o conjunto
dos trabalhadores nessa jornada que não tem trincheira nem descanso. Nossa organização
independente, sem partidos, sem patrões, sem igrejas, sem Estado, é que possibilitara a
efetivação da necessidade de acabar com a exploração.
Caxias do Sul, 01 de janeiro de 2013.
Pietro Anarchista
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