(pt) http://anarquismorj.wordpress.com: Da periferia aos centros e de volta a periferia: Chacina na Maré (en)
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Quarta-Feira, 3 de Julho de 2013 - 10:56:16 CEST
Federação Anarquista do Rio de Janeiro --- O fim da ditadura militar no Brasil não acabou
com as práticas repressivas da Polícia Militar sobre as classes populares. O papel e
função desta instituição mantém-se o mesmo desde então: fazer valer e garantir os
interesses das classes dominantes e do capital, levando adiante o rolo compressor das
imposições de governantes e de suas políticas públicas em prejuízo do povo. ---- Desde a
“democratização” do país, temos testemunhado cada vez mais a territorialização das ações
violentas da PM nas periferias, favelas e subúrbios das cidades, mantendo-se as práticas
mortais e repressivas dos “anos de chumbo” contra os pobres (jovens negros principalmente
) e os “subversivos”. Para isso, as forças repressoras e o capital contam com a
cumplicidade de empresas e corporações que monopolizam os meios de comunicação.
Estas, que sempre fizeram o jogo do poder, lucram com notícias mentirosas e tendenciosas e
colaboram bastante para estigmatizar as favelas como espaços de violência e de desordem,
construindo o discurso de que estas comunidades seriam um “caso de polícia” que somente a
violência do Estado pode conter.
Nas fronteiras dos estados e municípios, armas e drogas passam pelas barbas das
“autoridades”, que muitas vezes são cúmplices do tráfico. Nas favelas, policiais apreendem
drogas e armas para revendê-las aos próprios traficantes e, depois de matá-los, as vendem
novamente. Nenhum governo (mesmo um de “esquerda”), desde a ditadura, tem se preocupado
com este processo, ao contrário, tem o levado cada vez mais ao extremo. E muitos partidos
de esquerda defendem a ideia absurda da possibilidade de uma polícia militar cidadã! Uma
polícia que não reprima os pobres é um sonho absurdo dentro do capitalismo. O aparato
repressivo do Estado é um de seus pilares de dominação; é uma das condições estruturais
deste sistema. Esse Estado criou uma unidade policial que tem como símbolo uma caveira com
uma adaga enterrada e duas pistolas cruzadas e que nasceu com o lema: “Homem de preto,
qual é sua missão? Entrar na favela e deixar corpos no chão!” E tem tido muito sucesso
referente a esta missão: milhares de corpos sobretudo de jovens, no chão das favelas
marcam a história da violência policial das últimas décadas.
Ao eclodirem de um dia para o outro mobilizações históricas por todo o Brasil, a PM viu-se
forçada a atuar no asfalto, disparando bombas e balas de borracha contra distintos
segmentos sociais. Teve que enfrentar milhares de celulares e máquinas fotográficas que
registraram seus atos de violência. Naquele momento, amplos segmentos puderam sentir na
pele o quanto a violência estatal é desumana e a que grau pode atingir. Uma prática brutal
que, na verdade, é regra, e não exceção. De repente, nas ruas, moradores de bairros
(reconhecidos enquanto tal pelo poder público) puderam sentir junto com moradores de
favelas a violência sistemática do Estado.
Na quinta-feira, 20 de junho, a violência policial foi das periferias até o Centro do Rio
de Janeiro para caçar milhares de manifestantes, deixá-los em pânico, botá-los para
correr, machucá-los e prendê-los. Fazendo o que sempre fazia nas periferias e favelas, a
PM de repente viu-se alvo de críticas, teve suas ações registradas e publicadas por
diversos meios de comunicação livres não dominados pela mídia corporativa.
Analista de segurança da Globo (a direita), Rodrigo Pimentel diz que fuzil deve ser usado
na favela, não no asfalto.
“O Fuzil AR-15 deve ser utilizado em guerra, em operações policiais em comunidades e
favelas. Não é uma arma para se utilizar em área urbana”. (Rodrigo Pimentel, Comentarista
de “Segurança” da Rede Globo) Supostamente criticando a atuação da PM durante a passeata
dos 100 mil, essa “avaliação” do “especialista” em (des)segurança pública, Rodrigo
Pimentel (proferida em 18 de junho no RJ-TV da Rede Globo), ecoou pelas favelas: mais
mortes estariam por vir. A raiva de terem que usar balas de borracha nas manifestações. A
vontade de darem o exemplo e calarem de imediato a voz do povo. Impedir que cada vez mais
a onda de revolta nas ruas se espalhasse pela cidade. Todos estes elementos tiveram seu
papel quando, no dia 24 de junho, a PM entrou na favela da Maré para matar. Tudo isso,
catalisado ainda mais pela vontade de vingarem a morte de um policial, o terrorismo de
Estado resultou em uma noite de terror e morte para os moradores das favelas Nova Holanda
e Rubens Vaz. Nesta chacina, que aconteceu do dia 24 para o 25, os fatos nunca serão todos
revelados. Corpos somem, mortes a facadas sem deixar provas da arma utilizada, sangue nas
camas e nos pisos das casas dos moradores deixam inúmeras evidências do ocorrido. Mas já
era esperado que alguém fosse sentir as consequências dessa atuação mortal. E depois, vem
cinicamente todo aquele papo de perícia, de “os excessos serão apurados” e o discurso
padrão para produzir o consenso, e blá, blá, blá!
“Com esta polícia não tem diálogo, somente resistência!”
“Não vem dizer agora, com UPP melhora. Até a ONU veio avisar, a PM tem que acabar!”
Na favela as balas não são de borracha.
A resistência popular na Maré
Os moradores, junto a instituições não-governamentais que atuam há anos nas favelas da
Maré, não iriam aceitar uma segunda noite de terror. Chega! A pressão destas entidades e a
força popular nas ruas juntaram-se para proteger a vida dos moradores da Maré. Em uma
passeata na tarde de terça-feira, 25 de junho, que foi crescendo à medida que buscava seu
caminho pelas vias da favela, os moradores pararam em frente ao Caveirão (carro blindado
da polícia militar para ações nas favelas), que ainda estava posicionado no meio da Rua
Principal. E então, os moradores gritaram: “Não, não, não, não queremos Caveirão!” e “Não
somos os culpados pela morte do policial, somos trabalhadores, queremos viver!“. Imagine o
grito de alívio quando o blindado partiu e, de fato, deixou a favela: “Expulsamos o
Caveirão!” A passeata terminou na Passarela 9, de onde tinha saído, encontrando a frente
um segundo Caveirão, que ainda estava estacionado na beira da Avenida Brasil. Chegando a
noite, a Rua Principal estava sem luz, e com mais pressão das entidades comunitárias e o
apoio de diversas entidades de direitos humanos, que vieram até o local, conseguiram
tirar, pelo menos por esta noite também, este segundo tanque de guerra. Um grupo dos
manifestantes ficou para fazer vigília na entrada da favela Nova Holanda, reforçado por um
grupo que veio depois de participar da Plenária do Fórum Contra o Aumento da Passagem:
“PM, FORA DA MARÉ!”.
Até a ONU, instituição conservadora, pede o fim da polícia militar.
No Fórum, foi combinado um ato em frente à Secretaria de Segurança Pública, às 9h do dia
seguinte, que infelizmente (mas talvez não de surpresa) não contou com o número de pessoas
que se empolgaram na noite anterior para abraçar esta causa, que é a causa de tod s nós.
Chega de violência sistemática da Polícia! O corte de classe ainda está profundo. Ter
notícias da violência que ocorre é uma coisa, senti-la é outra. O querer é uma coisa, o
necessitar é outra. Mas entende-se que além de toda solidariedade e da necessidade de
estarmos juntos, a construção do poder popular para acabar com a violência sofrida pelas
classes populares continuará ocorrendo nas periferias, e a partir das periferias. O
trabalho do policial não é apertar parafusos, nem dar aula, tampouco rejuntar um piso, o
trabalho da polícia é prender e matar pobres. A favela já sabe disso há muito tempo, parte
da esquerda precisa aprender. E neste momento histórico, no qual o povo está tomando as
ruas, é também nas ruas que os moradores das favelas estão, para exigirmos todas e todos
juntos: “Fim da Polícia Militar, já!“
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