(pt) Federação Anarquista Gaúcha FAG* - Yoani Sánchez no Brasil – Uma blogueira do barulho - Observatório da Imprensa Por Luciano Martins Costa
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Terça-Feira, 26 de Fevereiro de 2013 - 15:09:28 CET
Comentário para o programa radiofônico do Observatório, 21/2/2013 ---- Mais do que um
fenômeno político, a blogueira Yoani Sánchez representa um fenômeno cultural e social
nestes tempos em que a individualidade ganha projeção sem precedentes, graças às
possibilidades de expressão criadas pela tecnologia digital de comunicação e informação.
Uma mulher comum, simples, sem traços de carisma pessoal, consegue em sua visita ao Brasil
mobilizar a imprensa, provocar manifestações de protesto e ser apresentada ao plenário da
Câmara dos Deputados como se fosse uma chefe de Estado. ---- Lendo-se o que dizem os
jornais brasileiros sobre ela, imagina-se que os cubanos são um povo alienado, isolado do
mundo e tiranizado por dois velhos decrépitos, os irmãos Castro, e que a blogueira é a
única voz livre naquela ilha do Caribe. No entanto, todo o barulho em torno de sua visita
segue paralelamente à falta de informações sobre o que a blogueira representa no cenário
cultural e político de Cuba.
Yoani não é a única nem a mais relevante voz cubana, em Cuba, a protestar contra as
restrições impostas ao país. Ela é apenas a personagem que a imprensa ocidental e
organizações políticas inimigas do regime cubano escolheram para personificar suas críticas.
Atuam em Havana e outras cidades pelo menos uma centena de jornalistas, escritores e
intelectuais que discutem abertamente a situação criada pelo isolamento do país. Vinte
deles produzem a revista Voces (Vozes, em português), uma publicação digital de
resistência contra o regime castrista.
Em sua apresentação, os autores qualificam Cuba como “uma nau que soçobra em sua néscia
noção de nação” e se declaram empenhados em mostrar sua “desídia ideológica”. Em suas 16
edições, disponíveis na internet, pode-se encontrar textos primorosos, alguns carregando
críticas vivas ao governo, todos defendendo a liberdade de expressão.
O escritor Orlando Luis Pardo Lazo, criador da Voces, é considerado um dos mais importante
entre os blogueiros dissidentes que se destacam em Cuba. A blogueira pop não é, portanto,
a principal representante da dissidência intelectual cubana. É apenas aquela que a
imprensa ocidental escolheu como personagem-símbolo em sua campanha ideológica.
Outras vozes
Também se pode observar que muitos dos textos postados pelos integrantes desse movimento
não condenam a revolução cubana, mas os caminhos que ela tomou em função do isolamento. A
própria Yoani Sanchez afirmou, em uma de suas entrevistas no Brasil, que o problema de
Cuba é o embargo imposto pelos Estados Unidos, que é usado pelo governo como justificativa
para a política de restrições.
Acontece que, com o advento da internet e mesmo enfrentando dificuldades com a pobreza da
tecnologia disponível, essas vozes podem ser ouvidas em qualquer lugar. Essas dificuldades
podem ser bem avaliadas por quem acompanhou a evolução da internet no Brasil. Mesmo em
plena democracia, e com amplas liberdades, o brasileiro era até há pouco mais de uma
década um indigente em termos de tecnologia de comunicação, com a falta de investimentos
por parte das operadoras de telecomunicações, e ainda hoje tem que se submeter às
limitações da política de importações e ao interesse da indústria eletrônica de esgotar as
possibilidade de lucro de modelos obsoletos.
Na quinta-feira (21/2), por exemplo, o Estado de S. Paulo informa que a Apple, que disputa
com a brasileira Gradiente a marca iPhone no mercado nacional, está sendo acusada por uma
associação civil de enganar os consumidores do Brasil ao vender modelos do iPad 3 como se
fossem os novos iPad 4.
Yoani Sanchez é um fenômeno produzido pela manipulação, por parte da imprensa ocidental,
da diversidade produzida pelas manifestações individuais nas redes digitais. Vejamos o que
diz, por exemplo, um dos artigos publicados pelo cubano Wilfredo Cancio Isla, ex-professor
da Faculdade de Comunicação da Universidade de Havana, na edição 15 de Voces:
“A internet e a avalancha de páginas digitais, portais informativos e blogs, favoreceu uma
democratização do jornalismo e da informação. E criou também um desafio para as
instituições tradicionais, mas ao mesmo tempo gerou uma ilusão de falso profissionalismo.”
Ele acusa a imprensa ocidental, de modo geral, de fazer uma cobertura preconceituosa sobre
Cuba e Venezuela e de politizar de maneira nociva o noticiário, baixando a qualidade do
jornalismo. Mas também não foge da discussão sobre a falta de acesso a informações em Cuba:
“Estes temas têm relação com a realidade cubana, onde reina há 50 anos um jornalismo de
propaganda ideológica, centralizado e instrumentado, alheio a demandas de mercado?
Definitivamente sim, porque Cuba deixou de ser a sociedade fechada que foi até a onda da
internet e o uso massivo das novas tecnologias.”
Yoani é o barulho que a imprensa brasileira faz, para que outras vozes cubanas não sejam
ouvidas.
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* a presente análise não corresponde necessariamente toda a opinião da FAG sobre o assunto.
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